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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Uso terapêutico do canabidiol durante o processo demencial de Alzheimer

Nos últimos anos a população idosa tem aumentado cada vez mais, isso é uma conquista na marca da humanidade, mas também é um desafio em proporcionar qualidade de vida para a terceira idade, que é considerada a população com 60 anos ou mais. No Brasil segundo dados do IBGE são mais de 28 milhões de pessoas nessa faixa etária, o que representa 13% da população. No último século, a esperança média de vida aumentou em média 30 anos nas regiões desenvolvidas do mundo.  

O envelhecimento deve ser entendido como um processo natural de desgaste fisiológico dos sistemas do organismo. Tal desgaste pode ocasionar diminuição das capacidades físicas e um aumento relativo da incapacidade para realização de atividades cotidianas. Apesar de não estabelecido oficialmente, o termo envelhecimento é frequentemente empregado para descrever as mudanças de forma e função ao longo da vida, que ocorrem nos organismos após a maturação sexual e que progressivamente comprometem a capacidade de resposta dos indivíduos ao estresse ambiental e à manutenção da homeostasia.  

O processo de envelhecimento pode ser dividido em envelhecimento biomédico (focada na dicotomia saúde-doença) e psicossocial (capacidade de manter a atividade mental e a vida social). O envelhecimento ativo mantém três características, probabilidade baixa de doenças e de incapacidades relacionadas às mesmas, alta capacidade funcional cognitiva e física e engajamento ativo com a vida, as variáveis gênero, escolaridade, renda familiar e capacidade funcional influenciam no envelhecimento saudável e ativo.  

A transição demográfica acarreta a transição epidemiológica, o que significa que o perfil de doenças da população muda de modo radical, pois teremos que aprender a controlar as doenças do idoso. Em um país essencialmente jovem, as doenças são caracterizadas por eventos causados por moléstias infectocontagiosas, cujo modelo de resolução é baseado no dualismo cura/morte. O perfil de doenças no idoso muda para o padrão de doenças crônicas, portanto, o paradigma muda. 

O envelhecimento populacional traz consigo problemas de saúde que desafiam os sistemas de saúde e de previdência social. Envelhecer não significa necessariamente adoecer. Os avanços no campo da saúde e da tecnologia permitiram para a população com acesso a serviços públicos ou privados adequados uma melhor qualidade de vida nessa fase.(KALACHE, 2008)   

O envelhecer é um processo progressivo de diminuição de reserva funcional, no caso, a senescência. No processo de envelhecimento é importante não apenas para entender a etiologia associada aos processos degenerativos que lhe estão associados, mas fundamentalmente para conhecer e desenvolver estratégias que atenuem os efeitos da senescência. (LIENGME et al., 2015) 

Para a Organização Mundial da Saúde a definição de velhice é baseada na idade cronológica, na qual a definição de idoso inicia aos 65 anos nos países desenvolvidos e aos 60 anos nos países em desenvolvimento. No Brasil, de acordo com o Estatuto do Idoso (2003), as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos são reconhecidas como idosas. Entretanto, alguns direitos como a gratuidade no transporte coletivo público urbano e semiurbano só é concedida aos maiores de 65 anos. 

Com o processo de envelhecimento, ocorrem mudanças fisiológicas, sociais/econômicas, psicológicas/emocionais entre outras. Tais mudanças não raras vezes se apresentam acompanhadas de perda de papéis sociais, solidão, perdas afetivas e aumento da vulnerabilidade. Também é característica dessa fase a diminuição da capacidade de recuperação dos efeitos de eventos que desequilibram o organismo e menor plasticidade neural. Todas as atitudes tomadas ao longo da vida influenciam na velhice, como alimentação, sono, exercícios físicos, exercícios mentais, vícios entre outros.  

Socialmente, pode-se inferir que a pessoa é definida como idosa a partir do momento em que deixa o mercado de trabalho, no entanto um indivíduo pode ser mais velho ou mais jovem dependendo de como ele se comporta dentro de uma classificação esperada para sua idade em uma sociedade ou cultura particular.  

