Estudo colaborativo do Juventudes Potentes e da Rede Conhecimento Social expõe cenário de exclusão e sugere caminhos para ampliar acesso à educação e ao mundo do trabalho
Para mostrar os fatores que distanciam jovens talentos do mercado formal de trabalho e sugerir novos caminhos, o Juventudes Potentes, aliança que promove a inclusão produtiva de jovens-potência da periferia da cidade de São Paulo, e integra o movimento internacional Global Opportunity Youth Network (GOYN), lança o estudo “Injustiças estruturais entre jovens na cidade de São Paulo”, feito em parceria com a Rede Conhecimento Social.
A pesquisa, que escutou 600 jovens
das zonas Sul e Leste da cidade, com 15 a 29 anos, contou com a participação
das juventudes não apenas como respondentes, mas também como pesquisadores. O
estudo traduz em dados a realidade vivenciada e sentida nesses territórios:
nove em cada 10 entrevistados acreditam que “existe um processo de
desigualdades sociais históricas que atinge algumas pessoas e grupos e as
mantém em condições menos favoráveis que outras”.
Acesso ao
mundo do trabalho
Os desafios de acesso ao mundo do trabalho e à boas oportunidades de emprego são inúmeros para as juventudes que vivem nas zonas Sul e Leste de São Paulo: 42% deles começaram a trabalhar antes dos 16 anos, ou seja, ainda em idade escolar. Apesar de 64% desses jovens serem economicamente ativos, mais da metade (54%) acredita que existem poucas vagas perto de onde moram. Para concorrer a oportunidades mais distantes, 26% afirmaram que já tiveram que mentir sobre o bairro em que moram para conseguir emprego.
Outro ponto de atenção é o processo seletivo. Segundo os jovens, as empresas deveriam promover processos mais transparentes, inclusivos e com retorno sobre seu desempenho ou inadequação à vaga.
O preconceito e a discriminação das empresas são citados por 45% dos jovens como um dos empecilhos para acessar vagas de emprego. Respondentes afirmam que já se sentiram desrespeitados em algum processo seletivo e acreditam que não são avaliados pelas capacidades e potencial, mas, principalmente, com base em suas características pessoais e sociais estigmatizadas.
Para esses jovens, os recrutadores
também avaliam aparência, maneira de se vestir, de se expressar e o bairro onde
vivem. Para 50% dos participantes da pesquisa, a baixa qualificação
profissional ou concorrência injusta em comparação aos demais jovens é o
principal impeditivo para acesso a melhores vagas de trabalho. Além disso, 39%
já se sentiram subestimados por conta do lugar onde estudaram.
Desafios de
estrutura e de qualidade de vida
Apesar de 84% viverem em regiões com infraestrutura urbana, ainda é comum a falta de água, luz e alagamento, situação apontada especialmente por juventudes negras. Além disso, 42% levam mais de uma hora para chegar ao centro e 60% já se sentiram prejudicados por passar muito tempo no transporte.
Sendo que 68% relatam já ter ficado sem dinheiro para pegar transporte. Ainda que sete em cada 10 jovens se sentam seguros no bairro que moram, a sensação de insegurança afeta sobretudo mulheres e pessoas LGBTQIAPN+: 5 a cada 10 mulheres não se sentem seguras em chegar tarde em casa e 3 a cada 10 jovens LGBTQIAPN+ não se sentem seguros no bairro que moram.
O atendimento à saúde também é um
ponto de atenção. O atendimento em saúde mental é uma das grandes demandas das
juventudes: 6 a cada 10 jovens LGBTQIAPN+ avaliam como “ruim” ou “mais ou
menos” sua saúde mental e 33% dizem que sua condição de saúde física e mental
atrapalha na busca por um trabalho.
Educação
O levantamento também aponta um grande desafio em relação à interrupção dos estudos: 21% já abandonaram as salas de aula por dificuldades de conciliar estudo, trabalho e demais responsabilidades do lar. Dos que já pensaram em largar os estudos (44%), o motivo mais predominante é a maternidade e paternidade: 38% dos jovens são mães ou pais (sendo 37% deles antes dos 17 anos) e 39% disseram assumir sozinhos a responsabilidade pelo cuidado do(s) filho(s).
Apesar dos desafios, 78% pretendem
continuar ou retomar os estudos. Isso porque visualizam na educação uma
oportunidade de crescimento e qualificação profissional. Hoje, em seus
territórios, a realidade mais próxima que veem de continuidade dos estudos são
cursos livres na área em que trabalham.
