John Rawls, um grande
jurisfilósofo americano, conquistou reconhecimento internacional com sua tese
de justiça como equidade. Adentrar a seus meandros é tarefa de dedicados
especialistas, mas, no fundo, é possível cada um compreender a ideia
fundamental.
Desde Aristóteles e Cícero o
mundo dos pensadores jurídicos procura definir um conceito de justiça aplicável
à sociedade como um todo. No plano individual, é quase intuitivo compreender o
que seja justiça, sobretudo quando somos vítimas de manifesta injustiça.
No campo político, o tema
resvala para ideologias, estruturas filosóficas de pensamento e cogitações que
não se combinam. O tema é importante para o Brasil de hoje, em que vivemos uma
profunda crise de moral e de justiça, estimulada pela intolerância e pelo
radicalismo.
São exatamente esses
extremos que Rawls procura obliterar. A essência, o núcleo duro de seu
pensamento é bem perceptível. Não há como viver senão numa sociedade de livre
iniciativa econômica, porém sob um ordenamento jurídico que dê oportunidades a
todos. As diferenças entre os diversos atores sociais são naturais e
inevitáveis, mas é preciso construir um patamar mínimo de bem estar sobre o
qual a viabilizará a vida coletiva razoável, sem excessos de riqueza e sem
pobreza.
É preciso que nos
conscientizemos de uma sociedade cooperativa. Todos cooperam para que possa
existir democracia. É preciso consciência de que não há direitos absolutos e,
mais ainda, de que nossos direitos não são exclusivos de cada um, mas sofrem
legítimas restrições que devemos compreender e tolerar. Um exemplo simples:
alguém conquista uma elevada soma de dinheiro num processo judicial, porém,
depois do recebimento, nega-se ao pagamento dos trabalhadores (advogados) por
seus justos honorários. Pretende, em acendrado egoísmo, o valor bruto, sem
nenhum desconto. Pode-se dizer o mesmo do desconto do imposto de renda, quando
alguém recebe importância tributável. O desconto é legítimo numa sociedade
cooperativa. Se a aplicação dos impostos é deturpada, é caso de remover um
governo que também não se conscientizou do imperativo de cooperação. A
corrupção, obviamente, também arranha uma sociedade fundada na justiça enquanto
equidade.
O grande problema, que
desafia a humanidade atual, e certamente o fará ao longo de muitos anos
futuros, é a definição desses valores, pelos quais não abdicamos de nossos
direitos individuais, mas concordamos sem ressalvas com suas restrições
legítimas. Somente assim será possível conviver numa sociedade plural e
diversa, em que cada um, em sua função específica, contribui para o bem de
todos. Não é preciso gritar por justiça social. A justiça já é social.
Evidentemente, o tirocínio de Rawls no campo da filosofia do direito não
compartilha da realidade de nossos dias, em que, segundo Domênico Di Masi,
pensador italiano, apenas oito famílias, fortemente articuladas entre si,
abocanham quase que a inteireza da riqueza do planeta.
Amadeu
Garrido de Paula - Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula
Advogados.
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