Psicóloga perinatal explica como lidar com a transição e oferece dicas
para ajudar mães a retornarem ao trabalho com mais segurança e confiançaCrédito: Drazen Zigic
Se você é mãe e precisa retornar ao trabalho após a licença-maternidade,
sabe que essa fase traz uma série de desafios. Desde a separação do bebê até o
ajuste à rotina profissional, esse período é repleto de emoções. A psicóloga
Rafaela Schiavo, uma das pioneiras da Psicologia Perinatal e da Parentalidade e
fundadora do Instituto MaterOnline, explica que essa transição pode impactar
mulheres de diferentes perfis e contextos, e ressalta que políticas de retorno
ao trabalho mais flexíveis podem fazer toda a diferença para o bem-estar das
mães e de seus bebês.
Segundo uma pesquisa da Fawcett Society, realizada em 2023, 84% das mães
relataram dificuldades emocionais ao retornar ao trabalho, e 40% delas
mencionaram a culpa como um sentimento recorrente. Além disso, uma pesquisa
recente do Datafolha revelou que 76% dos brasileiros apoiam o aumento da
licença-paternidade, e 67% acreditam que pais e mães deveriam ter o mesmo
período de afastamento.
O impacto emocional no retorno ao trabalho
Júlia Bozzetto, jornalista e mãe de um bebê de sete meses, descreve o
retorno ao trabalho como um dos momentos mais desafiadores de sua vida.
“Desde que voltei ao trabalho, meu 'castelo de cartas' desmoronou. Me sinto
exausta, sobrecarregada e, muitas vezes, triste. Parece que aquele ambiente de
trabalho não se encaixa mais em mim”. Júlia conta com a ajuda da sua rede
de apoio, formada por familiares, mas a separação do bebê e o cansaço emocional
ainda pesam.
Outra mãe, também jornalista, que prefere não se identificar, passou por
uma situação semelhante: “No meu primeiro dia de volta ao trabalho, cada
colega que perguntava sobre meu filho trazia à tona uma tristeza imensa. Eu
chorava a cada menção, porque ainda estava muito conectada emocionalmente a
ele. A separação foi brutal, mesmo sabendo que era a única solução no momento”.
Segundo Schiavo, essas experiências são comuns entre mães que enfrentam
a difícil tarefa de equilibrar as demandas profissionais com a preocupação
constante com seus filhos. “Muitas mulheres sentem que não estão sendo
suficientemente presentes na vida dos filhos. Esse sentimento é uma forma de
expressar o amor e a preocupação, mas é importante entender que não é um sinal
de que algo está sendo feito de forma errada”.
A importância de uma rede de apoio
Uma das maneiras de tornar esse processo menos doloroso é contar com uma
rede de apoio, que pode incluir familiares, amigos ou uma creche de confiança.
Júlia compartilha como a ajuda de sua sogra, cunhada e marido foi importante
para conciliar a maternidade e trabalho. “Sem o suporte deles, eu não sei
como teria conseguido. Mesmo com a ajuda, a separação é difícil. Na primeira
semana em que voltei ao trabalho, meu bebê ficou doente, e aquilo partiu meu
coração”.
A psicóloga enfatiza que, além do apoio prático, o suporte emocional
proporcionado por essa rede é fundamental. “Ter uma rede de apoio confiável
ajuda a diminuir a ansiedade e a sobrecarga emocional. Muitas mães que não têm
esse suporte enfrentam mais dificuldades, o que pode levar até a problemas como
ansiedade ou depressão”.
A mãe anônima entrevistada também destaca a importância de uma creche
equipada com câmeras, o que permitiu acompanhar seu bebê em tempo real. “Foi
uma forma de estar perto, mesmo estando longe. Saber que ele estava sendo bem
cuidado me deu paz, embora a culpa e a saudade estejam sempre presentes”.
Desafios no ambiente de trabalho
A falta de flexibilidade no ambiente de trabalho é outro desafio
frequentemente enfrentado pelas mães que retornam de licença-maternidade.
Schiavo aponta que muitas empresas ainda não estão preparadas para lidar com as
demandas dessa transição. “O retorno ao trabalho deveria ser gradual, com
políticas que permitam a transição de forma mais suave para mães e bebês”. Muitas
mães relatam que a ausência de políticas de flexibilidade prejudica o
desempenho profissional e emocional. “Essa falta pode aumentar o estresse e
a sensação de culpa das mães, prejudicando não apenas suas oportunidades de
promoção, mas também o seu bem-estar emocional”, completa.
Além disso, a falta de empatia por parte de colegas e superiores torna o
retorno ainda mais difícil. Segundo a Júlia, “muitas pessoas que não têm
filhos não entendem o que é ser mãe e como isso muda tudo na vida da mulher.
Falta empatia no ambiente de trabalho, e isso torna o processo de retorno ainda
mais difícil”.
Em um cenário ideal, de acordo com Rafaela Schiavo, o ambiente
corporativo deveria fornecer suporte, como horários flexíveis ou a
possibilidade de trabalho remoto, para facilitar a transição de mães que acabam
de retornar de licença.
Equidade nas licenças parentais
No Brasil, há discussões em andamento sobre a ampliação da
licença-paternidade, como forma de promover uma maior igualdade no cuidado com
os filhos. Atualmente, pais e mães possuem períodos de afastamento diferentes,
o que gera desafios tanto no ambiente familiar quanto no profissional. Segundo
a psicóloga, “quando pais e mães compartilham responsabilidades desde o
início, as mulheres enfrentam menos obstáculos em suas carreiras, enquanto os
homens têm a oportunidade de participar mais ativamente no cuidado com seus
filhos”.
Ela destaca ainda que a licença-maternidade de 120 dias oferecida por
muitas empresas não é suficiente para garantir uma separação saudável entre mãe
e bebê. “De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o ideal é que a
amamentação exclusiva ocorra até os seis meses de vida. Por isso, a
licença-maternidade de 120 dias não é suficiente para garantir esse
cuidado”.
Como passar pelo retorno ao trabalho com mais leveza
Para ajudar as mães a lidarem com essa fase desafiadora, Schiavo oferece
algumas orientações:
- Antecipe
uma separação gradual: Deixe o bebê com outras pessoas por algumas horas antes do
retorno ao trabalho, para que ambos se acostumem à separação.
- Construa
uma rede de apoio: Ter familiares, amigos ou uma creche de confiança é fundamental
para reduzir a ansiedade.
- Estabeleça
prioridades e respeite seus limites: Não tente ser perfeita em todas as áreas.
Respeitar seus limites é essencial.
- Busque
apoio psicológico: Caso a culpa e o estresse se tornem intensos, procurar um
profissional pode prevenir problemas mais sérios, como a depressão
pós-parto.
- Conecte-se
com seu bebê no tempo disponível: Aproveite os momentos com seu bebê de forma
plena, sem distrações, para fortalecer o vínculo.
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