Psicóloga comenta
sobre os principais fatores que causam um suicídio e como a sociedade pode
lidar com a situação
O setembro Amarelo tem como proposta sensibilizar a
população sobre o suicídio e é dedicado à sua prevenção. A importância desse
mês é a de trazer à discussão os cuidados e as formas de prevenir o ato,
desmistificando mitos e tabus.
O movimento
foi inspirado no caso Mike Emme (EUA) ocorrido em setembro de 1994. Ao perderem
o filho, os pais junto aos amigos distribuíram no velório de Mike 500 cartões
com fitas amarelas (a cor do Mustang do filho, que ele havia restaurado) com
mensagens de apoio às pessoas que pudessem estar em sofrimento e que pedissem
ajuda. Os cartões ganharam o mundo e a ideia acabou virando um movimento de
prevenção, com a fita amarela como símbolo.
Para a
psicóloga e professora do curso de Psicologia da
Universidade Cruzeiro do Sul, doutora em Psicologia da Saúde, Regiane de Aquino
Ribeiro Serralheiro, a sociedade costuma ser imediatista e pouco empática,
desvalorizando o sofrimento ao retratar que a pessoa que tenta o suicídio está
querendo chamar a atenção.
“Crises
excedem os recursos que as pessoas possuem naquele momento, e muitas vezes para
o ser humano em sofrimento é difícil pensar na mudança de rota, traçar outro
plano ou alterar o caminho. Parar, refletir e pedir auxílio nem sempre é
simples. A falta de informação e de conhecimento no assunto comprometem muito o
pedido de ajuda”, considera.
Desmistificando o suicídio
Quando o
indivíduo avalia a possibilidade de tirar a própria vida, na maioria das vezes
o desejo não é de morrer, diz Regiane, mas de acabar com o sofrimento intenso
pelo qual passa. Por isso, reconhecer que por trás do ato há uma pessoa, com
toda uma história, ajuda outras pessoas a humanizá-la, não a reduzindo ao ato.
Em muitas
situações, pode haver sinais que são possíveis de realizar o encaminhamento a
profissionais de saúde ou a rede de apoio, se identificados a
tempo. Contudo, a especialista considera a dificuldade em reconhecer que as
pessoas próximas, ou amadas, podem pensar em tal desfecho para sua vida.
“O suicídio
é um fenômeno presente em todas as culturas e em toda a humanidade, é
multifatorial e complexo, envolvendo fatores psicológicos, biológicos –
inclusive genéticos, sociais, culturais e ambientais. Portanto, tirar a própria
vida deve ser compreendido como um desfecho de uma série de fatores e não uma
única causa”, afirma.
Questão de
saúde pública, o suicídio continua sendo uma das principais causas de morte no
mundo. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), todos os anos
morrem mais pessoas por suicídio do que por HIV, malária, câncer de mama,
guerras ou homicídios. Estima-se que no mundo haja 800 mil mortes por ano, ou
seja, um caso a cada 40 segundos. A taxa entre jovens também representa grande
preocupação, bem como em crianças, e no caso do Brasil, o país ocupa o 8° lugar
no ranking, com um caso a cada 45 minutos.
Quanto aos
fatores de risco, há situações de baixo, médio e alto risco que devem ser
avaliadas: uma tentativa prévia recente, uma alta hospitalar por tentativa,
devem ser bem acompanhadas, pois a pessoa pode estar fragilizada. Outros podem
ser o desemprego, experiências de violência, abuso de álcool e substâncias.
“Identificar
os fatores de perigo como a presença de sentimentos de desamparo, desespero,
desesperança, solidão e comportamento impulsivo estão associados com tentativas
de suicídio”, esclarece.
Como agir com uma pessoa que pretende se suicidar?
Segundo a
professora da Universidade Cruzeiro do Sul, falar é necessário, acolher mais
ainda, pois a existência de vínculos e o bom suporte social e familiar tendem a
auxiliar. Com a presença de riscos, é fundamental o acompanhamento profissional
especializado.
“Abordar
nem sempre é fácil, mas é necessário. Por esse motivo, quem está por perto deve
encaminhar a pessoa ao profissional de saúde, como psicólogo e psiquiatra, que
são especialistas importantes para o indivíduo nessa situação. O
profissional deverá avaliar e manejar o problema de forma adequada, envolvendo
a família e amigos como parceiros no cuidado”, orienta.
Além da
prevenção, as pessoas que sofrem uma perda decorrente por suicídio também
necessitam de acolhimento. Trata-se da pósvenção: quando houve alguma tentativa
prévia ou quando da ocorrência do fato, amigos, familiares e outros contatos
com o falecido também são impactados (sobreviventes). “Cada perda pode afetar
de 6 a 30 pessoas. Aos sobreviventes do suicídio, a experiência de luto, pode
necessitar de acompanhamento para a expressão adequada e benéfica do luto”,
reforça a psicóloga.
O que a sociedade deve fazer para evitar?
Serralheiro
comenta que os cuidados à saúde mental devem ocorrer o
ano todo. Reduzir o preconceito e os tabus, bem como as condições que agravam o
sofrimento psíquico, a desigualdade social, maus tratos às minorias, condições
de precarização do trabalho, entre outros, favoreceriam uma sociedade mais
justa e igualitária.
“Programas
preventivos e de saúde mental, que por meio de psicoeducação poderiam
contribuir para avaliar mudanças bruscas de comportamento, podem ser indicativos
de sofrimento psíquico, neste caso, mas entendam que não é uma relação de causa
e efeito, pois o suicídio é multifatorial e complexo. Oferecer ajuda e
acolhimento pode ser um bom sinal, mas claro que é preciso pensar se também
conseguimos suportar tal demanda, pois se não estivermos bem, poderá ser muito
custoso ouvir tamanho sofrimento e estar disponível para ajudar. Temos que
reconhecer nosso limite e quando também podemos precisar de ajuda”, recomenda a
psicóloga.
Em caso de
auxílio, Regiane frisa que é possível buscar por meio dos Centros de Atenção
Psicossocial – CAPS, Unidades Básicas de Saúde, Centros de Atenção Integrada,
Serviços de Psicologia e Psiquiatria. Há ainda o Centro de Valorização
da Vida (CVV) no qual os atendimentos acontecem 24 horas por dia e podem ser
feitos pelo site cvv.org.br ou telefone para 188. O serviço é voluntário, gratuito para
todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por
telefone, e-mail ou chat.
Por fim, a especialista diz que: “Se você estiver com dificuldades, procure ajuda profissional. Compartilhe os seus sentimentos, compreenda que é uma crise e que irá passar. Não tenha vergonha de falar do que dói, entenda que você não é um estorvo e não está sozinho. Momentos turbulentos são difíceis como tempestades, mas elas sempre passam”, pontua.
Universidade Cruzeiro do Sul
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