AME Mulher, na zona Leste de São Paulo, é referência no atendimento multidisciplinar e gratuito a vítimas
A violência contra a mulher permanece como um grave problema social no Brasil.
Dados do 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado neste ano,
indicam que mais de 848 mil ligações foram feitas para o 190, da Polícia
Militar, denunciando episódios de violência contra esse público em 2023 – uma
média de 2.300 chamadas diárias ou quase duas ligações por minuto.
Os
números evidenciam ainda diferentes formas de violência durante esse período.
Foram 258.941 casos confirmados de mulheres que sofreram lesão corporal dolosa,
enquanto os casos de ameaça totalizaram 778.921 vítimas. Além disso, 77.083
mulheres foram alvo de perseguição e 1.467 perderam a vida em feminicídios.
Apesar
dos índices alarmantes, os especialistas alertam que esses números podem não
refletir toda a dimensão do problema, já que muitas mulheres hesitam em
denunciar as agressões por medo ou vergonha, o que dificulta a identificação de
novos casos. Nesse contexto, o Sistema Único de Saúde (SUS) se torna uma porta
de entrada essencial para atendimento às vítimas, oferecendo acolhimento e
suporte de maneira acessível.
“Por
meio do nosso Núcleo de Prevenção à Violência, ofertamos cuidados específicos
de acolhimento humanizado, escuta ativa, suporte psicológico e social, além de
procedimentos reparadores, quando necessário”, afirma Tamiris Machado,
assistente social do AME Mulher, gerenciado pelo CEJAM – Centro de Estudos e
Pesquisas "Dr. João Amorim", em parceria com a Secretaria da Saúde do
Estado de São Paulo.
O
núcleo especializado, que está localizado na zona Leste de São Paulo, é
constituído apenas por colaboradoras mulheres, em suas mais plurais
diversidades. São desde auxiliar administrativa até médicas especialistas,
nutricionista, psicóloga, assistente social, fisioterapeuta, técnica de
enfermagem e enfermeiras trabalhando para promover um acolhimento próximo e
empático, desde o primeiro contato até a conclusão do atendimento da vítima.
Para receber atendimento, não é necessário agendamento.
Em
modo geral, após acolhimento inicial, identifica-se o tipo de violência sofrida
pela mulher por meio de uma escuta qualificada e humanizada. É com base nessas
informações que o restante do atendimento acontece de forma individualizada.
A partir desse ponto, são realizados os encaminhamentos aos órgãos
adequados em conformidade com a classificação de risco, além dos específicos de
saúde e pedidos de exames, podendo ser de imagem, diagnósticos, laboratoriais e
de infecções sexualmente transmissíveis e possíveis tratamentos.
“Por
aqui, desenvolvemos ferramentas e protocolos que garantam o suporte necessário
para essas mulheres. Uma dessas iniciativas é a Sala Lilás, projetada para
oferecer um espaço seguro, sigiloso e acolhedor, evitando que a paciente se
sinta exposta ou revitimizada durante o atendimento”, explica Tamiris.
As
Salas Lilás, exclusivas para atendimento às vítimas de violência, estão
localizadas em áreas discretas dentro das unidades de saúde, longe dos fluxos
mais movimentados. A partir desse ano, sua presença tornou-se obrigatória em
todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS). No entanto, o AME Mulher já conta com
essa estrutura desde sua inauguração em 2023, consolidando-se como uma
referência no cuidado às vítimas de violência.
Identificando a violência
É
importante destacar que a violência não se limita apenas às formas físicas e
sexuais. Ela também se manifesta em diversos outros contextos, incluindo
violência psicológica, verbal, patrimonial, social e doméstica.
"Não
é fácil reconhecer uma violência e é um desafio ainda maior denunciá-la,
principalmente por medo de julgamentos, exposição e até mesmo a incerteza de
que haja alguma resolução efetiva. No entanto, é crucial estar atenta aos
sinais", afirma Ana Clara Lucas Coura, psicóloga do AME Mulher.
O
processo de reconhecimento, segundo a profissional, começa com uma
autoavaliação. "O primeiro passo é a mulher se questionar se foi exposta,
desrespeitada ou violentada de alguma forma, em algum aspecto de sua vida. Isso
inclui situações que não parecem normais, justas ou saudáveis em suas relações amorosas, familiares, profissionais ou sociais.”
Após
essa reflexão, a psicóloga sugere aproveitar a internet como ferramenta de
apoio, buscando pesquisar sobre violência contra a mulher em sites confiáveis,
como a Plataforma Mulher Segura e Instituto Maria da Penha para confirmar
suspeitas, caso ainda haja dúvidas.
Já o terceiro passo envolve buscar apoio em serviços de saúde e profissionais capacitados para oferecer escuta e acolhimento nesse momento tão difícil. “É importante que a mulher se sinta segura para tirar dúvidas, expor sentimentos e vivências e encontre um espaço em que se sinta aberta para receber orientação e amparo”, ressalta Ana Clara.
Além do acesso aos serviços oferecidos pelo SUS, a construção de uma rede de apoio confiável também é essencial em todo o processo. “Essa rede pode incluir familiares ou amigos em quem a mulher confia plenamente. No entanto, é fundamental escolher pessoas que tenham conhecimento e sensibilidade sobre o tema, para evitar revitimizações ou o agravamento de traumas”, finaliza.
CEJAM - Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”
@cejamoficial
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