O número de Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) emitidas com indicações de condutor que possui algum tipo de restrição visual, exigindo o uso de lentes de contato ou óculos, por exemplo, aumentou 44%, entre 2014 e 2020. Atualmente, o grupo com algum tipo de restrição de visão descrita na CNH representa quase um terço da população habilitada no Brasil. São 20,7 milhões de motoristas e motociclistas, segundo levantamento inédito divulgado pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO).
A análise, realizada
pelos oftalmologistas com base em dados oficiais do Departamento Nacional de
Trânsito (Denatran), demonstra que, em números absolutos, São Paulo é o estado
que habilitou o maior contingente de motoristas com problemas visuais, com mais
de 6,7 milhões de pessoas. Em segundo e terceiro lugares estão,
respectivamente, Minas Gerais, com 1,9 milhão de condutores, e Rio de Janeiro,
com 1,8 milhão. Roraima tem o menor número de condutores com restrição: pouco
mais de 33 mil.
Proporcionalmente, o
número de CNHs assinaladas com restrições em relação ao total de motoristas ou
motociclista é mais expressivo no Rio Grande do Norte, onde 38% dos habilitados
possuem algum problema de visão registrado na chamada carteira de motorista. Na
Paraíba, as anotações de restrição visual atingem 35% dos condutores do estado
e, no Rio de Janeiro, 31%. Na sequência, aparecem Ceará e Alagoas, ambos com
30%. O estado com menor proporção de condutores com problemas na vista é o
Acre: 17%.
Entre 2014 e 2020, os
estados que registraram o maior aumento proporcional no número de condutores
com dificuldades para enxergar foram: Goiás e Tocantins (73%), Roraima (71%),
Mato Grosso (66%) e Acre (64%). Na última colocação está o Distrito Federal,
com crescimento de 25%.
Restrições - O levantamento
também aponta quais tipos de anotações aparecem com maior frequência na CNH dos
motoristas brasileiros. Na primeira colocação está a necessidade do uso de
lentes corretivas (restrição de código A), com mais de 20 milhões de condutores
que não podem dirigir ou pilotar se não estiverem fazendo uso de óculos ou
lentes de contato.
Em segundo lugar, com
mais de 332 mil casos, constam as restrições associadas à visão monocular
(código Z), ou seja, quando um dos olhos é diagnosticado com acuidade zero. Em
terceiro lugar, com aproximadamente 102 mil casos, estão os motoristas
impedidos de dirigir após o pôr-do-sol (código U), seguido de outros 24 mil
motociclistas que precisam o uso de capacete de segurança com viseira protetora
sem limitação de campo visual (código V).
Avaliação - A inclusão dessas
anotações na CNH é feita no momento do exame para fazer o documento pela
primeira vez ou em sua renovação. A avaliação dos candidatos é feita pelo
médico do tráfego, que analisa as condições do candidato de conduzir seu
veículo sem oferecer perigo para outros motoristas, passageiros e pedestres.
Nesse exame, ele identifica a existência de uma deficiência e recomenda que o
interessado busque o suporte de um oftalmologista, no caso de problemas de
visão, para fazer o diagnóstico e prescrever o melhor tratamento.
Por isso, o CBO
destaca a importância dos cuidados regulares com a saúde dos olhos e do
acompanhamento oftalmológico, para prevenir o surgimento de problemas e tomar
as medidas necessárias para corrigir possíveis deficiências de visão. "O
condutor precisa ter o hábito de passar por consultas regulares com o médico
oftalmologista, mesmo após ter conquistado sua CNH. Distorções podem surgir ao
longo desse período e, se não forem diagnosticas e tratadas, podem inserir um
elemento de risco no trânsito", alerta José Beniz Neto, presidente do Conselho.
Segundo ele, problemas
como miopia, astigmatismo e hipermetropia estão no topo da lista de distúrbios
mais prevalentes entre os motoristas. Além disso, doenças como catarata,
glaucoma e retinopatia diabética podem acusar um déficit visual no momento do exame,
sendo posteriormente diagnosticadas nas consultas. "Apenas o médico
oftalmologista tem o preparo para fazer esse atendimento. É um conhecimento que
não existe em outra especialidade da medicina e nem entre não médicos",
assegurou.
Segurança - Para o CBO, a saúde
ocular do motorista é fundamental também para a segurança do trânsito. Dados
divulgados pela Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) indicam
que cerca de 250 mil acidentes que ocorreram entre janeiro de 2014 e junho de 2019
resultaram de problemas na saúde dos condutores. O presidente da entidade,
Antonio Meira Júnior, acredita que as dificuldades de visão estão entre essas
causas mais comuns, ao lado de sono ao volante e percepção alterada pelo
consumo de álcool.
Segundo números
oficiais da Polícia Rodoviária Federal (PRF), o comprometimento da saúde dos
olhos foi responsável por 1.659 sinistros de trânsito em rodovias federais, em
apenas três anos (2016-2019). Conforme avaliam os especialistas da área, se
levado em conta acidentes verificados em pistas, ruas e avenidas dos centros
urbanos, certamente o número seria ainda maior.
Causas - Na avaliação do
vice-presidente do CBO, Cristiano Caixeta Umbelino, o aumento dos índices de
pessoas com problemas visuais no trânsito está relacionado à conjunção de
alguns fatores, principalmente ao envelhecimento da população brasileira e a
maior facilidade de acesso ao atendimento oftalmológico. Atualmente, há
presença de médicos da especialidade em municípios que representam quase 90% da
população. Além disso, os exames oferecidos se tornaram menos invasivos e mais
eficazes em termos diagnósticos.
"É um contexto
amplo. A expectativa de vida aumentou consideravelmente nas últimas décadas.
Nesse sentido, é natural que o envelhecimento dos olhos seja acompanhado do
surgimento de problemas de vista. Há ainda outras causas externas, como a
popularização das mídias digitais. Hoje, a sociedade está imersa em novos
hábitos, que sobrecarregam a visão, como a exposição diária dos olhos e por longos
períodos a telas", pondera.
Infração - Não portar as lentes
corretivas indicadas na CNH durante a condução de veículos pode causar ainda
outros problemas. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) estabelece que, não
seguir as anotações previstas na CNH é infração gravíssima, que rende multa e
acumulo de sete pontos na carteira. Essas situações são observadas nas
fiscalizações ou na apuração de causas de acidentes, quando policiais e agentes
fazem a verificação de documentos e condições de motoristas e veículos.
"O Brasil é um
dos países com maior índice de acidentes e mortes no trânsito. Certamente,
muito disso está relacionado à imprudência ao volante e à negligência com a
própria saúde. A população deve estar ciente de sua responsabilidade e contar
com o suporte dos médicos oftalmologistas. Isso é importante para prevenir
acidentes e diminuir o número de vítimas do tráfego brasileiro, inclusive,
salvando milhares de vidas", conclui José Beniz Neto.
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