Estudos revelam
impacto psicológico negativo da quarentena
Diante do crescente número de casos do coronavírus,
as autoridades de saúde têm cada vez mais feito um apelo à população para que,
com exceção dos que trabalham em serviços essenciais, as pessoas se resguardem
em isolamento social. A recomendação, fundamental para evitar a disseminação do
vírus, pode causar, no entanto, medos e incertezas em muitas pessoas e resultar
em distúrbios emocionais e transtornos psiquiátricos.
“A maioria tem reagido com responsabilidade diante
da recomendação de quarentena, mas aí, vêm as dificuldades. Há pessoas sofrendo
com o aumento da ansiedade, medo de ficar sem atendimento, sem remédio,
sentindo-se desamparadas, ou seja, mais do que nunca precisando de apoio e
orientações”, fala o psiquiatra Dr. Luiz Alberto Hetem, um dos idealizadores do
PQU Podcast, voltado para os psiquiatras em formação.
Um artigo feito por pesquisadores do King's
College, de Londres, publicado em fevereiro na renomada revista médica
científica The Lancet, mostra revisão de 24 estudos que
investigaram o impacto psicológico da quarentena durante epidemias no passado -
incluindo SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave) e Ebola. A maioria dos
estudos revisados relatou efeitos psicológicos negativos, como sintomas de
estresse pós-traumático, confusão e raiva. Os estressores incluíram maior
duração da quarentena, medos de infecção, frustração, tédio, suprimentos inadequados,
informações inadequadas, perda financeira e estigma.
Por conta de mudanças bruscas na rotina, parte
importante do tratamento de transtornos mentais de grau grave e moderado, que
envolve justamente o desenvolvimento de uma rotina saudável, pode se perder,
explica o psiquiatra Dr. Vinícius Guapo, também idealizador do PQU Podcast. “É
importante facilitar a comunicação virtual entre familiares e amigos que possam
auxiliar no manejo do estresse; ocupar o tempo dentro de uma rotina diária, que
contém agenda de atividade que leve em conta e respeite o horário de dormir e
acordar, de reflexões e sem se esquecer de incluir nela momentos de lazer”,
lista Guapo, completando que também é importante que as autoridades de saúde
pública mantenham linhas claras de comunicação com as pessoas em quarentena
sobre o que fazer se sentirem algum sintoma.
“Assistir séries, estudar e aproveitar para fazer
cursos online também são boas alternativas para manter a cabeça ocupada de
maneira construtiva”, acrescenta Hetem.
Os especialistas destacam ainda a importância de
reforçar o senso de altruísmo e solidariedade, lembrando ao público os
benefícios da quarentena para a sociedade em geral. “O sentimento de que outros
se beneficiarão com seu sacrifício ajuda a mitigar o estresse do isolamento
social”, pontua Guapo.
Problemas na pós-quarentena
A revisão de estudos feita por pesquisadores do
King's College de Londres mostra que a perda financeira causada pela
interrupção de atividades profissionais pode ser um estressor quando o período
de resguardo chegar ao fim. Nos estudos revisados, a perda financeira
resultante da quarentena foi considerada um fator de risco para sintomas de
distúrbios psicológicos, como raiva e ansiedade, que se manifestaram vários
meses após a quarentena.
Dr. Luiz
Alberto Hetem - Paulista de Ribeirão Preto. Formou-se médico
pela Faculdade de Medicina de Botucatu, da Unesp (Universidade Estadual
Paulista), em 1985. É especialista em Psiquiatria, doutor em Saúde Mental (área
de concentração: Psicofarmacologia) pela Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto da Universidade de São Paulo (FMRPUSP) e fez pós-doutorado no Serviço de
Psiquiatria do Hospital Civil de Estrasburgo, na França. Foi professor da
Pós-graduação em Saúde Mental da FMRP-USP de 1999 a 2010 e diretor da
Associação Brasileira de Psiquiatria de 2003 a 2010. O psiquiatra tem 40
artigos publicados em periódicos especializados e mais de 300 participações em
eventos científicos de Psiquiatria. É coeditor de livros técnicos sobre Transtornos
de Ansiedade, de Educação Continuada em Psiquiatria e do livro “Entendendo os
Transtornos Mentais”. Autor dos livros “A grande obra” e “Pensamentos
críticos”.
Dr.
Vinicius Guapo - Nascido em Astorga, Paraná. Graduado médico pela Universidade Estadual
de Londrina, em 2002. Iniciou residência médica em psiquiatria em 2003, no
Hospital das Clínicas, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP e
especializou-se em Emergências Psiquiátricas no mesmo serviço. É Mestre e
Doutor em Saúde Mental pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP. É
coautor do livro “Tratado de Saúde Mental da Mulher” e de importantes artigos
científicos na área sobre as diferenças entre os sexos no processamento
emocional e saúde mental da mulher. Atualmente, é médico colaborador na equipe
de Emergências Psiquiátricas do HCFMRP – USP, onde supervisiona e treina
alunos, em entrevista psiquiátrica, além de desenvolver e orientar projetos de
pesquisa em psiquiatria e neurociências.
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