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sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Eleição presidencial nos EUA: Trump larga com vantagem contra rival do Partido Republicano

Especialista em Relações Internacionais do CEUB analisa o momento político e estratégias dos candidatos à presidência dos Estados Unidos 

 

A fase inicial das eleições nos Estados Unidos aponta para um novo embate entre Donald Trump e Joe Biden na corrida presidencial. Com apenas dois estados, Iowa e New Hampshire, realizando suas primárias nesta semana, o ex-presidente dos EUA demonstra uma vantagem significativa sobre sua única concorrente para disputar as eleições dentro do Partido Republicano, a ex-embaixadora americana nas Nações Unidas, Nikki Haley. Danilo Porfírio, professor de Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília (CEUB), analisa o cenário político, destacando as questões pendentes que podem definir o curso deste potencial duelo.

 

Confira entrevista: 

 

Como a vitória de Donald Trump nas primárias do Partido Republicano em New Hampshire impacta a dinâmica das eleições presidenciais nos Estados Unidos?

DP: Essa vitória consolida sua posição como o principal candidato do Partido Republicano à presidência dos Estados Unidos. Este triunfo fortalece seu apoio dentro do partido, aumenta sua visibilidade nacional e sugere uma aceitação significativa entre os eleitores republicanos. No entanto, é importante lembrar que as primárias são apenas o início do processo eleitoral e a dinâmica das eleições presidenciais ainda pode evoluir à medida que outros estados realizam suas próprias primárias.

 

O fato de Nikki Haley continuar na corrida após sua derrota surpreende, considerando a pressão de aliados de Trump para que ela desista. Qual a sua análise sobre essa decisão?

DP: A decisão de Nikki Haley surpreende, especialmente diante da pressão de aliados de Trump para que ela desista. Inicialmente, é perceptível um declínio, ainda que minoritário, dentro do Partido Republicano em relação à candidatura de Donald Trump. Isso se evidencia em questões como os impasses judiciais, como a suspensão da candidatura no Colorado e a posterior reversão da viabilização em Michigan. Além disso, Trump é associado à tentativa de insurreição em janeiro de 2021, quando apoiadores radicais invadiram o Capitólio, o que levanta preocupações sobre sua viabilidade jurídica e seu perfil em relação ao opositor democrata, Joe Biden. 

Nesse cenário, a decisão de Nikki Haley de persistir na corrida eleitoral sugere a busca por uma opção mais moderada e, teoricamente, viável. No entanto, surge a incerteza quanto à sua capacidade de competir efetivamente nas eleições presidenciais contra os democratas. Essa preocupação reflete as dúvidas do Partido Republicano sobre a capacidade de Haley de enfrentar os desafios que envolvem a candidatura presidencial, especialmente considerando a sombra de Trump e suas implicações legais e políticas. Por enquanto, as insatisfações dentro do partido parecem ser vozes de pouca força, mas revelam uma dinâmica complexa e fluida no cenário político atual.

 

Considerando a importância dos eleitores independentes e moderados nestas localidades, como avalia a estratégia de Donald Trump e Nikki Haley para atrair esse segmento específico?

DP: Nikki Haley adota uma abordagem de republicanismo liberal contemporâneo e moderado, destacando a inclusão do papel da mulher na política. Sua proposta representa uma visão mais liberal e moderna dentro do Partido Republicano. A candidatura de Haley enfatiza a importância da estabilidade democrática em contraposição à imagem de Trump, que é caracterizado como um líder irascível e imprevisível. Haley defende a inclusão e representa uma visão mais progressista, especialmente no contexto feminino, contrastando com a abordagem de Trump.  

Este, por sua vez, foca em pontos centrais para o homem médio americano, como a estagnação econômica interna. Trump associa a gestão de Biden a uma suposta falta de liderança e acusa o governo de ser incapaz de lidar com os desafios enfrentados pelos cidadãos. Ele ainda explora a insatisfação popular com a perda de oportunidades, a crise econômica e as questões internacionais, como no Afeganistão, Ucrânia e Oriente Médio. Sua estratégia se concentra em oferecer soluções concretas para os problemas cotidianos dos americanos, prometendo um governo a serviço dos cidadãos. 

As duas abordagens refletem diferentes visões dentro do Partido Republicano, com Haley adotando uma postura mais inclusiva e moderada, enquanto Trump se concentra em questões práticas e na crítica à gestão atual. Essas estratégias buscam atrair eleitores independentes e moderados em New Hampshire, cada uma com seu próprio apelo e abordagem.

 

Donald Trump caracterizou Nikki Haley como uma "impostora" em seu discurso de vitória. Qual o impacto dessa retórica no cenário político atual e nas futuras fases da campanha?

DP: Ao rotular Haley como impostora, Trump tenta descredibilizar sua autenticidade como representante dos valores do Partido Republicano, alegando que ela é uma democrata disfarçada sob uma roupagem republicana. Trump visa ressoar com o eleitor médio americano, retratando Haley como alguém que não compartilha as convicções e preocupações fundamentais desse eleitorado. Ele se posiciona como o verdadeiro defensor dos cidadãos comuns, alguém que compreende e representa genuinamente os anseios do homem médio americano, enquanto retrata Haley como comprometida com os interesses dos políticos de Washington e a velha guarda política. 

