Muito se tem falado sobre “busca do entendimento” desde as eleições das novas presidências do Congresso. Lembrei-me de Churchill: “Quanto mais longe você conseguir olhar para trás, mais longe enxergará para frente”. E se o estudo da História para muito me tem servido, há bom lugar nesse conhecimento para a convicção de que com certos adversários não há conciliação possível. Novamente, nas palavras de Churchill: “Um apaziguador é alguém que alimenta um crocodilo esperando ser o último dos devorados”. Foi ele, pessoalmente, liderando seu povo, que livrou a humanidade do nazifascismo.
O que estou afirmando não é grito de guerra,
mas fé inexorável na democracia, na livre escolha dos povos, na autonomia das
nações, na liberdade e nos princípios e valores que a vida me mostrou terem
validade comprovada. Quero, portanto, que, no regime democrático, esses valores
sejam prevalentes, não sejam derrotados por adversários que transitam pelas
páginas da história como os cavalos de Átila.
O discurso do entendimento
serve como luva às mãos dos derrotados de 2018. Entre nós, seria o retorno ao
ambiente político que vigeu durante mais de duas décadas no Brasil sem
encontrar resistência. É fazer de conta que nada aconteceu. Para usar a
expressão hoje na moda, é “passar pano”, mas em lixo nuclear! Qual a
vantagem de fazê-lo para “conciliar” com quem, fora do poder, faz oposição
contando caixinhas de chiclete e latinhas de leite condensado? Valha-me Deus!
Não pode haver entendimento
entre tão diferentes visões de mundo, de pessoa humana, de liberdade, de
sociedade, de valores, de princípios, de Estado, de funções de poder. Pergunto:
não passaram ao controle dos ministérios da verdade (profetizados por George
Orwell) e criados pelas Big Techs, as redes sociais que democratizavam a
comunicação? Não notamos qualquer semelhança entre as orientações da Netflix e
da Globo?
Estamos satisfeitos com o que está sendo produzido, aqui, pelo sistema de
ensino em geral e pelas nossas universidades em particular? Mil vezes não.
Portanto, a disputa política é
disputa necessária, indispensável. Não por acaso, ocorre em todas as
democracias do Ocidente. Recentemente foi assim nos Estados Unidos. Com
diferentes qualidades de conteúdo, vem sendo assim em países como Itália,
Espanha, Áustria, Portugal, Polônia, Hungria, República Tcheca, Finlândia,
Letônia, Eslováquia, Bulgária. E Suécia, e Alemanha, e Chile. É uma percepção
das democracias ocidentais.
Quem vê suas liberdades
ameaçadas, suas opiniões censuradas no que já foi um espaço de liberdade, sua
cultura sendo deliberadamente destruída, não cede poder para um entendimento
impossível. No Brasil, isso representa o retorno ao período anterior a 2014,
quando perdíamos por W.O.. Sequer comparecíamos à disputa.
Por fim, veja o que está acontecendo
com a evasão para novas redes sociais que se anunciam como espaços de
liberdade. Também isso é sinal dessa divisão que tem longa data e validade,
cujo reflexo, em regime democrático, conduz à vitória eleitoral de um ou de
outro lado. Pode ser que um dia, olhando para trás, aprendendo com o passado,
vendo o mal feito e o bem conquistado, possamos, como Churchill, enxergar para
frente. E formarmos consensos razoáveis. Divisão, contudo, sobre algo, ou em
relação a alguém, sempre haverá.
*Publicado originalmente em Conservadores e Liberais o site de Puggina.org
Percival Puggina -
membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é
arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais
(Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de
Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões;
A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo
Pensar+.
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