O
planeta está altamente febril e humanidade é o próprio vírus causador. Ou nós
nos tornamos um bom hospedeiro, ou nós seremos eliminados
Os Jogos Olímpicos ainda não começaram.
Entretanto, todos os dias a imprensa noticia recordes e mais recordes.
Infelizmente, não são superações humanas para serem festejadas e sim sinais
mais do que evidentes dos imensos desafios que a humanidade tem e terá até o
findar do século XXI.
O clima está mudado e mudando. O motor climático,
devido ao aquecimento global, persegue, tal qual um carro de corrida, novas e
indesejadas marcas: a maior temperatura registrada nos últimos 78 anos, o maior
período de seca e, subsequentemente, a maior chuva medida desde que se iniciou
a série histórica.
As razões para esses fenômenos, que acontecem há
pelo menos três décadas, vêm sendo alertadas pela comunidade científica
internacional e apresentadas em artigos científicos ou em relatórios como os do
Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), fundado em 1988.
Entretanto, as sociedades, em especial a
brasileira, ainda não se aperceberam que o aquecimento global associado ao
desmatamento desmedido turbinaram o clima de tal forma que os eventos
climáticos estão e ficarão cada vez mais extremos.
Caso aconteça neste ano de 2015 o fenômeno de
aquecimento acima do normal das águas do Oceano Pacífico, denominado El Niño,
poderemos esperar uma significativa alteração no ciclo das chuvas, tal qual
aconteceu nos anos de 1997 e 1998. Infelizmente, isso trará uma amplificação ou
mesmo uma prorrogação da seca no Sudeste brasileiro.
Diante da magnitude dos atuais desafios, as
sociedades deverão repensar, reinventar e alterar todos os modelos de vida e de
consumo até então vividos – se elas mesmas desejarem continuar
sobrevivendo.
Esta não é uma afirmação alarmista ou de cunho
apocalíptico. É uma constatação mais do que evidente de que o planeta não
suporta este nível de demanda de mais de sete bilhões de seres humanos.
O Sudeste Brasileiro, e em especial a Grande São
Paulo, nunca viveu uma situação tão crítica em relação ao clima e à água,
devido ao aumento populacional e, consequentemente, o consumo. Diante da
realidade só existem duas posturas: atacar as raízes do problema ou empurrar
com a barriga até onde der.
Soluções existem. Porém, não são soluções únicas
ou mesmo mágicas. A primeira envolve a mais que óbvia constatação de que o
modelo de urbanização no Brasil está falido. Não faz o menor sentido uma cidade
matar seus rios e passar a depender exclusivamente de águas de outros
mananciais cada vez mais distantes. Este é o caso de toda cidade brasileira que
cresce.
Os índices de tratamento do esgoto doméstico
urbano e industrial no Brasil são vergonhosos. E desta forma os rios estão
sendo mortos a cada dia que passa. É uma grande incoerência nossa utilizar os
rios como transportadores de toda a ordem de sujeira.
A ocupação de áreas de mananciais é outra
incomparável idiossincrasia brasileira.
A ausência de bons planos diretores, ou mesmo a
falta de fiscalização associada ao oportunismo político populista de alguns têm
permitido que áreas vitais para a saúde hídrica dos rios e represas e,
consequentemente, da população, sejam deterioradas em uma velocidade nunca
prevista outro agravante é a verticalização
das cidades, sem regras que norteiem e incentivem a “construção verde”, que
defende os sistemas de captação, armazenagem e reuso das águas pluviais,
aproveitamento da luz solar, equipamentos eficientes, telhados vivos etc.
Também
é necessário que uma parte do terreno seja cedida ao poder público para o
alargamento das ruas e calçadas – ou as cidades serão estranguladas em si
mesmas. As cidades, assim como as áreas de mananciais, cada uma a seu modo,
devem ser reflorestadas.
Além disso, não é possível desperdiçar nos
vazamentos da rede de entrega de água o tanto que se perde no Brasil. Em alguns
estados o índice de perda supera os 50%.
O Brasil é um país abençoado pela natureza sobre
diversos aspectos. No quesito água, detemos aproximadamente quase 12% de toda a
água potável disponível para consumo humano do planeta. Talvez seja essa
fartura que não nos permitiu até agora aprender como devemos preservá-la e
utilizá-la com sabedoria. É uma questão ética e ao mesmo tempo de sobrevivência
para todos.
Quando se fala em sustentabilidade, uma das
máximas é: pense globalmente e haja localmente. O clima da Terra depende de
diversos fatores. Hoje já se sabe que o desmatamento da Amazônia,
aproximadamente 20% da cobertura original, está interferindo no ciclo
hidrológico do sudeste brasileiro, uma vez que isso interfere na evaporação e
na umidade que chega ao sudeste.
Ao analisarmos o desmatamento da Serra da
Cantareira, podemos identificar que a capacidade de aproveitamento das águas da
chuvas diminuiu significativamente. Assim, desta forma, os poderes executivos
federal, estadual e municipal devem de uma vez por todas abandonarem eventuais
divergências partidárias e trabalharem conjuntamente com os poderes legislativo
e judiciário para preservar o presente e garantir o futuro.
O planeta está altamente febril e humanidade é o
próprio vírus causador. Ou nós nos tornamos um bom hospedeiro, ou nós seremos
eliminados. Em suma, a humanidade deve planejar e empregar os avanços
científicos para poder melhor usufruir as áreas florestais, rurais e urbanas
buscando o benefício de todos e garantindo, assim, o seu próprio futuro no
planeta.
Sergio
Luiz Pereira - engenheiro e escritor, Prof. Dr. Livre-Docente da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo e coautor do livro “A Empresa Ética em
Ambiente Ecoeconômico”, lançado em agosto de 2014 pela Editora QuartierLatin
SP. É também palestrante e consultor em Ecoeconomia, professor da FEA da
PUC-SP e dos programas de MBA.
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