Pesquisa da Proteção Animal Mundial ouviu milhares de pessoas em 10 países. Brasileiros são amplamente favoráveis a alternativas de observação da fauna e expedições fotográficas ao invés da caça
Uma nova pesquisa divulgada hoje, Dia
Internacional do Leão, revela que tanto
cidadãos sul-africanos quanto turistas internacionais de nove nacionalidades
querem o fim da caça esportiva em favor de experiências amigáveis à vida
silvestre no leque de atrativos turísticos da África do Sul. A
informação é publicada em paralelo à realização de uma consulta pública sobre o documento preliminar oficial de
Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade por parte do governo
sul-africano.
O levantamento revelou uma oposição universalmente forte
à atividade, além de posturas favoráveis ao financiamento da proteção da
icônica fauna silvestre do país por meio de alternativas não letais,
tais como o turismo responsável.
As principais descobertas da pesquisa:
· 84% dos
turistas internacionais concordam que o governo sul-africano deve priorizar o
turismo amigo da vida silvestre ao invés da caça esportiva;
· 74% dos
turistas internacionais concordam que fazer da caça esportiva um pilar de suas
políticas prejudicaria a reputação da África do Sul e 72% se sentiriam
totalmente desestimulados a visitar o país;
· 7 em cada
10 cidadãos sul-africanos concordam que seu país seria um destino turístico
mais atraente se proibisse a caça esportiva;
· Três
quartos (74%) dos cidadãos sul-africanos concordam que a caça esportiva é
inaceitável até que todas as alternativas de turismo amigo da vida selvagem
tenham sido esgotadas.
Foram ouvidas 10.900 pessoas de todo o mundo,
incluindo visitantes estrangeiros dos principais mercados emissores de turistas
à África do Sul residentes fora do continente africano (Reino Unido, Estados
Unidos, Alemanha, França, Holanda, Austrália, Índia, Brasil e Canadá), além dos
próprios cidadãos sul-africanos. As entrevistas foram conduzidas
pela agência londrina Flood & Partners durante o mês de abril. Ao todo,
1091 brasileiros foram consultados, quantidade semelhante às dos demais
estrangeiros.
Um elefante na sala da comunidade internacional
Diante da percepção de sinais confusos sobre a
conciliação entre turismo sustentável e desenvolvimento econômico por parte do
governo sul-africano ao longo do último ano, a Proteção Animal Mundial,
organização não-governamental que trabalha em prol do bem-estar animal,
encomendou a pesquisa a fim de qualificar o debate público.
Nesse sentido, o levantamento foi concebido para compreender
as inclinações nos principais mercados emissores de turistas para a África do
Sul em relação à caça esportiva, para averiguar as percepções dos cidadãos
locais em relação à prática e em oposição a alternativas de turismo amigáveis
com a vida selvagem, além de avaliar quais caminhos são considerados aceitáveis
como parte de estratégias futuras da África do Sul para o turismo sustentável
da vida selvagem.
As constatações servem, inclusive, para as reflexões de
outros países com relevância atual e potencial de desenvolvimento para o
turismo de natureza, como é o caso do Brasil.
Para se ter uma ideia da importância do segmento, segundo
dados do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC, The Economic Impact of Global Wildlife Tourism 2019), em
2018 o turismo de vida silvestre contribuiu diretamente com US$ 120 bilhões
para as economias ao redor do globo. Adicionando os benefícios indiretos da
cadeia de suprimentos, a contribuição total do nicho salta para US$ 343,6
bilhões ou 3,9% do PIB global de Viagens e Turismo no ano.
Especificamente em relação à realidade brasileira, em 2019,
último ano fechado antes dos impactos da pandemia de Covid-19, o Brasil recebeu
6,3 milhões de visitantes estrangeiros, que gastaram aproximadamente US$ 6 bi
por aqui. O Estudo da Demanda Turística Internacional (Ministério do Turismo, 2019) aponta que “natureza,
ecoturismo ou aventura” foi a segunda principal motivação dos estrangeiros que
vieram a lazer para o país, respondendo por quase 19% do total das viagens da
categoria.
A título de comparação, números da Organização Mundial do
Turismo (International Tourism Highlights 2020) mostram que em 2019
a África do Sul recebeu 10,3 milhões de turistas internacionais, que deixaram
divisas da ordem de US$ 8,4 bilhões no país.
