Essa não é uma questão nova, porém ganhou destaque na imprensa de todo mundo graças ao projeto de lei HB 733 da Flórida, nos EUA, ele estabelece que por lá as aulas escolares não devem começar antes das 8h da manhã, no ensino fundamental, e antes das 8h30, no ensino médio. A ideia é combater os efeitos da privação do sono que, de acordo com levantamento da Academia Americana de Pediatria, pode afetar o desempenho acadêmico dos alunos. Na Califórnia, também nos EUA, desde o ano passado, e pela mesma razão, as escolas públicas não podem começar as aulas antes das 8h30.
Aliás, os impactos que a privação do sono causam no
campo cognitivo têm sido uma das vertentes mais investigadas por pesquisadores
nos últimos tempos. O ciclo circadiano (ritmo que o organismo realiza as
funções diárias) de crianças e jovens precisa de mais horas de sono e tem
padrões diferentes dos de adultos, tendo como tendência natural dormir e
acordar mais tarde.
Durante o ciclo circadiano, há um pico de cortisol
pela manhã, tendo o período de maior grau de alerta por volta das 8h30 às 9h.
Dessa forma, o aluno que acorda às 6 horas ou antes, para ter aulas às 7 horas,
está realizando um movimento antinatural e que, ironicamente, não favorece a
aprendizagem.
Dormir mal gera atrofia no hipocampo, área
neurológica importante para a formação de memórias. É durante o sono, que o
fluxo de LCR (Líquido Cefalo-Raquidiano) se intensifica e “lava” o sistema
nervoso, a fim de limpar as toxinas e substâncias acumuladas diariamente.
O foco atencional é um elemento crucial na formação
de memórias, pois permite que o cérebro se concentre em informações específicas
e relevantes enquanto ignora outras distrações. Ao direcionar a atenção para um
estímulo específico, o cérebro é capaz de processar e armazenar essa informação
de maneira mais eficiente. Sem foco, a quantidade de informações que podem ser
retidas e posteriormente recuperadas é significativamente reduzida. O foco é o
principal indutor de neuroplasticidade e, portanto, é essencial para a formação
de memórias de longo prazo.
Além disso, o grau de alerta influencia a
capacidade de um indivíduo de absorver e reter informações. Quando alguém está
alerta, sua capacidade de processar informações e formar memórias é maximizada.
Por outro lado, um estado de fadiga ou sonolência pode prejudicar a capacidade
do cérebro de focar e processar informações, dificultando a formação de
memórias. Manter um grau de alerta adequado é crucial para garantir que o
cérebro esteja funcionando de maneira ideal durante a aprendizagem, e por isso,
situações que não são favoráveis a esses dois fatores, prejudicam o
aprendizado.
Assim, impor algo que não é “natural” da fisiologia
desses jovens, realmente afeta diretamente o seu desenvolvimento
neuro-cognitivo, e por isso, vejo essa medida em específico, com bons olhos.
Entretanto, temos que separar aquilo que percebemos
como melhor, daquilo que é possível ser feito. Precisamos ver a realidade de
cada país e entender os outros fatores que circundam esse tema. É comum nos
Estados Unidos que as escolas sejam integrais, com isso, há mais tempo hábil
para essa implementação, o que é diferente do modelo padrão de ensino
brasileiro. Se as aulas começassem mais tarde por aqui, seria complicado manter
o mesmo volume de matérias ministradas num menor tempo, o que implicaria numa
reformulação do conteúdo programático.
Outro ponto importante a ser levado em consideração
no Brasil é a incompatibilidade do horário de trabalho dos pais que iniciam a
jornada de trabalho cedo. Deixar o jovem em casa sozinho, não é uma hipótese,
então seria necessária uma alteração na jornada de trabalho dos responsáveis.
Nos Estados Unidos é mais comum uma estrutura de transporte escolar
sistematizada, que favorece essa logística.
Dessa forma, acredito que para haver esse tipo de
mudança, todo o ecossistema escolar tem que ser repensado, e para o Brasil,
isso impõe grandes mudanças. Como paliativo, os estudantes podem se atentar ao
horário de ir dormir, buscando se deitar mais cedo já que essa mudança não é
prevista, e assim, respeitar o mínimo de 7h30 de sono. Além disso, para
melhorar a qualidade do sono, recomenda-se diminuir a exposição ao celular
horas antes de dormir, evitar comidas muito pesadas e gordurosas no período da
noite e praticar alguma atividade física.
Lorenzo Tessari - Chief
Operating Officer (COO) da Gama
Ensino, startup de tecnologia desenvolvedora de um
algoritmo proprietário que identifica os gaps de aprendizado dos alunos para o
direcionamento dos seus estudos.
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