Precisamos cobrar das nossas escolas uma atuação inclusiva como cobramos empresas e marcas
Percebo que grande
parte das pessoas estão mais conscientes das mudanças que precisamos fazer na
forma como vivemos para diminuir a desigualdade no mundo. Movimentos na internet
cobram mais responsabilidade social e ambiental de marcas, empresas e governos.
Isso é ótimo! Mas olhar a questão apenas pela perspectiva do consumo e do
assistencialismo não é o bastante para mudar o mundo. Por exemplo, quando
falamos sobre a escolha da escola do seu filho, você observa e exige a mesma
postura consciente e inclusiva que procura nas marcas de produtos que consome?
Queremos que nossos
filhos tirem notas altas que garantam vaga em uma boa universidade para que
conquistem um bom lugar no mercado de trabalho. Estimulamos uma competição que
emula separar os bem sucedidos dos fracassados desde a tenra idade, nivelando
todos com uma régua torta e negando a uma boa parte dos alunos o direito de
desenvolver suas habilidades. Nossa concepção de escola é exageradamente
meritocrática, o que não nos permite perceber como a educação básica é
essencial para a verdadeira mudança.
A escola e a família
devem ser o primeiro lugar onde as noções de justiça, inclusão e diversidade
precisam ser aplicadas para que os jovens cresçam com bons exemplos para
replicá-los conscientemente em sociedade. Nenhuma criança é igual a outra, cada
uma delas, invariavelmente, vai apresentar facilidades e dificuldades
diferentes, e é papel das escolas valorizar e integrar as diferenças para que
elas consigam superar seus próprios desafios. Olhar com atenção para essa
questão é também uma forma de combater a desigualdade. Uma educação de
qualidade precisa ser a base da vivência desse futuro melhor que queremos
construir, formando cidadãos conscientes de seu impacto no mundo.
Fora do Brasil, vemos
experiências bem sucedidas com estudantes conectados com a realidade social,
exercendo trabalhos voluntários como parte do aprendizado de novas
competências, como empatia e solidariedade. Em muitos lugares é currículo
obrigatório, além de contar pontos para as melhores universidades. No Brasil, a
BNCC (Base Nacional Comum Curricular) já adotou habilidades socioemocionais
para os currículos, mas ainda é problemático como isso se aplica nas escolas. A
verdade é que os educadores têm pouco conhecimento sobre isso, e praticamente
não existe um processo ou estímulo à formação continuada para apoiar os
profissionais de educação a adquirirem métodos e habilidades a fim de inovar na
educação, principalmente na esfera pública.
Não podemos deixar de
reconhecer os profissionais da educação que se esforçaram todos os dias para
que a maioria não fosse deixada sem ensino durante a pandemia. Tem sido um
trabalho heroico, mas não podemos romantizar as péssimas condições de trabalho
que ficaram evidentes. Precisamos olhar para toda estrutura que chamamos de
escola e agir no coletivo para transformar positivamente as relações
interpessoais, trabalhistas e curriculares, de forma a levar mais justiça e igualdade
de oportunidades para todos. Não há desenvolvimento real se não nos
desenvolvermos todos juntos.
Em 2020, vimos um
sistema de educação bastante frágil e desigual sendo abalado. Precisamos agir
agora para mitigar as consequências e equilibrar as oportunidades, reinventando
as maneiras de aprender e ensinar. Caso contrário, continuaremos a ver um
futuro que repete o passado sistematicamente. Acredito que integrar e
transformar a comunidade escolar junto aos nossos filhos, construindo modelos
equânimes desde a base, seja o melhor caminho para uma mudança social profunda
e urgentemente necessária. Tenho esperança, mas não no sentido de esperar que
as coisas mudem, e sim, no agir para ser a mudança, como sabiamente nos ensinou
Paulo Freire.
Carolina Videira -
educadora mestre em neurologia e especialista em inclusão para diversidade e
fundadora da OSC Turma do Jiló.
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