A reforma da
Previdência Social, pregada há algum tempo como a salvação da pátria para a
solução dos problemas financeiros do país, contém dispositivos pouco
comentados, mas que afetarão diretamente o futuro dos trabalhadores e
aposentados. Um deles trata da competência delegada para o ajuizamento de ações
contra o INSS, dentre elas as revisões de benefícios.
A competência
delegada, garantida por nossa Constituição Federal, é a possibilidade do
segurado ingressar com a ação na Justiça Estadual mais próxima do seu
domicílio, quando o mesmo não contar com unidades da Justiça Federal.
Recentemente, foi aprovada uma lei que veda tal garantia se houver fórum
Federal no raio de 70 quilômetros de distância da localidade do autor da ação.
Isso é um erro, e não respeita a realidade social e geográfica do país. A lei
entra em vigor apenas em janeiro de 2020, e depende da aprovação da PEC para
valer.
Importante frisar
que, em muitos casos, segurados não conseguem se dirigir ao banco em sua
própria cidade para realizar a prova de vida e continuar recebendo seu
benefício, em razão da dificuldade de locomoção por incapacidade. Agora,
imagina se esses beneficiários poderão percorrer longos 70 quilômetros para
buscar o socorro do Judiciário para garantir seu direito.
A competência
delegada se mostra como alternativa para as pessoas que não apresentam
possibilidade de se dirigir a Justiça Federal. E restringir este meio terá
graves consequências: muitos segurados e aposentados não terão condições de se
locomover e com isso o direito não será alcançado, E os que, com dificuldade,
conseguirem irão ter processos mais custosos e dificultosos para a obtenção do
direito. Isso sem contar o volume ainda maior de processos na Justiça Federal,
provocando uma sobrecarga ao sistema. Vale ressaltar que no projeto não existe
nenhum item para o aumento da atual estrutura física da Justiça Federal.
Em razão da menor
estrutura física da Justiça Federal tal, garantia foi consolidada, pois a
Justiça Estadual possui estrutura, além da presença, em quase todas as cidades
do país; ou em cidades vizinhas à residência do autor da ação.
Foi desconsiderado
que os processos serão mais longos, devido à necessidade de adiamentos de
audiências e demais atos processuais, contrariando o princípio da
razoabilidade, previsto no artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal: ‘a
todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração
do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.’
Particularmente, a
medida subestima os juízes estaduais, pois não existe outro motivo em retirar
essa garantia constitucional a não ser que o governo não confia na magistratura
estadual no julgamento de ações contra o INSS. Mais um erro.
Militando por anos
na esfera municipal eu sou categórico em afirmar: são absurdamente competentes
os magistrados de varas do interior, que julgam causas previdenciárias, com
enorme experiência na matéria e decisões que se mostram como aulas de Direito
Previdenciário.
Entendo, assim, a
medida como inconstitucional, pois o projeto vem de encontro ao princípio da
inafastabilidade da jurisdição, consagrado na Constituição Federal, como
direito ou garantia constitucional (art.5º, XXXV), logo, cláusula pétrea,
imodificável, conforme determina o artigo 60,§4º, IV, do Texto Constitucional.
Portanto, a
emenda, ao exigir a propositura das ações previdenciárias na Justiça Federal,
dificulta, inviabiliza, o acesso à jurisdição das pessoas; conforme o artigo
5º, XXXV, da Constituição Federal, ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça de direito’.
Em sua gritante
maioria, os que pleiteiam ações contra o INSS são pessoas com pouco recursos
financeiros e de saúde, onde o deslocamento se mostra dificultoso, por isso a
vontade do governo em restringir o acesso ao judiciário: contenção de gastos
com a judicialização. Importante divulgar e lutar contra este retrocesso,
enquanto a PEC não foi finalizada, pois após sua aprovação será tarde.
João
Badari - especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith,
Badari e Luchin Advogados