Opiniões dos brasileiros e alguns paralelos
Diferentemente da África do Sul, a caça esportiva ou
comercial de animais silvestres é proibida no Brasil há mais de meio século.
Essa postura nacional consolidada aparece refletida nos sentimentos dos
brasileiros ao avaliarem as perspectivas para o turismo daquele país.
De forma geral, nossos compatriotas acreditam que a exploração da caça como atrativo turístico é algo nocivo para a reputação do país africano, e algo que os desestimula decisivamente a realizar uma visita. Parecem, todavia, ligeiramente mais tolerantes com a ideia quando a caça é dissimulada como política de conservação. Por outro lado, entendem que as práticas amigáveis à vida silvestre devem realmente ser priorizadas, com maior predileção para santuários de animais, observação distanciada e expedições fotográficas. Já as alternativas que envolvem sofrimento animal são rechaçadas como caminhos para o desenvolvimento.
Numa análise mais detalhada, cerca de 75% dos brasileiros
ouvidos acreditam que adoção da caça esportiva como um pilar da economia
e da política de conservação da África do Sul prejudicará a reputação
do país como líder de conservação na África, uma proporção bastante alinhada
com o número global (74%). Os brasileiros foram um pouco mais aderentes à essa
afirmação do que os australianos (74%), canadenses (73%), indianos (70%), e
muito mais favoráveis do que os americanos (68%).
Quando perguntados se ficariam desestimulados
como turistas a visitar um país que tem a caça esportiva como uma parte
fundamental de sua economia e política de conservação, os
brasileiros, ainda que manifestando ampla rejeição à proposição (66%),
mostraram uma das menores adesões, junto com os americanos (65%). A
concordância global nesse caso foi de 72%.
Já em relação à ideia de que governo sul-africano deve
priorizar o turismo amigo da vida selvagem ao invés da caça esportiva como
parte fundamental da economia e política de conservação do
país, os brasileiros foram esmagadoramente favoráveis (90%). A adesão, nesse
caso, foi bem superior à concordância global (84%) e em linha com a dos
franceses (90%).
Juntamente com australianos (95%), britânicos (94%) e
canadenses (93%), os brasileiros (93%) foram os mais amplamente favoráveis a santuários
de vida silvestre (locais onde os animais são resgatados e
recebem cuidados adequados por toda a vida) como modelo positivo. O dado global
foi de 91%.
Concordância semelhante foi registrada para a proposta de turismo limitado à observação e fotografia dos animais em seus habitats naturais. Os australianos (94%) lideraram o apoio à prática, seguidos de brasileiros (93%), canadenses (93%) e britânicos (92%). O dado global foi de 91%.
Já os zoológicos, ainda que aceitos,
contam como menor apoio: 82% dos turistas internacionais aceitam o modelo.
Brasileiros (89%) e australianos (89%) são os mais favoráveis à modalidade.
Práticas turísticas que envolvem sofrimento animal foram
reconhecidas como tal – e majoritariamente rejeitadas pelos viajantes
internacionais. Fazendas comerciais de vida
silvestre (instalações nas quais os animais são criados e
usados para entretenimento, abate e comercialização) foram vistas como
aceitáveis para apenas 23% dos britânicos, 24% dos brasileiros e 26% dos
franceses (32% global). A maioria dos indianos (51%) ouvidos, entretanto, viram
a ideia com bons olhos. Prática mais extrema, a caça e o abate de animais
para esporte ou entretenimento foi tida como aceitável para
apenas 19% dos turistas ouvidos. Britânicos (12%), brasileiros (13%) e alemães
(14%) foram os menos tolerantes.
Reconstruindo um turismo melhor pós-pandemia: ético e
sustentável
“O documento oficial em consulta pelo governo sul-africano
busca criar uma nação próspera, vivendo em harmonia com a natureza, no qual a
biodiversidade seja conservada para as presentes e futuras gerações. E este é
um grande começo. Mas faltam clareza ou compromissos tangíveis para acabar com
o comércio global de animais silvestres, algo que inclui a criação de leões em
cativeiro, o uso de grandes felinos para a medicina tradicional e a caça
esportiva”, define Nick Stewart, chefe global de campanhas de Vida
Silvestre da Proteção Animal Mundial.
“A República da África do Sul precisa tomar medidas
decisivas para avançar em direção a um futuro mais favorável à vida selvagem.
