Aumento no número
de estudantes é um bom sinal após dois anos de incertezas causadas pela
pandemia
Os dados da primeira etapa do Censo Escolar da
Educação Básica 2022, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep),
no início de fevereiro, revelam um aumento no número de matrículas nas redes
pública e privada de ensino. Segundo o levantamento, em 2022 foram
contabilizadas 47,4 milhões de matrículas nas 178,3 mil escolas de educação
básica do País, cerca de 714 mil a mais em comparação a 2021, o que corresponde
a um aumento de 1,5% no número de estudantes.
Em um recorte considerando apenas o ensino médio,
os números também são positivos: foram quase 7,9 milhões de matrículas em 2022,
ou seja, um crescimento de 1,2% em relação ao ano anterior. Deste total, por
volta de 971,5 mil alunos estudam em escolas particulares, o que representa
12,3% do total; e 6,9 milhões dos estudantes estão na rede pública
(estadual e federal), totalizando 87,7% das matrículas.
De acordo com a Admª. Claudia Maria Costin,
conselheira do Conselho Regional de Administração de São Paulo - CRA-SP e
ex-diretora global de educação do Banco Mundial, no estado de São Paulo,
especificamente, tanto na rede pública quanto na particular, há um número
bastante grande de estudantes e, a cada ano, há mais alunos entrando no ensino
médio.
O crescimento de matrículas no período de 2021 e
2022 entre os estudantes de 15 a 17 anos, segundo a administradora, ocorreu por
dois motivos: um deles é porque ainda havia alunos dessa etapa educacional fora
da escola antes desse período; e o outro é que mais jovens passaram a querer
estudar.
“É importante lembrar que temos ainda cerca de um
milhão de crianças e jovens em idade de escolaridade obrigatória fora das
escolas. É preciso fazer a busca ativa desses jovens que eventualmente
abandonaram o ensino formal. Infelizmente, com a pandemia houve grandes perdas
de aprendizagem. O Brasil foi um dos casos em que as escolas ficaram fechadas
por mais tempo: foram praticamente dois anos letivos inteiros com unidades
fechadas ou parcialmente fechadas com rodízio de alunos, com os pais decidindo
se se sentiam seguros ou não para mandar seus filhos. Para recuperar essas
perdas, o tempo normal de escola, que é de quatro a cinco horas, é
insuficiente”, comenta Claudia.
Ensino médio integral
Apesar dos contratempos gerados pela pandemia, a
administradora avalia positivamente o aumento de alunos matriculados em tempo
integral no ensino médio. Em 2020, esse modelo de ensino representava 12,6%
(160.719) das matrículas e, em 2022, esse número subiu para 24,9% (337.723).
Para Claudia, o ensino médio integral conta com uma
proposta interessante, pois não trata apenas de dar mais aulas, mas sim de ter
atividades em laboratórios, clubes de ciência e de artes, por exemplo. “Se
olharmos os 30 primeiros sistemas educacionais do mundo, no ranking do PISA (Programme
for International Student Assessment - em português Programa
Internacional de Avaliação de Estudantes), que é um teste internacional
desenvolvido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) que permite comparar sistemas educacionais, nota-se que nenhum deles tem
apenas quatro ou cinco horas de aula, mas sim um turno único de sete a nove
horas. Com o avanço em direção ao ensino integral, para além de vivências
interessantes que os alunos podem ter, há a chance de reposição de aprendizagem
e, também, de melhor preparação para o mercado de trabalho, que vai demandar
competências mais sofisticadas do que aquelas que as nossas escolas costumam
oferecer”, explica a conselheira.
Formação de gestores e
docentes
Outro dado relevante trazido pelo Censo diz
respeito aos diretores e professores da educação básica no Brasil. Em 2022,
foram contabilizados 2,3 milhões de docentes e 162.847 diretores, atuando nas
178,3 mil escolas do País. Contudo, somente 19,3% dos gestores possuem curso de
formação continuada, com o mínimo de 80 horas, em gestão escolar.
Para Claudia, a gestão escolar é algo bastante
complexo e muitos diretores ainda não estão aptos para gerir essas questões,
ainda mais em uma organização multifacetada como a escola. “O diretor escolar
tem que ser um líder de aprendizagem. É importante que as secretarias estaduais
e municipais de educação e o próprio MEC se conscientizem da importância de
fomentar um aprendizado ou um desenvolvimento profissional de diretores e
coordenadores pedagógicos, que contemple esses temas de liderança, gestão da
aprendizagem, logística e relacionamento com a comunidade”, sugere Claudia.
Entre os fatores que justificam tal problema,
segundo a conselheira, está o modo como são realizadas as nomeações dos
diretores escolares. Há estados em que a nomeação é estritamente política e, em
outros, é feito um concurso público, a partir de uma prova escrita, para um
cargo que demanda liderança. “Isso tampouco funciona. É o caso, por exemplo, do
estado de São Paulo. Nós temos que mudar a forma de seleção e investir de verdade
no desenvolvimento profissional dos diretores de escola”, afirma a
conselheira.
Políticas públicas em prol da
educação
Para Cláudia, olhar para a política educacional a
partir de dados concretos é muito importante, pois a educação, assim como outras
áreas de atuação humana, não comporta o negacionismo científico, isto é,
atuações sem base em dados ou mesmo ações a partir de opiniões e estimativas
distantes da realidade. “É muito positivo que os dados do censo educacional
tenham sido divulgados logo no início do novo governo. Ainda não houve tempo de
se apropriar de tudo, mas que se mantenha a educação como política de estado,
divulgando os dados que foram encontrados e aperfeiçoando cada vez mais a forma
de coletá-los fazendo, assim, uma política educacional com base em dados
concretos”, acrescenta a administradora.
Outro ponto que considerado importante por Claudia
é olhar para além do ensino médio, afinal, nos últimos 10 anos, a atenção
esteve muito voltada à primeira infância, no ensino fundamental I, que é a
etapa de alfabetização. “Há um grande esquecimento dos anos finais do ensino
fundamental II. É importante observar, por exemplo, com base em dados, que
enquanto o 5° ano vem apresentando melhoras sistemáticas na avaliação que é
feita a cada dois anos, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
(SAEB) e os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que
mede a qualidade da educação, mostram que do 6° ano em diante parece que não
prestamos tanta atenção. Daí a importância de trabalhar os dados do censo do 6°
ao 9° ano”, alerta.
A conselheira do CRA-SP acredita que essa queda
seja resultado do fato de que, em 1971, houve o corte de um ano, que
correspondia à antiga 5ª série. Com isso, aos 11 anos, as crianças já entravam para
uma lógica com professores especialistas em cada disciplina, em uma idade em
que elas, talvez, ainda precisassem do antigo professor primário ou de um
docente polivalente, que entendesse mais sobre a forma de aprendizagem delas do
que uma área específica. “As crianças se mostram claramente despreparadas no 6°
ano para isso. Acho importante que os governos federal, estadual e municipal
prestem muita atenção no fundamental II que é a grande área esquecida na
educação brasileira”, conclui Claudia.
Conselho Regional de
Administração de São Paulo – CRA-SP