Nova seção do Mapa Nacional da Violência de Gênero traz dados inéditos sobre violência contra mulheres brasileiras no exterior
Mais de 1.500
mulheres brasileiras que residem no exterior registraram casos de violência de
gênero nos consulados brasileiros durante o ano de 2023. A informação faz parte
da nova atualização do
Mapa Nacional da Violência de Gênero, projeto viabilizado pelo Observatório
da Mulher Contra a Violência (OMV), do Senado Federal, pelo Instituto Avon,
incorporado pelo Instituto Natura em julho deste ano, e pela Gênero e Número.
Em seu aniversário
de um ano, a plataforma traz uma nova seção repleta de dados sistematizados
pela primeira vez em um painel e de forma atualizada, disponibilizados pelo
Ministério das Relações Exteriores (MRE). Os novos dados foram possibilitados
por meio de uma colaboração entre o MRE e o Senado Federal. As informações foram
coletadas em 186 repartições consulares, incluindo embaixadas com serviços
consulares, consulados-gerais, consulados e vice-consulados.
Para Daniela
Grelin, diretora executiva de Direitos e Saúde das Mulheres e Comunicação
Institucional do Instituto Natura, esses dados representam mais um grande
avanço para o enfrentamento das violências contra as mulheres. “A importância
desses números, pela primeira vez acessíveis desta maneira, é imensa. Eles
lançam luz sobre a dimensão do problema da violência de gênero contra as
mulheres brasileiras no exterior. Esta é uma inovação significativa que
transformará a maneira como abordamos e enfrentamos este grave problema
social".
Esta é a primeira
vez que os dados sobre a comunidade brasileira no exterior são disponibilizados
por gênero, permitindo assim o acesso à informação sobre os pedidos de ajuda
realizados pelas brasileiras. Atualmente, mais de dois milhões e meio de
brasileiras residem no exterior de forma documentada segundo as estimativas do
Itamaraty. Ӄ importante destacar que todas as mulheres brasileiras,
independente da sua situação migratória, têm o direito de solicitar ajuda nos
corpos consulares sem o risco de serem denunciadas”, explica Daniela.
A Procuradora
Especial da Mulher no Senado, Zenaide Maia, complementa: "A nova seção do
Mapa Nacional da Violência de Gênero, que agora incorpora dados inéditos sobre
a violência contra mulheres brasileiras no exterior, reforça a urgência de
proteger e apoiar nossas cidadãs onde quer que estejam. A equidade de gênero,
assim como o compartilhamento de dados são avanços que beneficiam a sociedade
como um todo.”
Mais de
metade dos casos correspondem a violência vicária
58% dos casos
contabilizados pelos consulados brasileiros correspondem a violência vicária,
que é a violência contra a mulher por meio da agressão a terceiros, durante o
ano de 2023 foram registradas 904 ocorrências deste tipo de violência.
Para Daniela
Grelin, "esses dados ampliam o nosso olhar sobre a violência doméstica e
familiar contra as brasileiras para uma esfera global, reconhecendo a violência
vicária como uma forma de agressão particularmente nociva às residentes no
exterior. Além disso, esses números ressaltam a importância das medidas de
proteção e suporte consular direcionado para essas mulheres, como o Espaço da
Mulher Brasileira, disponível em algumas repartições consulares, propondo um
acolhimento seguro, serviços especializados e personalizados para suas
necessidades.”
Em 2023, as
repartições consulares ao redor do mundo registraram 808 casos de disputa de
guarda e 96 casos de subtração de menores, ambos classificados como violência
vicária. Os dados revelam um ranking com os números de atendimentos registrados
por país, que leva em consideração os países com as maiores comunidades de brasileiras.
Entre os casos de
subtração de menores, Portugal lidera o ranking com 18 registros, seguido de
Estados Unidos, com 13, Itália, com 11, Líbano, com 5 e Reino Unido, com 4. Já
com relação ao índice de disputa de guarda, as comunidades brasileiras na
Alemanha saem na frente com 200 registros. Na sequência, estão Portugal com
181, Itália com 110, Reino Unido com 52 e Estados Unidos, fechando com 48
casos.
