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quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Turistas internacionais, incluindo brasileiros, e cidadãos locais rejeitam caça como caminho para o turismo da África do Sul

Pesquisa da Proteção Animal Mundial ouviu milhares de pessoas em 10 países. Brasileiros são amplamente favoráveis a alternativas de observação da fauna e expedições fotográficas ao invés da caça

 

Uma nova pesquisa divulgada hoje, Dia Internacional do Leão, revela que tanto cidadãos sul-africanos quanto turistas internacionais de nove nacionalidades querem o fim da caça esportiva em favor de experiências amigáveis à vida silvestre no leque de atrativos turísticos da África do Sul. A informação é publicada em paralelo à realização de uma consulta pública sobre o documento preliminar oficial de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade por parte do governo sul-africano.

 

O levantamento revelou uma oposição universalmente forte à atividade, além de posturas favoráveis ao financiamento da proteção da icônica fauna silvestre do país por meio de alternativas não letais, tais como o turismo responsável.

 

As principais descobertas da pesquisa:


·        84% dos turistas internacionais concordam que o governo sul-africano deve priorizar o turismo amigo da vida silvestre ao invés da caça esportiva;


·        74% dos turistas internacionais concordam que fazer da caça esportiva um pilar de suas políticas prejudicaria a reputação da África do Sul e 72% se sentiriam totalmente desestimulados a visitar o país;


·        7 em cada 10 cidadãos sul-africanos concordam que seu país seria um destino turístico mais atraente se proibisse a caça esportiva;


·        Três quartos (74%) dos cidadãos sul-africanos concordam que a caça esportiva é inaceitável até que todas as alternativas de turismo amigo da vida selvagem tenham sido esgotadas.

 

Foram ouvidas 10.900 pessoas de todo o mundo, incluindo visitantes estrangeiros dos principais mercados emissores de turistas à África do Sul residentes fora do continente africano (Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha, França, Holanda, Austrália, Índia, Brasil e Canadá), além dos próprios cidadãos sul-africanos. As entrevistas foram conduzidas pela agência londrina Flood & Partners durante o mês de abril. Ao todo, 1091 brasileiros foram consultados, quantidade semelhante às dos demais estrangeiros.


 

Um elefante na sala da comunidade internacional

 

Diante da percepção de sinais confusos sobre a conciliação entre turismo sustentável e desenvolvimento econômico por parte do governo sul-africano ao longo do último ano, a Proteção Animal Mundial, organização não-governamental que trabalha em prol do bem-estar animal, encomendou a pesquisa a fim de qualificar o debate público.

 

Nesse sentido, o levantamento foi concebido para compreender as inclinações nos principais mercados emissores de turistas para a África do Sul em relação à caça esportiva, para averiguar as percepções dos cidadãos locais em relação à prática e em oposição a alternativas de turismo amigáveis com a vida selvagem, além de avaliar quais caminhos são considerados aceitáveis como parte de estratégias futuras da África do Sul para o turismo sustentável da vida selvagem.

 

As constatações servem, inclusive, para as reflexões de outros países com relevância atual e potencial de desenvolvimento para o turismo de natureza, como é o caso do Brasil.

 

Para se ter uma ideia da importância do segmento, segundo dados do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC, The Economic Impact of Global Wildlife Tourism 2019), em 2018 o turismo de vida silvestre contribuiu diretamente com US$ 120 bilhões para as economias ao redor do globo. Adicionando os benefícios indiretos da cadeia de suprimentos, a contribuição total do nicho salta para US$ 343,6 bilhões ou 3,9% do PIB global de Viagens e Turismo no ano.

 

Especificamente em relação à realidade brasileira, em 2019, último ano fechado antes dos impactos da pandemia de Covid-19, o Brasil recebeu 6,3 milhões de visitantes estrangeiros, que gastaram aproximadamente US$ 6 bi por aqui. O Estudo da Demanda Turística Internacional (Ministério do Turismo, 2019) aponta que “natureza, ecoturismo ou aventura” foi a segunda principal motivação dos estrangeiros que vieram a lazer para o país, respondendo por quase 19% do total das viagens da categoria.

 

A título de comparação, números da Organização Mundial do Turismo (International Tourism Highlights 2020) mostram que em 2019 a África do Sul recebeu 10,3 milhões de turistas internacionais, que deixaram divisas da ordem de US$ 8,4 bilhões no país.

Opiniões dos brasileiros e alguns paralelos

 

Diferentemente da África do Sul, a caça esportiva ou comercial de animais silvestres é proibida no Brasil há mais de meio século. Essa postura nacional consolidada aparece refletida nos sentimentos dos brasileiros ao avaliarem as perspectivas para o turismo daquele país.

