Recentemente, a pandemia da Covid-19
trouxe de volta o fantasma da fome a milhares de famílias brasileiras, pois
reforçou a desigualdade social, acentuou a condição de vulnerabilidade das
populações carentes e os indicadores de pobreza e miséria, agravando a
desnutrição, fome e a insegurança alimentar no Brasil.
Infelizmente, essa realidade não foi exclusiva do
Brasil. Os dados internacionais demonstram que, em 2019, cerca de 690 milhões
de pessoas se encontravam em situação de fome, representando 8,9% da população
mundial.
Aproximadamente 750 milhões de pessoas (1 a cada
10) no mundo estiveram expostas a níveis graves de insegurança alimentar, sendo
que se somarmos os níveis moderados e graves estas estimativas são ainda
piores, apontando que quase 2 bilhões de pessoas ao redor do mundo não tiveram
um acesso regular a alimentos em quantidade e qualidade adequadas nos últimos
anos.
A insegurança alimentar é a condição de não ter
acesso pleno e permanente a alimentos, sendo a fome e consequentemente a
desnutrição a sua forma mais grave.
No Brasil, segundo o relatório elaborado pelo grupo
Food for Justice, apenas 44,8% da população
brasileira se encontra em situação de segurança alimentar.
Dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança
Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (VIGISAN), realizado em
cinco macrorregiões brasileiras, nas áreas urbanas e rurais, entre novembro de
2021 a abril de 2022, mostrou que o povo brasileiro vem empobrecendo
progressivamente e enfrentando as consequências da precarização da vida e isso
teve reflexos claros na capacidade de acesso à alimentação suficiente e
adequada pelas famílias brasileiras.
Foi identificado que em dezembro de 2020, 9% da
população (ou 19 milhões de pessoas) conviviam com a fome, sendo que, em 2021,
este percentual passou para 15,5% da população (33,1 milhões de pessoas), ou
seja, 14 milhões de brasileiros foram deslocados para tal condição em um ano.
Segundo o Fundo de Emergência Internacional das
Nações Unidas para a Infância (UNICEF), ao menos 250 milhões de crianças sofrem
de desnutrição e a Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que 45% das mortes
de pessoas com menos de 5 anos estão relacionadas à desnutrição.
A desnutrição infantil permanece como um problema
de saúde pública mundial. No Brasil, o quadro não é diferente. Entre os anos de
2015 e 2021, a desnutrição entre crianças de 0 a 19 anos aumentou, assim como a
fome, especialmente entre os meninos negros (pretos e pardos), sendo 2 pontos
percentuais acima do valor observado entre meninos brancos.
Insuficiência de renda, desemprego e subemprego,
deficiências habitacionais, falta de acesso à educação e precárias condições de
saúde estão diretamente inter-relacionados com a fome e desnutrição.
São muitas as condições de desigualdade que
penalizam vários segmentos da população brasileira, porém deve ser dada uma
atenção especial às crianças que, em condição de carência alimentar, podem ter
suas potencialidades e seu futuro comprometidos, lembrando que a violação do
direito humano à alimentação adequada constitui violação do preceito
constitucional no Brasil.
Apesar de existirem diversos programas disponíveis,
ainda há uma longa jornada a ser percorrida para erradicar a fome do Brasil.
Quando olhamos para a fome e desnutrição, devemos nos lembrar que cada número absoluto representa a vida de uma pessoa e que mesmo pequenas mudanças percentuais nestes números significam a melhoria das condições de saúde e de vida de milhões de pessoas convivendo diariamente com a fome.
Rosana Farah Toimil - professora do curso de Nutrição da Universidade Presbiteriana
Mackenzie.
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