Não é tarde para aproveitar a oportunidade de tomar uma posição clara, adotando
totalmente alternativas não letais e amigas da vida silvestre, incluindo o
turismo responsável, que é claramente o que os turistas internacionais e a
população local estão procurando. É hora de assumir compromissos públicos e com prazo
determinado, começando com a eliminação em definitivo da caça esportiva”,
defende Stewart.
Nas palavras de Edith Kabesiime, gerente Vida Silvestre do Proteção
Animal Mundial na África, “a vida de um animal selvagem vale
muito mais do que o troféu ao qual é muitas vezes reduzido. Essa é a visão
compartilhada dos turistas, que querem visitar o país para ver a vida silvestre
viva e próspera, e dos sul-africanos, que querem ver a incrível fauna local
devidamente protegida, de forma humana e ética”.
“O governo precisa ouvir as vozes sul-africanas que
nitidamente não querem que o patrimônio de vida silvestre seja saqueado. E elas
clamam por mudanças. Continuar a explorar animais selvagens como alvos fáceis à
mercê de visitantes ocidentais ricos está ultrapassado em um mundo no qual
visões da sociedade estão mudando rapidamente”, prossegue Kabesiime. “Sem uma
posição firme, a África do Sul está sufocando o pensamento inovador para
identificar, incentivar e implementar alternativas não letais de conservação da
vida selvagem africana. Animais silvestres têm direito a uma vida selvagem,
livre de exploração comercial cruel. Devemos respeitá-los e protegê-los”,
conclui.
Chega de sinais trocados
Em maio de 2021, a Proteção Animal Mundial saudou a decisão do
Departamento de Silvicultura, Pesca e Meio Ambiente da África do Sul
(Department of Forestry, Fisheries and the Environment) quando foram anunciadas
novas medidas para interromper a reprodução de leões em cativeiro, bem como a
eliminação progressiva da indústria comercial de leões em cativeiro.
Este movimento, no entanto, cessou, com pouco progresso ocorrendo no ano
seguinte.
A conjunção do desenvolvimento do turismo amigo da vida
silvestre e da eliminação da exploração da vida selvagem, como a caça esportiva
e a criação de leões em cativeiro, tem o potencial de melhorar a
reputação internacional da África do Sul como líder global em experiências
benéficas com a fauna selvagem. Pode reposicionar o país como
um destino preferencial ainda mais competitivo para viajantes e
operadores turísticos responsáveis.
A Proteção Animal Mundial está agora pedindo à República da
África do Sul que:
· rejeite
práticas cruéis e letais, como a caça esportiva, como uma abordagem básica para
o desenvolvimento sustentável e para a conservação;
· assuma o
compromisso público de acabar com a caça esportiva;
· invista em
alternativas econômicas não letais, incluindo o turismo amigo da vida selvagem.
Juntamente com a divulgação internacional da pesquisa de opinião,
a Proteção Animal Mundial também está convocando as pessoas para que engrossem a oposição
às práticas cruéis de exploração da vida silvestre e reforcem o apoio às
alternativas amigáveis na África do Sul.
No site da entidade os visitantes encontram um modelo de
carta (em Inglês, com tradução Português) a ser enviadas para as autoridades
sul-africanas que estão conduzindo a consulta pública a respeito do documento
de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade. Há também a possibilidade
de replicar um tuíte sobre o assunto como parte da campanha.
Sobre
a Proteção Animal Mundial (World Animal Protection) - A Proteção Animal Mundial é a voz global do bem-estar animal,
com mais de 70 anos de experiência em campanhas por um mundo no qual os animais
vivam livres de crueldade e sofrimento. Temos escritórios em 12 países e
desenvolvemos trabalhos em 47 países ao todo. Colaboramos com comunidades
locais, com o setor privado, com a sociedade civil e governos para mudar a vida
dos animais para melhor. Nosso objetivo é mudar a maneira como o mundo trabalha
para acabar com a crueldade e o sofrimento dos animais selvagens e de produção.
Por meio de nossa estratégia global de sistema alimentar, vamos acabar com a
pecuária industrial intensiva e criar um sistema alimentar humano e
sustentável, que coloca os animais em primeiro lugar. Ao transformar os
sistemas falhos que impulsionam a exploração e a mercantilização, daremos aos
animais silvestres o direito a uma vida silvestre. Nosso trabalho para proteger
os animais desempenhará um papel vital na solução da emergência climática, da
crise de saúde pública e da devastação de habitats naturais.
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