Durante muitos séculos, embrenhar-se
na direção do Oriente era, para os europeus, uma aventura cercada de tantos
temores quanto lançar-se ao Oceano Atlântico no prelúdio das Grandes
Navegações. Fantasias, lendas, superstições. Caberia a Marco Polo, no último
quarto do século XIII promover, meio a contragosto das autoridades venezianas,
a aproximação com o gigantesco país asiático.
Imensa maioria dos
leitores destas linhas ainda não era nascida quando a China, em 1949, após
longa guerra civil, mergulhou na escuridão, tomada pelas mãos tirânicas de Mao
Tsé-Tung (ou Zedong) e do Partido Comunista Chinês. A partir de 1976, com a
morte de Mao, o regime girou para uma economia capitalista, sem que o partido
abrisse mão da condução totalitária do país. Isso permite, a qualquer juízo
prudente, identificar a China como um Estado nacional perigoso. Dele não se
esperam virtudes, nem valores de nosso apreço. É bom vender para eles, é bom
comprar deles, mas evitem-se as más companhias. O comunismo chinês, embora
"podre de rico", não é menos apaixonado pelo poder, nem menos
genocida do que os demais experimentos análogos. Apenas é mais esperto e errou
menos. Hoje transmite sua experiência para o Vietnã e para Cuba: Partido
Comunista como partido único, capitalismo e ditadura.
Por isso, não é demasiado lembrar os séculos durante os quais o Oriente,
envolto em mistério, suscitava temores. Nada a ver com os muitos povos que
compõem a população chinesa, mas tudo a ver com o poder político local e o
poder financeiro internacionalmente exercido pelo regime que controla o país.
Se o
capitalismo fez bem à economia e vai tirando da pobreza centenas de milhões de
chineses, a ditadura do PCC ainda não ouviu falar em liberdade de opinião e
transparência das instituições. Ao contrário, divulgar o surgimento do
coronavírus transformou num inferno a vida do Dr. Li Wenliang.
Não têm a
menor credibilidade os números que o governo chinês divulga sobre os efeitos do
novo vírus em sua população. O que há algumas semanas era identificado como
teoria da conspiração hoje quase dá para certificar em cartório. Enquanto os
disparates estatísticos chineses berram aos nossos ouvidos e sob nossos olhos,
a imprensa brasileira não lhes dedica uma notinha de três linhas e só falam no
"grande parceiro comercial do Brasil". Ou seja, é tudo business? Mas
quando Bolsonaro expressa sua angústia com a paralisia das atividades é acusado
de estar preocupado com a economia e não com as vidas humanas. E eu devo dormir
com um barulho desses?
Ontem
(27/03), aqui em Porto Alegre, numa imensa carreata com mais de cinco
quilômetros, empresários, autônomos, comerciantes e prestadores de serviços
clamavam pela reabertura de seus negócios. Eram pessoas responsáveis, chefes de
família, com idosos de sua afeição, unidas para a defesa do direito de proverem
seu sustento. Também ontem, João Dória, "o rebelde" almofadinha, a
mais estampada antítese de Bolsonaro, novo queridinho da mídia nacional, após
armar um circo contra o presidente da República, conclamou a poderosa indústria
paulista a se manter ativa. Business!
A grande
imprensa brasileira assumiu-se com partido político de oposição. Dedica-se
exclusivamente a criticar o governo, exigindo que ele faça tudo para todos. E
que faça já. É a coisa mais parecida com o PT que já se criou no Brasil.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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