Problemas auditivos
podem acontecer em todas as fases da vida, desde o ventre materno, neonatal,
infância até a idade adulta
De acordo com a
Organização Mundial de Saúde (OMS), 15 milhões de brasileiros sofrem com
problemas auditivos. Apenas 40% reconhecem o problema. A metade dos casos
poderia ser prevenida e os efeitos minimizados se a intervenção fosse feita
precocemente.
Para a fonoaudióloga
Mariana Guedes é possível identificar fatores de risco ainda na fase de
gestação, por meio de exames no pré-natal. "Alguns tipos de doenças ou
infecções adquiridas na gestação, síndromes e genética familiar estão listados
como fatores que podem estar ligado à perda auditiva.", explica a especialista.
O Teste da
Orelhinha, oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), deve ser
feito no bebê ao nascimento e é obrigatório por lei. É realizado durante o
sono, de forma não invasiva, indolor e avalia as respostas do ouvido a alguns
sons, permitindo detectar precocemente algum grau de surdez.
Caso o recém-nascido
apresente alguma alteração nesse teste, deve-se então complementar a triagem
realizando novamente as Emissões Otoacústicas e proceder com o diagnóstico
completo a fim de confirmar a suspeita e determinar, o quanto antes, o tipo e o
grau da perda auditiva. Fazem parte dessa bateria, após a inspeção do ouvido
por um médico especialista, os exames de Imitanciometria e o PEATE (Potencial
Evocado Auditivo do Tronco Encefálico) também conhecido como "BERA",
que avalia outras partes do sistema auditivo. A presença de perda auditiva, que
pode acontecer devido à lesão na cóclea, no sistema de condução do som ou no
tronco encefálico é determinada pela análise conjunta destes exames, que os
profissionais chamam de cross-check .
Em muitos casos,
pode ser recomendado o uso do aparelho auditivo ou do implante coclear
(dispositivo implantável de alta complexidade tecnológica, que é utilizado para
restaurar a função da audição). E mesmo depois das adaptações destes
equipamentos, será necessário o acompanhamento de um fonoaudiólogo para que a
criança adquira a linguagem e desenvolva suas competências linguísticas de modo
semelhante aos seus pares ouvintes.
"Em primeiro
lugar, sempre orientamos que as crianças que apresentaram algum tipo de falha
no teste da orelhinha não faltem aos retornos e que os pais procedam com o
diagnóstico completo e correto o quanto antes. Alguns sinais também podem soar
como alerta para os pais durante o desenvolvimento do bebê. Dentre eles,
destaco bebês que não vocalizam ou balbuciam, não se acalmam ao
escutar a voz da mãe
ou do cuidador, não procuram o som quando chamados pelo nome ou não demonstram
estranhamento ou susto ao ouvir alguém bater palmas alto ou bater uma porta de casa,
por exemplo. Com um ano de idade espera-se que o bebê já seja capaz de imitar
alguns sons, reduplicar sílabas e iniciar uma tentativa de fala mais aproximada
das palavras reais. Aos dois anos, esperamos que a criança já use frases com 2
a 3 palavrinhas, compreenda ordens e reconheça canções. Para aqueles em idade
mais avançada, por volta dos 5 anos, precisamos ficar atentos e observar se a
criança fala alto, vê televisão com volume elevado, apresenta dificuldade de
concentração, pergunta muitas vezes "o quê?" ou apresenta
trocas de letras na fala. Tudo isso pode ser sinal de alguma dificuldade na
audição", explica Mariana.
Otites frequentes
também precisam ser investigadas e avaliadas com especialistas. Por isso,
consideramos necessárias as consultas de rotina com pediatras e otorrinos.
"É importante que o profissional oriente a família e encaminhe para um
especialista a qualquer suspeita de problemas dessa natureza. Somente assim, é
possível diagnosticar e tratar a tempo.", finaliza Mariana.
Tratamentos: O
aparelho auditivo mais caro é sempre o melhor?
Não
necessariamente... O melhor aparelho auditivo é aquele corretamente selecionado
e adaptado ao seu tipo, grau e configuração de perda auditiva e ao seu estilo
de vida e necessidades auditivas. Obviamente a tecnologia evoluiu muito ao
longo dos anos e os dispositivos de tecnologia auditiva também. Hoje temos
excelente modelos disponíveis no mercado, de diversas marcas e distribuidores
no setor privado e no SUS.
Sabe aquela história
de ganhar uma Ferrari, mas não saber dirigir? Podemos usar este exemplo aqui
também. Tudo no aparelho auditivo precisa estar personalizado e bem indicado,
desde o molde que segura o aparelho na orelha até a potência escolhida e os
algoritmos programados. Para isso é fundamental que a população saiba que
existem protocolos internacionais sugeridos e que devem ser cumpridos pelo
profissional para garantir a boa adaptação. Hoje em dia não se testa mais
aparelho perguntando ao indivíduo: "O som está bom? Minha voz está alta?
Quer que eu abaixe um pouco?".
Existem medidas
objetivas para verificar todo o funcionamento do sistema e checar se a saída do
aparelho dentro do ouvido está realmente de acordo com a prescrição
estabelecida. São os testes chamados de medidas com microfone sonda, também
conhecidos como mapeamento de fala. Além disso, o profissional deve ter a
obrigação ética de realizar também os testes de percepção de fala para validar
a sua seleção e indicação. O processo de adaptação de um aparelho auditivo é
bastante complexo e exige conhecimento do fonoaudiólogo que o realiza. Existem
inúmeras pesquisas e artigos publicados mostrando que até dispositivos mais
simples podem ficar muito bons e cumprir as expectativas quando corretamente
adaptados e verificados.
No caso dos bebês e
crianças pequenas existem produtos pediátricos no mercado e que também estão
disponíveis tanto na rede privada quanto no SUS. Para atender esta população é
necessária ainda mais a expertise e experiência do profissional e o uso das
medidas objetivas de verificação se faz obrigatória. Não podemos errar na
seleção e adaptação dos dispositivos de tecnologia auditiva infantil, pois o
desenvolvimento de fala e linguagem oral dependem totalmente da quantidade e da
qualidade do acesso que eles irão fornecer à criança.
Mariana Guedes - Graduação em fonoaudiologia e Mestrado em Ciências pela
Faculdade de Medicina da USP. Especialização em Audiologia pela Santa Casa de
SP, idealizadora da empresa e clínica Audição na Criança com foco na
reabilitação auditiva precoce. Consultora da Cochlear para o board de
Reabilitação Auditiva Latino-América e mentoranda no programa LSLS AVT ® da AG
Bell Association (Listening and Spoken Language Specialist on Auditory Verbal
Therapy). Consultora em audiologia para o projeto #surdosqueouvem, vencedor do
prêmio Community Leadership do Facebook e vice coordenadora do Comitê de
Reabilitação Auditiva do Depto de Audição e Equilíbrio da Sociedade Brasileira
de Fonoaudiologia (SBFa)
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