Compostos químicos
serão triados de forma ágil; grupo de Ação Rápida para Doenças Emergentes do
Instituto também recebeu investimento internacional para estudar doenças
tropicais
O
Instituto Butantan, um dos maiores centros de pesquisas biomédicas do mundo,
vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, iniciou pesquisa para
descobrir remédios que possam ser eficazes no tratamento de pessoas infectadas
com o vírus zika.
O
estudo, a cargo do Grupo de Ação Rápida para Doenças Emergentes do Laboratório
Especial de Inovação e Desenvolvimento Industrial do Instituto Butantan,
utiliza a estratégia conhecida como reposicionamento de fármacos e o método
de High Content Screening (HCS) ou Triagem de Alto Conteúdo,
uma tecnologia que permite que coleções de compostos químicos sejam triadas de
forma rápida contra o vírus em um ambiente fisiológico, com células humanas
infectadas.
O
processo favorece a descoberta de medicamentos que tenham atividade contra o vírus
diretamente, sem a necessidade validar previamente o alvo molecular, o que pode
levar vários anos.
Os
pesquisadores envolvidos já realizaram um trabalho semelhante no Centro
Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, com investimento da Fapesp
(Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), em 725 medicamentos
aprovados pelo Food and Drug Administration (FDA), dos Estados
Unidos, e encontraram 29 substâncias com ação sobre o vírus. Os resultados
foram publicados recentemente na revista científica F1000Research.
“Ao
analisarmos fármacos que estão ou já estiveram no mercado, diversos aspectos
são conhecidos e com essas informações é mais fácil e rápido desenhar
protocolos de dosagem e administração para testes em modelos animais, ou até
mesmo em humanos no combate ao zika vírus. Por outro lado, os medicamentos
descobertos podem servir como ponto de partida para o desenho de novas
moléculas para terapia antiviral”, explica Lucio Freitas-Junior,
coordenador da pesquisa.
Na
metodologia utilizada, a célula humana é infectada com o vírus zika por 72
horas e é simultaneamente exposta à ação dos fármacos, a fim de determinar a
capacidade de inibirem a infecção. Esta propriedade é chamada de atividade
antiviral, que é comparada com a molécula controle, interferon α 2A (IFNα2A),
uma proteína humana que faz parte da resposta imune antiviral do organismo e
que também apresenta alta atividade in vitro contra diversos vírus, inclusive o
zika.
O
estudo realizado no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais utilizou
um vírus isolado na região de Recife (PE), associado à epidemia de microcefalia
no nordeste brasileiro, e também levou em consideração a atividade dos fármacos
sob aspectos como a distribuição e a metabolização no organismo.
Dentre
os compostos descobertos, os que melhor apresentam atividade sobre o zika são
os fármacos que são ou foram utilizados no tratamento em diferentes condições,
com destaque para o palonosetron, um antiemético para o tratamento de
náusea induzida por quimioterapia de câncer, considerado o medicamento mais
promissor descoberto no estudo, com alta eficácia contra a infecção pelo vírus
zika e propriedades de distribuição e metabolização no organismo que podem
favorecer o tratamento da zika.
O
grupo trabalha há 10 anos com essa tecnologia aplicada à descoberta de fármacos
para doenças tropicais e é um dos líderes mundiais nesse tipo de aplicação.
Reconhecimento
internacional
Os
pesquisadores receberam US$ 50 mil da Medicines for Malaria Venture (MMV),
organização suíça, para estudos com doenças tropicais, como zika, dengue,
chikungunya, doença de Chagas, leishmaniose e verminoses.
O
investimento visa patrocinar pesquisas com o Pathogen Box, uma
coleção de 400 diferentes compostos moleculares ativos contra os agentes
causadores de doenças tropicais, oferecida sob demanda e sem custos para
cientistas de todo o mundo, e resulta da chamada competitiva “Pathogen
Box Challenge Grants”, concedida pela MMV, voltada para a
submissão de projetos de cientistas de regiões endêmicas (Endemic-Region
Challenge Grants).
Essas doenças afetam mais de um bilhão de
pessoas em todo o mundo. Algumas delas ainda não contam com opções de
tratamento; em outros casos, os medicamentos existentes podem apresentar pouca
eficácia e até contraindicações e efeitos colaterais graves, sendo necessário
descobrir novas opções de tratamento.