 

De forma geral, nossos compatriotas acreditam que a exploração da caça como atrativo turístico é algo nocivo para a reputação do país africano, e algo que os desestimula decisivamente a realizar uma visita. Parecem, todavia, ligeiramente mais tolerantes com a ideia quando a caça é dissimulada como política de conservação. Por outro lado, entendem que as práticas amigáveis à vida silvestre devem realmente ser priorizadas, com maior predileção para santuários de animais, observação distanciada e expedições fotográficas. Já as alternativas que envolvem sofrimento animal são rechaçadas como caminhos para o desenvolvimento.

Numa análise mais detalhada, cerca de 75% dos brasileiros ouvidos acreditam que adoção da caça esportiva como um pilar da economia e da política de conservação da África do Sul prejudicará a reputação do país como líder de conservação na África, uma proporção bastante alinhada com o número global (74%). Os brasileiros foram um pouco mais aderentes à essa afirmação do que os australianos (74%), canadenses (73%), indianos (70%), e muito mais favoráveis do que os americanos (68%). 

 


Quando perguntados se ficariam desestimulados como turistas a visitar um país que tem a caça esportiva como uma parte fundamental de sua economia e política de conservação, os brasileiros, ainda que manifestando ampla rejeição à proposição (66%), mostraram uma das menores adesões, junto com os americanos (65%). A concordância global nesse caso foi de 72%.


Quando questionados em relação à
inclinação para visitar um país que encoraja a caça esportiva como uma forma aceitável e sustentável de manejar suas populações de animais selvagens, os brasileiros continuaram se mostrando majoritariamente desestimulados, numa taxa mais alta (68%) do que na proposição anterior, novamente ligeiramente abaixo do patamar global (71%) e num nível pouco acima dos americanos (65%), os menos aderentes.


Já em relação à ideia de que governo sul-africano deve priorizar o turismo amigo da vida selvagem ao invés da caça esportiva como parte fundamental da economia e política de conservação do país, os brasileiros foram esmagadoramente favoráveis (90%). A adesão, nesse caso, foi bem superior à concordância global (84%) e em linha com a dos franceses (90%).


Os entrevistados também foram interpelados especificamente em relação a
diversos tipos de práticas aceitáveis para o turismo sul-africano como forma de identificar alternativas positivas e de potencial para o desenvolvimento da atividade. 

Juntamente com australianos (95%), britânicos (94%) e canadenses (93%), os brasileiros (93%) foram os mais amplamente favoráveis a santuários de vida silvestre (locais onde os animais são resgatados e recebem cuidados adequados por toda a vida) como modelo positivo. O dado global foi de 91%.

 

Concordância semelhante foi registrada para a proposta de turismo limitado à observação e fotografia dos animais em seus habitats naturais. Os australianos (94%) lideraram o apoio à prática, seguidos de brasileiros (93%), canadenses (93%) e britânicos (92%). O dado global foi de 91%.

 

Já os zoológicos, ainda que aceitos, contam como menor apoio: 82% dos turistas internacionais aceitam o modelo. Brasileiros (89%) e australianos (89%) são os mais favoráveis à modalidade.

 

Práticas turísticas que envolvem sofrimento animal foram reconhecidas como tal – e majoritariamente rejeitadas pelos viajantes internacionais. Fazendas comerciais de vida silvestre (instalações nas quais os animais são criados e usados para entretenimento, abate e comercialização) foram vistas como aceitáveis para apenas 23% dos britânicos, 24% dos brasileiros e 26% dos franceses (32% global). A maioria dos indianos (51%) ouvidos, entretanto, viram a ideia com bons olhos. Prática mais extrema, a caça e o abate de animais para esporte ou entretenimento foi tida como aceitável para apenas 19% dos turistas ouvidos. Britânicos (12%), brasileiros (13%) e alemães (14%) foram os menos tolerantes.

 

Reconstruindo um turismo melhor pós-pandemia: ético e sustentável

 

“O documento oficial em consulta pelo governo sul-africano busca criar uma nação próspera, vivendo em harmonia com a natureza, no qual a biodiversidade seja conservada para as presentes e futuras gerações. E este é um grande começo. Mas faltam clareza ou compromissos tangíveis para acabar com o comércio global de animais silvestres, algo que inclui a criação de leões em cativeiro, o uso de grandes felinos para a medicina tradicional e a caça esportiva”, define Nick Stewart, chefe global de campanhas de Vida Silvestre da Proteção Animal Mundial.