A relação existente entre afeto e emoção é fundamental na vida, o que indica a necessidade de se investir na afetividade para a construção de relações interpessoais mais harmoniosas; a velhice é uma época de muitas carências e, sujeita a preconceitos que limitam as possibilidades dos idosos. O lazer é visualizado como uma possibilidade de melhoria da qualidade de vida das pessoas, que permite ao idoso a ressignificação emocional de seu lazer, favorecendo sua inclusão na vida social e afetiva novamente, fazendo com que a pessoa se sinta acolhida e útil novamente.  

A perspectiva Life-Span colabora para mudar a concepção de que o idoso é um ser passivo e doente, ressaltando a possibilidade de desenvolvimento durante todo o curso da vida e enfatiza a importância de atividades para a manutenção do envelhecimento saudável. A aquisição de novas aprendizagens tem sido considerada uma tarefa importante nesse sentido, uma vez que pode otimizar as capacidades cognitivas e favorecer a rede de suporte social do idoso. A criação de oportunidades de lazer, de socialização e, principalmente, de educação mostra-se fundamental nessa fase da vida, permitindo equilibrar os declínios inerentes ao envelhecimento e os benefícios proporcionados por essas atividades. 

O envelhecimento é caracterizado por um declínio das funções orgânicas que ocasiona diversas modificações em todo o organismo, levando a uma redução da capacidade funcional. O sistema nervoso central é extremamente afetado pelos processos de envelhecimento, que são caracterizados por alterações morfofuncionais, histológicas e nos sistemas de neurotransmissores que levam a várias mudanças na fisiologia cerebral. Todas as alterações fisiológicas relacionadas ao envelhecimento são consequências de mudanças nos processos bioquímicos associados a estes sistemas. Uma importante alteração seria a neurodegeneração, perda progressiva da estrutura ou funcionamento dos neurônios, incluindo a morte celular, vide apoptose dessas células.  

A plasticidade neural pode ser definida como uma mudança adaptativa na estrutura e nas funções do sistema nervoso, como função de interações com o ambiente interno ou externo ou, ainda, como resultado de injúrias, de traumatismos ou de lesões que afetam o ambiente neural. Na investigação das relações entre plasticidade neural e comportamento, verificam-se diferentes níveis de análise comportamental, incluindo desde a análise de respostas específicas que são aprendidas e memorizadas, até a avaliação de padrões comportamentais mais complexos, envolvidos na recuperação de função, ou seja, neuroplasticidade é a capacidade de o cérebro se adaptar a mudanças.  

O processo de envelhecimento neurológico pode trazer junto consigo as demências, que são explicadas como um déficit na função cognitiva de modo que afete a vida social, profissional ou acadêmica da pessoa, sendo a doença de Alzheimer a mais prevalente. A demência relacionada com o envelhecimento normalmente tem um início lento e gradual, com a atrofia hipocampal sendo manifestada após vários anos de início dos sintomas clínicos. A doença de DA é uma doença neurodegenerativa progressiva que emergiu como a forma mais prevalente de demência tardia em humanos. A produção de β amilóide a partir da proteína precursora de amilóide e seu subsequente acúmulo, agregação e deposição no cérebro são eventos centrais na patogênese do Alzheimer. 

No envelhecimento são perdidos 50% dos neurônios, essa perda tem sido apontada como o principal fator relacionado à idade para explicar a diminuição do córtex cerebral, no entanto foi concluído que a idade não acarretaria uma perda significativa de neurônios no córtex cerebral humano. As mudanças decorrentes do envelhecimento nos corpos celulares dos oligodendrócitos, poderiam estar relacionadas à perda de fibras mielinizadas nos cérebros velhos.   

As perdas de sinapses durante o envelhecimento humano são específicas por região e as alterações podem variar nos diferentes tipos de sinapses. Existe mais de um fenômeno compensatório para manter a função sináptica cortical normal, pois a perda de sinapses e as mudanças nas estruturas pré-sinápticas parecem ser acompanhadas por um aumento na extensão média da zona pós-sináptica ativa, observando que muitas sinapses contendo neurotransmissores excitatórios como o glutamato, estabelecem contatos sobre as espinhas dendríticas, a perda significativa de estruturas dendríticas pode limitar a disponibilidade de substrato pós-sináptico para conexões sinápticas nos cérebros velhos.  