Essa retórica tem implicações significativas no cenário político e pode moldar as fases futuras da campanha. Ao pintar Haley como uma figura desconectada dos republicanos e do eleitorado comum, Trump busca consolidar seu apoio entre os eleitores que valorizam a ideia de uma mudança radical na política. No entanto, essa abordagem também pode polarizar ainda mais o ambiente político, levando a debates acalorados sobre a autenticidade e lealdade dos candidatos dentro do partido.

 

Como as vitórias consecutivas de Trump em Iowa e New Hampshire, marcando a primeira vez desde 1976 que um pré-candidato republicano vence ambas as etapas iniciais, podem influenciar a dinâmica das primárias e a corrida presidencial em geral?

DP: As vitórias consecutivas de Trump em Iowa e New Hampshire, a primeira desde 1976 para um pré-candidato republicano, fortalecem sua posição e projeto presidencial. Isso coloca pressão em Nikki, sua principal concorrente, que enfrenta a decisão de ajustar estratégias ou possivelmente renunciar à candidatura. A situação atual sugere que Trump está em uma posição confortável, com amplo apoio da base eleitoral republicana.

 

Os resultados das primárias indicam uma preferência dos eleitores republicanos por temas como imigração e economia. Qual a importância dessas questões na atual polarização política nos Estados Unidos?

DP: O homem médio americano está predominantemente preocupado com questões domésticas e a abordagem da imigração nos EUA é analisada sob a perspectiva da tradição política ‘jacksoniana’. A imigração, especialmente dos latino-americanos, é vista como ameaça à segurança e estabilidade, apesar de preencher vagas de trabalho não qualificado. Há um paradoxo na percepção da imigração: embora forneça mão de obra, é considerada uma ameaça à segurança econômica pelos cidadãos americanos, gerando competição por oportunidades. 

O descontentamento com a política externa do presidente Biden é evidente, mesmo com restrições à entrada de estrangeiros. A retórica moderada contrasta com a percepção do cidadão americano, sendo explorada por figuras como Trump, que se apresentam como alternativas. A estagnação econômica contribui para a insatisfação, sendo uma preocupação explorada por Trump. A falta de progresso econômico será determinante para os eleitores. A participação em conflitos como na Ucrânia e em Israel, não vistos como do interesse direto do país, gera descontentamento.  

Além de questões humanitárias, há preocupação com gastos em situações que não beneficiam os americanos diretamente. Acusações de envolvimento indevido do filho de Biden no conflito na Ucrânia, ligadas à exploração de recursos, aumentam a sensação de insegurança e preocupação com o uso dos recursos americanos. Esses pontos sensíveis carregam podem influenciar percepções sobre a administração e a política, destacando preocupações com segurança, economia e gastos governamentais.

 

Considerando que Trump foi apoiado por eleitores republicanos preocupados com imigração e economia, como isso reflete nas divisões dentro do Partido Republicano e nas preferências dos eleitores?

DP: Noto uma divisão entre o republicanismo tradicional, associado à política institucional e interesses de grandes grupos econômicos, e a realidade dos Estados Unidos, onde o cidadão comum se preocupa com emprego, segurança e estabilidade. Dentro da América profunda, as preocupações do homem médio são centradas no seu dia a dia, oportunidades de trabalho e livre iniciativa, aspectos nos quais Donald Trump possui um talento retórico único para conquistar apoio. 

A lógica nacionalista e neopopulista de Trump identifica o "outro" como inimigo, abordando a imigração e desindustrialização, especialmente em relação à ascensão de parques econômicos estrangeiros, notadamente a China. Os republicanos contemporâneos, representados pelo cidadão comum, demonstram preocupação com questões domésticas e é esse público que sustenta o apoio à ascensão de Trump. Vale destacar que retóricas, incluindo as identitárias, são tratadas de forma secundária na candidatura de Trump, pois o homem médio está mais interessado em garantir seu emprego, oportunidades e o bem-estar econômico futuro. 

 

Se caso se concretizar, como considera o duelo entre Trump e Biden?  Como o mundo seria impactado com uma possível vitória de Trump?

DP: A campanha presidencial será intensamente polarizada, com acusações fervorosas. Biden enfrentará alegações de corrupção e envolvimentos questionáveis em interesses econômicos internacionais, enquanto Trump zombará de sua idade e retratará seu governo como senil e suscetível à manipulação. A expectativa é de ataques aos resultados econômicos do governo Biden, enfatizando os interesses domésticos. Biden criticará a transição de governo, apontando para a possibilidade de incitar um levante e a falta de comprometimento com a ordem democrática por parte de Trump. 

Em caso de vitória de Trump, é esperado um fortalecimento dos movimentos conservadores e ultradireita, tanto interna quanto externamente. Isso pode resultar em alinhamentos com líderes que compartilham sua visão, como o presidente Milley, na Hungria, e possíveis apoios em eleições brasileiras para candidatos representando a direita organizada em torno do ex-presidente Jair Bolsonaro. 

No cenário internacional, a Ucrânia pode sofrer com a ascensão de Trump, devido à sua histórica afinidade com Putin e o desejo de resolver a guerra com a Rússia a qualquer custo. Trump confrontará a China, impactando a hegemonia global dos EUA, o que pode levar a discussões sobre o papel da OTAN e a ascensão da União Europeia. Ao projetar o futuro, é relevante considerar as tendências observadas durante o governo Trump, destacando o alinhamento com líderes simpáticos, o enfrentamento de questões geopolíticas e a busca por destaque na arena internacional como temas recorrentes que moldarão as dinâmicas globais nos próximos anos.

 

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