O conceito de
violência vicária, introduzido em 2012 pela psicóloga argentina Sonia Vaccaro,
refere-se à prática de prejudicar terceiros, geralmente filhos, com o objetivo
de causar sofrimento à mulher. Este é um tipo de violência contra a mulher que
muitas vezes não é discutido, mas que permeia em diversos contextos. Alguns
sinais que podem indicar o início de violência vicária incluem ameaças de
retirada da guarda dos filhos, recusa no pagamento de pensão sob a alegação de
que o dinheiro não beneficia a criança e chantagens emocionais que usam a
criança como instrumento.
Países com os
maiores números de violência contra brasileiras
Os dados ainda
revelam um ranking com os números de atendimentos registrados por país, que leva
em consideração os países com as maiores comunidades de brasileiras, com
destaque para a Itália, que no ano de 2023, registrou 350 casos de violência de
gênero nos consulados brasileiros. Seguida pelos Estados Unidos da América com
240 casos, Reino Unido com 188, Portugal com 127, e, depois, Espanha com 94.
Além disso, o
Egito e a Irlanda também se destacam com 64 e 50 solicitações de pedido de
ajuda, respectivamente. No entanto, estes países abrigam uma quantidade de
brasileiros estimados consideravelmente menor em comparação com os demais
países da lista. Por exemplo, no Egito, existe um registro de 2.500 brasileiros
estimados.
“Devemos
considerar que esses números talvez não consigam captar a real dimensão do
problema, devido à ausência de registros. Isso pode sugerir uma alta taxa de
subnotificação de mulheres que sofrem violência doméstica e não recorrem às
repartições consulares, ou que enfrentam obstáculos para acessar informações
sobre como e onde podem solicitar ajuda”, complementa Daniela Grelin.
Falta de
informação nos Consulados e Embaixadas
O Mapa Nacional da
Violência de Gênero ainda indica que 48,8% das repartições consulares ao redor
do mundo não tiveram registros de casos em 2023. Essa estatística pode sugerir
que a informação adequada sobre a possibilidade de denúncias e solicitações de
ajuda em situações de violência doméstica não alcança as cidadãs brasileiras,
ou que estas não buscam auxílio nas unidades consulares. Essa falta de
informação pode resultar na insuficiência das políticas de prevenção e apoio às
vítimas, além de mascarar a real situação da imigrante e contribuir para a
perpetuação deste tipo de violência. É fundamental que essas repartições
estejam equipadas com as informações necessárias para proteger e apoiar a
comunidade.
“A criação de
redes de apoio para brasileiras no exterior exige colaboração entre
instituições públicas, empresas privadas e sociedade civil. Ao saírem do
Brasil, muitas mulheres perdem o amparo das leis nacionais e enfrentam não só a
violência de gênero, mas também a violência institucional, muitas vezes sem
suporte. Somente com esforços integrados será possível garantir seus direitos e
dignidade.”, observa Elga Lopes, diretora da Secretaria de Transparência do
Senado Federal.
Mapa Nacional
da Violência de Gênero
Lançado em
novembro de 2023, o Mapa Nacional da Violência de Gênero é uma plataforma
interativa que reúne os principais dados nacionais públicos e indicadores de
violência contra as mulheres do Brasil, incluindo a Pesquisa Nacional de Violência
contra as Mulheres -- a mais longa série de estudos sobre o tema no país. Dos
dias 21 de agosto a 25 de setembro de 2023, 21.787 mulheres de 16 anos ou mais
foram entrevistadas por telefone, em amostra representativa da opinião da
população feminina brasileira.
"O Mapa
nasceu com o propósito de tornar visíveis e acessíveis os dados públicos. Com
essa nova atualização, estamos destacando uma realidade ainda pouco discutida:
a violência de gênero enfrentada pelas brasileiras que vivem fora do país. Sem
esses dados, não conseguimos dimensionar a verdadeira extensão do problema nem
direcionar o apoio adequado a essas mulheres. Acreditamos que a transparência e
a qualidade dos dados são essenciais para que nenhuma brasileira seja deixada
para trás", completa Vitória Régia da Silva, presidente e diretora de
conteúdo da Gênero e Número.
Instituto Natura
Gênero e Número - associação sem fins lucrativos dedicada à produção, análise e disseminação de dados especializados sobre gênero, raça e sexualidade.
Observatório da Mulher Contra a Violência do Senado Federal (OMV)
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