Método mais usado de controle do coral-sol (Tubastraea spp.) consiste na remoção mecânica, usando marreta e talhadeira (foto: Damián Mizrahi) |
Pesquisadores da USP mostram que o método mais utilizado no Brasil para controlar o coral-sol pode provocar impactos negativos se não for feito no momento certo e se a colônia não for isolada logo após ser removida
Estudo assinado por
pesquisadores do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO-USP)
mostra que o método mais usado para controle do coral-sol (Tubastraea spp.)
pode até mesmo ajudar o animal a se propagar se não for feito nos períodos corretos.
O coral-sol é originário do oceano Pacífico, foi introduzido acidentalmente na
região do Caribe no início dos anos 1940 e, no Brasil, é considerado uma
espécie exótica invasora, sendo registrado no país desde o fim dos anos 1980.
Publicado na revista Marine Biology, o trabalho apoiado pela
Petrobras, pela Agência Nacional de Petróleo (ANP) e pela FAPESP aponta que,
apesar de emitir larvas tipo plânula durante o ano todo, o coral invasor tem
picos de liberação relacionados principalmente com o aumento da temperatura e
da turbidez da água do mar. A emissão larval pode ocorrer em pouco tempo, como
resposta ao estresse da remoção mecânica.
Os pesquisadores apontam que,
nesses períodos, não deve ser feito o procedimento, pois as larvas liberadas em
grande número podem se dispersar pelo ambiente. O método de remoção manual, que
retira as colônias com marreta e talhadeira durante mergulho autônomo, é
adotado em algumas unidades de conservação, como consta no Plano Nacional de Prevenção,
Controle e Monitoramento do Coral-Sol (Tubastraea spp.)
no Brasil.
“É a estratégia escolhida por
algumas instituições brasileiras porque não utiliza produtos químicos e é
direcionada exclusivamente ao coral-sol. A recomendação é tentar retirar as
colônias íntegras, porque qualquer tecido remanescente tem a capacidade de
regeneração”, explica Damián Mizrahi, que realizou a maior parte
do trabalho durante pós-doutorado no IO-USP e foi bolsista da
FAPESP no Centro de Biologia Marinha (CEBIMar) da USP durante a fase final de redação
do artigo.
Segundo os pesquisadores, as
colônias podem liberar larvas como resposta ao estresse da remoção, o que foi
observado durante o estudo. Por isso, recomendam isolar os corais retirados do
substrato natural em recipientes lacrados imediatamente após a remoção
mecânica.
Uma única colônia pode liberar mais de 90 larvas como essa, aumentando as chances de colonização de substratos como rochas e mesmo píeres, navios e plataformas de petróleo (foto: Damián Mizrahi) |
Remover e
isolar
Antes de realizar medições
depois da remoção dos corais-sol, os pesquisadores coletaram 200 colônias e as
transferiram para dois tanques de 500 litros na base do Instituto Oceanográfico
em Ubatuba, cerca de 25 quilômetros distante da área de coleta, na Ilha dos
Búzios, em Ilhabela. Os tanques possuíam duas redes de segurança, com malha de
200 micrômetros, o que impede a saída das larvas emitidas pelas colônias do
sistema de cultivo.
Mantidos em condições de temperatura e exposição ao sol similares às colônias presentes na natureza, os corais puderam ser usados para monitorar a atividade reprodutiva da espécie. Os dados obtidos mostram que a dinâmica de emissão larval dos cultivos de coral-sol em laboratório se assemelha aos registros na natureza, indicando que o cultivo pode ajudar no monitoramento da atividade reprodutiva.
Colônias mantidas em tanques foram usadas para monitorar
atividade reprodutiva do coral-sol no campo. Na imagem, larvas boiam na superfície da água
(foto: Damián Mizrahi)
Entre dezembro de 2017 e fevereiro de 2020, os pesquisadores realizaram dez campanhas para a remoção mecânica e coleta dos corais, com cerca de três meses de intervalo entre elas. Dados ambientais foram utilizados para avaliar as influências oceanográficas sobre a liberação larval dos corais.
Durante os mergulhos, cada
colônia retirada do substrato era acondicionada individualmente com água do mar
em um saco plástico lacrado, segundos após sua remoção. Já na embarcação, elas
eram depositadas em recipientes individuais imersos na água do mar do local.
Uma vez em laboratório, foram
contabilizadas as larvas emitidas por cada colônia em até duas horas após as
amostragens. Nos dois dias seguintes, os recipientes continuavam a ser
inspecionados, mas não continham mais larvas, o que sugere que a liberação
larval ocorreu devido ao estresse provocado pela remoção mecânica dos corais.
Durante os dois anos dessa fase
do estudo, 977 colônias foram coletadas. Durante a maior parte do tempo em que
foi desenvolvido o trabalho, o número de larvas liberadas se manteve baixo,
confirmando estudos em outras regiões do litoral brasileiro – no país, o
coral-sol se distribui do Ceará a Santa Catarina, se concentrando no litoral
sudeste.
As exceções foram duas
campanhas, em dezembro de 2017 e outubro de 2019, quando a liberação foi mais
alta do que o normal. “Durante esses períodos específicos também foram
detectados máximos de emissão larval nos tanques onde se desenvolveram os
cultivos de laboratório com colônias reprodutoras de coral-sol”, esclarece
Lopes.
Os pesquisadores observaram
ainda que temperaturas da água do mar entre 24,5° C e 27° C favorecem a
liberação de larvas, enquanto a água mais fria limita a fecundidade. Os ciclos
da lua e o tamanho das colônias não se mostraram estatisticamente
significativos para serem utilizados como parâmetros para maior ou menor liberação
de larvas.
“A turbidez é um indicativo de
presença de matéria orgânica na água, ou seja, de alimento. Nesses momentos, o
coral-sol abre os pólipos para comer e acaba liberando as larvas que estavam
dentro deles”, sublinha Mizrahi.
Monitoramento
Os pesquisadores observam, a
partir dos resultados deste estudo, que manter culturas do coral-sol nas
proximidades das áreas invadidas pode subsidiar protocolos de controle e
monitoramento, que devem ser implementados somente em períodos de menor liberação
de larvas.
Em apenas algumas campanhas houve liberação de muitas larvas na natureza não acompanhada por uma atividade similar nos tanques, na base em Ubatuba. Segundo os pesquisadores, essa pode ser mais uma evidência de que o estresse causado pela remoção estimulou a liberação, reforçando a necessidade de seguir o protocolo de isolamento do ambiente após a remoção.
“O método vem sendo utilizado em algumas unidades de conservação no Brasil, mas ainda não se havia olhado com atenção para a dinâmica da atividade reprodutiva do coral-sol para programar essas remoções. Esperamos poder realizar novos estudos para entender melhor os processos de liberação de larvas do coral-sol e os impactos em sua dispersão no ambiente marinho”, aponta Lopes.
Recentemente, a remoção
mecânica foi abandonada por um santuário marinho no Golfo do México. Os
gestores da unidade de conservação nos Estados Unidos argumentam não
ter observado efetividade no método, uma vez que o menor fragmento que
permanece no substrato depois da remoção dá origem a uma nova colônia.
O artigo Sun coral
larval release following mechanical removal: a 2‑year study on the southeast
Brazilian coast pode ser lido por assinantes em: https://link.springer.com/article/10.1007/s00227-023-04296-z.
André Julião
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/remocao-de-coral-invasor-deve-ser-evitada-em-periodos-de-alta-liberacao-de-larvas-alerta-estudo/50748
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