Análise e
caminhos
Para Harika Maia, Diretora de Projetos da Rede Conhecimento Social, a construção coletiva da pesquisa é um diferencial do estudo. Jovens e profissionais da área de juventudes colaboram com a concepção da pesquisa, a análise de dados e evidências encontradas. "Realizar pesquisas com criação coletiva é uma experiência rica. O resultado é uma pesquisa que traz a percepção de jovens sobre sua realidade e gera sensibilização e engajamento de todos os atores participantes do ecossistema da inclusão produtiva. Garantimos, assim, maior chance de uso dos dados para incidência política e melhora na qualidade de vida de jovens na cidade.”, pontua.
Nayara Bazzoli, Gerente do Juventudes Potentes, que atua em rede com empresas, governos e organizações da sociedade civil, aponta que esse levantamento mostra que a falta de acesso das juventudes é interseccional, o que significa que há sobreposição de variáveis que influenciam na reprodução das injustiças estruturais. Essas variáveis são: Raça/cor, Sexualidade e identidade de gênero, Idade, Renda domiciliar, Local de moradia e Maternidade.
“A pesquisa mostra que as principais injustiças são vivenciadas por jovens com baixa renda domiciliar, mulheres, negros, LGBTQIAPN+ e com filhos. Com isso, é importante que a sociedade se conscientize dessa realidade e proponha planos de ação articulados. É imprescindível criar políticas intersetoriais e entre diferentes atores do ecossistema do mundo do trabalho para construir, de forma conjunta, mecanismos de superação das desigualdades sociais e promoção de qualidade de vida a esses jovens, com direito à projeção de futuro, escolhas e dignidade”, ressalta Nayara Bazzoli.
Nayara acrescenta que, para além de promover melhores condições e mitigar as desigualdades sociais, investir nas juventudes das periferias também é imprescindível para o desenvolvimento econômico do país. Portanto, os setores público e privado deveriam agir juntos no desenho de estratégias sólidas que passam principalmente pela educação e pela inclusão produtiva dos jovens no mercado. A pesquisa recomenda 10 principais iniciativas de enfrentamento:
1. Ofertar reforço
escolar para diminuir desigualdades educacionais;
2. Promover maior
aproximação da escola às suas demandas de jovens periféricos: trabalho,
condições de vida, habilidades existentes e a serem desenvolvidas, projetos de
vida, saúde mental, etc.;
3. Promover inserção
mais qualificada ao mundo do trabalho;
4. Promover o uso
qualificado da Internet.
5. Criar meios de
garantir inclusão e permanência do jovem no trabalho, com olhar também para o
estudante trabalhador e/ou mãe;
6. Desenvolver
políticas públicas de incentivo e fiscalização de direitos trabalhistas e de
inclusão produtiva;
7. Incentivar as
empresas a se instalarem nas periferias;
8. Construir
capacitação dialogada entre Governo, OSCs e Empresas, visando os desejos dos
jovens, tendências, profissões de futuro e oportunidades de desenvolvimento do
próprio território;
9. Mudar a cultura
internadas empresas para que acolham o jovem trabalhador desde o processo
seletivo e garanta condições favoráveis ao seu desenvolvimento;
10.
Incentivar novas dinâmicas de trabalho pensadas em jovens
periféricos.
Pesquisa Injustiças estruturais entre jovens na cidade de São Paulo
Metodologia -
O diferencial da iniciativa já começa na metodologia, que promove a
participação social por meio da construção coletiva em que jovens e
profissionais da área de juventudes colaboram com a concepção da pesquisa, a
análise de dados e evidências encontradas, aspecto que se relaciona diretamente
com a dinâmica da atuação do Juventudes Potentes, pautada na metodologia
Impacto Coletivo, que prevê uma ampla articulação de diferentes instituições
capazes de fazer a diferença na promoção da inclusão produtiva de
jovens-potência.
A pesquisa quantitativa foi realizada pela organização
Juventudes Potentes com 600 jovens da Zona Sul e Leste de São Paulo. O público
que respondeu é 50% feminino e 50% masculino.
Faixa etária -
a maioria dos jovens tem entre 20 e 24 anos (36%). Em seguida, 35% têm entre 25
e 29 anos; 17% possuem entre 15 e 17 anos e 12% têm de 18 a 19 anos.
Principais dados - cerca de 71% se autodeclararam pretos e pardos; 28% brancos e
1% respondeu a opção ‘outras’. Deste total, 38% dos respondentes têm filhos e
se tornaram mães e pais na na faixa de 18 a 24 anos (49%); 16 ou 17
anos (26%); 25 a 29 anos (14%) e antes dos 15 anos (11%). Cerca de 39% são a
única pessoa responsável pelo cuidado das crianças. Dos entrevistados, 12% se
autodeclararam do grupo LBGQIAPN+.
Juventudes Potentes
https://goynsp.org
Rede Conhecimento Social
http://conhecimentosocial.org/
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