Atitude da vítima
nos primeiros momentos após acidente pode determinar sucesso de todo o
tratamento
Por ano, mais de um milhão de brasileiros sofrem
algum tipo de queimadura. Destes, apenas 100 mil procuram atendimento médico e
2,5 mil morrem por complicações causadas pelo acidente. Um estudo recente
realizado no Colégio Positivo, em Curitiba (PR), alerta para os riscos de
complicações no tratamento de queimaduras, por conta da desinformação.
A pesquisa foi realizada pelas estudantes Rafaela
Bernardi Rizotto e Rebecca Nogueira Veloso para um trabalho científico sobre enxerto
de pele e apresentado em março de 2021 na Feira Brasileira de Ciências e
Engenharia (Febrace), da Universidade de São Paulo (USP). Foram entrevistadas
400 pessoas, sendo que mais da metade (50,5%) delas possui grau de instrução
superior completo e 57,8% já sofreram algum tipo de queimadura.
O dado mais alarmante é que 39% dos entrevistados
afirmaram que não procurariam cuidados médicos. "Muitas vezes, a
desinformação chega a ser pior que a própria queimadura, pois os primeiros
cuidados devem ser rápidos e precisos para aumentar o índice de sucesso do
tratamento e reduzir o risco de complicações", afirma a coorientadora do
estudo, Irinéia Inês Scota, que é coordenadora de Pesquisa Científica e
Empreendedorismo do Colégio Positivo.
Das pessoas que não buscariam cuidado médico, 16%
afirmaram que se automedicariam com remédios já existentes em casa ou
recomendados por conhecidos; 9,3% fariam uso de produtos não-convencionais
caseiros e 3,8% disseram que procurariam informações on-line sobre
como proceder. Entre os métodos caseiros citados, destacaram-se o leite materno
(3,5%), creme dental (3,3%) e o óleo de cozinha (2,3%).
Segundo o estudo, a falta de informação pode elevar
a taxa de mortalidade nos casos de queimaduras. "Os familiares e
socorristas podem, na maioria das vezes, salvar vidas prestando corretamente os
primeiros socorros às vítimas, evitando a automedicação e o uso de substâncias
caseiras", afirma Rafaela Rizotto. O presidente da Sociedade Brasileira de
Queimaduras (SBQ), José Adorno, ressalta que o primeiro cuidado com o ferimento
é fundamental para o sucesso do tratamento. "Qualquer substância que seja
passada sobre a pele queimada vai irritá-la e pode fazer com que a queimadura
piore, inclusive evoluindo de um grau para outro. Há também o alto risco de
infecção por bactérias, fungos e vírus presentes nesses produtos, já que a
barreira natural do organismo – a pele – está danificada", esclarece.
De acordo com Adorno, o tratamento vai depender da
gravidade da ferida, localização, profundidade, extensão, presença ou não de
infecção, agente causador da queimadura, estado nutricional do paciente, idade
e presença de doenças crônicas degenerativas. No entanto, antes de chegar ao
hospital ou unidade de saúde, algumas medidas simples podem ajudar a aliviar
a dor e conter o ferimento.
A orientação da Sociedade Brasileira de Queimaduras
é que, imediatamente após o acidente, deve-se resfriar o local com água
corrente; retirar acessórios (como anéis, colares, relógios etc), pois o corpo
incha naturalmente após uma queimadura e esses objetos podem ficar presos;
tomar comprimido analgésico para o alívio da dor; cobrir o ferimento com pano
ou toalha limpa e dirigir-se à emergência (UPA) ou chamar socorro médico
(SAMU). Não é indicado o uso de gelo nas lesões, furar as bolhas, tocar a área
afetada com as mãos ou utilizar qualquer produto no local sem orientação
médica.
O cirurgião plástico Luiz Henrique Calomeno informa
que mais de dois terços dos acidentes com queimaduras acontecem dentro de casa
e, por isso, houve um aumento considerável de casos durante a pandemia.
"As pessoas estão cozinhando mais e com o agravante do uso indiscriminado
de álcool em gel em altas concentrações, que são ainda mais inflamáveis",
alerta. Ele aconselha que, dentro de casa, seja dada preferência à lavagem de
mãos com água e sabão, para diminuir o risco de acidentes.
Outro agravante, segundo Calomeno, é que muitas
pessoas não procuram cuidados médicos por pensar que não terá atendimento por
conta da alta ocupação hospitalar nessa época ou ainda com medo de se infectar
com a Covid-19 dentro das unidades de saúde ou hospitais. "As queimaduras
estão dentro do hall de emergências que serão sempre atendidas, independente de
pandemia ou não", assegura o cirurgião.
Novas técnicas medicinais para o tratamento de
queimaduras no Brasil
Enxertos sintéticos vêm sendo estudados e testados
para cobrir temporariamente áreas da pele afetadas por grandes queimaduras.
Eles protegem contra infecções e perda de líquidos e podem ser apresentados em
forma de spray, gel, espuma ou membrana. É o caso da pele de tilápia e do mel
de abelhas, que foram estudados pelas jovens curitibanas.
O trabalho mostra que a pele da espécie de peixe
tilápia possui características e morfologia semelhantes à pele humana, mas com
cicatrização mais rápida - de 16 dias, em vez de 21. Com maior aderência à
ferida, evita contaminação externa e desidratação, além de demandar trocas
menos frequentes do curativo. A pele de tilápia pode ser deixada sobre a ferida
por dias e, conforme a situação, até a cicatrização completa, o que pode
reduzir o sofrimento do paciente. A técnica também tem um custo mais baixo se
comparada aos demais tratamentos.
Outro componente que vem sendo utilizado para
tratar queimaduras é o mel (de grau médico, orgânico, livre de toxinas e
esterilizado). Apresentado nas formas de tubo, gel e curativos, possui efeito
antibactericida, cicatrizante e ainda diminui o edema local e a cicatriz. As
estudantes pesquisaram que o tratamento com mel de abelha pode substituir os
antibióticos tópicos, pois promove a formação de novos vasos sanguíneos e
estimula as células do sistema imune. Além de ser natural, possui baixo
custo.
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