As modificações dendríticas relacionadas à idade incluem o encurtamento e a diminuição das ramificações dos dendritos. Considerando-se, no entanto, que o número de neurônios permanece praticamente estável no córtex cerebral velho, a redução significativa de conexões interneuronais no cérebro seria resultante da perda de estruturas pré e pós-sinápticas.  

          

Enquanto a capacidade de processar informações do hipocampo pode se deteriorar no decorrer do envelhecimento normal sem que haja perda significativa de neurônios, as alterações específicas dos circuitos relacionados com os receptores NMDA podem realçar danos na memória no idoso. O hipocampo tem um papel fundamental na aprendizagem e na formação e consolidação da memória e está criticamente envolvido na regulação da emoção, medo, ansiedade e estresse, sendo uma das primeiras regiões envolvidas no Alzheimer. 

O envelhecimento cerebral é um processo inevitável, porém postergável, através de exercícios físicos e mentais, hábitos saudáveis e terapias alternativas. Dentro das terapias alternativas, os canabinoides (CB) vêm se mostrando eficazes na inibição de formação de placas beta amiloides, a partir do seu papel anti inflamatório e antioxidante.  

O primeiro registro de uso de cannabis na história da Medicina é datado de 2737 AC na China, onde prescrevia-se chá de maconha para o tratamento da gota, reumatismo, malária e memória fraca. Na Índia, usavam maconha para fins religiosos e alívio do estresse. Médicos da antiguidade prescreviam maconha para tudo, desde o alívio para dor de ouvido, até para as dores do parto. O médico Pedânio Dioscórides, greco-romano, considerado o fundador da farmacologia, publicou em sua obra “De Materia Medica”, a principal fonte de informação sobre drogas medicinais, que a maconha medicinal era indicada como tratamento eficaz para dores articulares e inflamações.  

Em 1464 houve o primeiro relato considerando a maconha para tratamento de epilepsia, em Bagdá. Em 1839, na Índia, a maconha medicinal era o remédio anticonvulsivante de maior valor.   As notícias se espalharam pela Ásia, Europa e chegaram aos EUA, onde em 1889 consolidou-se como medicamento. Em 1924 a discussão, em âmbito mundial levou a tese de que o consumo da maconha era um mal, devendo ser, portanto, proibida. Hoje a discussão ainda permanece. 

O canabidiol (CBD) é o principal canabinóide não psicotomimético derivado da cannabis. O CBD é desprovido de atividade direta dos receptores CB1 e CB2, mas exerce uma série de efeitos importantes no cérebro. Aqui, tentamos resumir as descobertas atuais sobre os efeitos do CBD na atividade dos astrócitos e, dessa maneira, nas funções do sistema nervoso central, em vários modelos e neuropatologias testados. Os dados coletados mostram que o aumento da atividade dos astrócitos é suprimido na presença de CBD em modelos de isquemia, doenças neurodegenerativas, epilepsia e esquizofrenia. Além disso, o CBD demonstrou diminuir as funções pró-inflamatórias e a sinalização nos astrócitos, importante célula nervosa para geração de neuroplasticidade. 

         O CBD age em diversos sistemas neuronais e também no sistema endocanabinóide (GABA, serotonina, glutamato, entre outros), exercendo uma ampla variedade de ação farmacológica sem interação com o sistema dopaminérgico e, portanto, não causando euforia, agitação ou eventos motores quaisquer. Em modelos de lesão aguda do sistema nervoso central, o CBD diminui a neuroinflamação através da estimulação do receptor de adenosina e também, reduzindo a transmigração de leucócitos e regulando a expressão da molécula-1 de adesão celular vascular (VCAM-1). Adicionalmente, foi observada uma ativação reduzida da micróglia com a administração de CBD, reduzindo significativamente a morte celular neuronal induzida por β amiloide.  

            A literatura é ainda escassa, portanto inconclusiva, no entanto, os trabalhos apresentam uma grande expectativa no tratamento do Alzheimer com o uso do CBD impedindo o acúmulo de placas beta amiloides mesmo com a produção acelerada devido a alterações gênicas que levam à hiperatividade neural, aumentando o acúmulo de beta amiloide

 



Sandra Regina Mota Ortiz - diretora de pesquisa na USJT


Aline Gavioli - Analista na Cientifica LAB


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