 

“A República da África do Sul precisa tomar medidas decisivas para avançar em direção a um futuro mais favorável à vida selvagem. Não é tarde para aproveitar a oportunidade de tomar uma posição clara, adotando totalmente alternativas não letais e amigas da vida silvestre, incluindo o turismo responsável, que é claramente o que os turistas internacionais e a população local estão procurando. É hora de assumir compromissos públicos e com prazo determinado, começando com a eliminação em definitivo da caça esportiva”, defende Stewart.

 

Nas palavras de Edith Kabesiime, gerente Vida Silvestre do Proteção Animal Mundial na África, “a vida de um animal selvagem vale muito mais do que o troféu ao qual é muitas vezes reduzido. Essa é a visão compartilhada dos turistas, que querem visitar o país para ver a vida silvestre viva e próspera, e dos sul-africanos, que querem ver a incrível fauna local devidamente protegida, de forma humana e ética”.

 

“O governo precisa ouvir as vozes sul-africanas que nitidamente não querem que o patrimônio de vida silvestre seja saqueado. E elas clamam por mudanças. Continuar a explorar animais selvagens como alvos fáceis à mercê de visitantes ocidentais ricos está ultrapassado em um mundo no qual visões da sociedade estão mudando rapidamente”, prossegue Kabesiime. “Sem uma posição firme, a África do Sul está sufocando o pensamento inovador para identificar, incentivar e implementar alternativas não letais de conservação da vida selvagem africana. Animais silvestres têm direito a uma vida selvagem, livre de exploração comercial cruel. Devemos respeitá-los e protegê-los”, conclui.

 

Chega de sinais trocados

 

Em maio de 2021, a Proteção Animal Mundial saudou a decisão do Departamento de Silvicultura, Pesca e Meio Ambiente da África do Sul (Department of Forestry, Fisheries and the Environment) quando foram anunciadas novas medidas para interromper a reprodução de leões em cativeiro, bem como a eliminação progressiva da indústria comercial de leões em cativeiro. Este movimento, no entanto, cessou, com pouco progresso ocorrendo no ano seguinte.

 

A conjunção do desenvolvimento do turismo amigo da vida silvestre e da eliminação da exploração da vida selvagem, como a caça esportiva e a criação de leões em cativeiro, tem o potencial de melhorar a reputação internacional da África do Sul como líder global em experiências benéficas com a fauna selvagem. Pode reposicionar o país como um destino preferencial ainda mais competitivo para viajantes ​​e operadores turísticos responsáveis.

 

A Proteção Animal Mundial está agora pedindo à República da África do Sul que:


·        rejeite práticas cruéis e letais, como a caça esportiva, como uma abordagem básica para o desenvolvimento sustentável e para a conservação;


·        assuma o compromisso público de acabar com a caça esportiva;


·        invista em alternativas econômicas não letais, incluindo o turismo amigo da vida selvagem.

 

Juntamente com a divulgação internacional da pesquisa de opinião, a Proteção Animal Mundial também está convocando as pessoas para que engrossem a oposição às práticas cruéis de exploração da vida silvestre e reforcem o apoio às alternativas amigáveis na África do Sul.

 

No site da entidade os visitantes encontram um modelo de carta (em Inglês, com tradução Português) a ser enviadas para as autoridades sul-africanas que estão conduzindo a consulta pública a respeito do documento de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade. Há também a possibilidade de replicar um tuíte sobre o assunto como parte da campanha.

 

Sobre a Proteção Animal Mundial (World Animal Protection) - A Proteção Animal Mundial é a voz global do bem-estar animal, com mais de 70 anos de experiência em campanhas por um mundo no qual os animais vivam livres de crueldade e sofrimento. Temos escritórios em 12 países e desenvolvemos trabalhos em 47 países ao todo. Colaboramos com comunidades locais, com o setor privado, com a sociedade civil e governos para mudar a vida dos animais para melhor. Nosso objetivo é mudar a maneira como o mundo trabalha para acabar com a crueldade e o sofrimento dos animais selvagens e de produção. Por meio de nossa estratégia global de sistema alimentar, vamos acabar com a pecuária industrial intensiva e criar um sistema alimentar humano e sustentável, que coloca os animais em primeiro lugar. Ao transformar os sistemas falhos que impulsionam a exploração e a mercantilização, daremos aos animais silvestres o direito a uma vida silvestre. Nosso trabalho para proteger os animais desempenhará um papel vital na solução da emergência climática, da crise de saúde pública e da devastação de habitats naturais.


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