Maria
da Penha Maia Fernandes, no ano de 1983, sofreu dois atentados por seu próprio
marido. No primeiro, levou um tiro nas costas enquanto dormia o que a deixou
paraplégica. E no segundo, ainda em recuperação, o marido tentou eletrocutá-la
enquanto tomava banho.
Após
o segundo atentado, Maria da Penha decidiu se separar. Foram anos de luta para
provar a culpa de seu agressor. Por mais de 15 anos o processo não teve
solução, até que Maria da Penha resolveu denunciar o país ao Centro de Justiça,
ao Direito Internacional (CEJIL) e ao Comitê Latino-Americano de Defesa dos
Direitos da Mulher (CLADEM) a Comissão Internacional de Direitos Humanos.
Com
muita luta, não só para solução do seu caso particular, mas engajada no combate
à violência contra a mulher, conseguiu que fosse decretada pelo Congresso
Nacional a Lei 11.340/2006. A lei que leva seu nome, Maria da Penha, foi
sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 7 de agosto de 2006
e entrou em vigor no dia 22 de setembro de 2006.
Esta
lei mudou a forma como se tratava a violência doméstica no Brasil, propondo
medidas para a punição dos agressores e para a proteção das mulheres vítimas de
violência. Desde então, há uma luta constante não só com relação à devida
aplicabilidade da Lei, mas principalmente em encorajar as mulheres vítimas de
violência doméstica, bem como toda a sociedade a denunciar os agressores e
exigir que a Lei se cumpra.
Embora
existam várias conquistas após a vigência da Lei Maria da Penha, a efetividade
na solução deste problema social ainda é inócua e carece de alternativas
eficazes para ser atingida. Isto porque a sociedade não foi educada a encarar a
violência doméstica e familiar como um problema social e, principalmente, como
um ato criminoso.
Vale
ressaltar que a violência doméstica e familiar é somente uma das formas de
violência contra a mulher. A Lei Maria da Penha classifica os tipos de
violência contra a mulher nas seguintes categorias:
1.
Violência patrimonial: entendida como qualquer comportamento que
configure controle forçado, destruição ou subtração de bens materiais,
documentos e instrumentos de trabalho, violência sexual, violência física,
violência moral e violência psicológica.
2.
Violência sexual: engloba os atos que forcem ou constranjam a mulher a
presenciar, continuar ou participar de relações sexuais não desejadas, com
intervenção de força física ou ameaça.
3.
Violência física: compreendida por maneiras de agir que violam os preceitos a
integridade ou a saúde da mulher.
4.
A violência moral: entendida como qualquer conduta que represente calúnia,
difamação e/ou injúria.
5.
Violência psicológica: entendida como qualquer comportamento que cause à mulher
um dano emocional, diminuindo sua autoestima, causando constrangimentos e
humilhações
Em
grande parte das vezes a violência doméstica e familiar se inicia com a
violência psicológica, que contribui para a perda gradativa de sua autoestima e
confiança, até chegar ao ponto de perder por completo sua dignidade e ao
exagero de acreditar que é merecedora e única responsável por todo o mal que
vem sofrendo, se tornando extremamente submissa às vontades de seu agressor, na
maioria das vezes seu próprio companheiro, e se submetendo a espancamentos,
violência sexual, patrimonial e moral.
Com
a autoestima degradada, a mulher acaba aceitando toda humilhação como um
castigo merecido e se omite, preferindo o sofrimento a correr o risco de ser
julgada perante a sociedade.
A
sociedade por sua vez, tendo intrínseca a tradição machista que por séculos
embasa a cultura no Brasil, também prefere se omitir a se expor, afinal foi
educada a acreditar que "em briga de marido e mulher não se mete a
colher" ou pior ainda, tem a crença em que "ele não sabe porque está
batendo, mas ela sabe porque está apanhando".
A
Organização Mundial da Saúde (OMS) fez uma pesquisa com 83 países sobre o
assassinato de mulheres. Nesse ranking o Brasil ocupa a 5.ª posição com uma
taxa de 4,8 homicídios de mulheres a cada 100 mil, o que leva à conclusão que a
lei por si só não é suficiente para cessar as agressões e outras violências
contra a mulher.
Esse
é um indicador que os índices do país são excessivamente elevados (Mapa da
Violência, 2015);
–
Entre 1980 e 2013, 106.093 pessoas morreram por sua condição de ser mulher. As
mulheres negras são ainda mais violentadas, entre 2003 e 2013, houve aumento de
54% no registro de mortes, passando de 1.864 para 2.875 nesse período. Muitas
vezes, são os próprios familiares (50,3%) ou parceiros/ex-parceiros (33,2%) os
que cometem os assassinatos;
– No
Brasil, 4.606 mulheres foram vítimas de homicídio no ano de 2016, portanto, 12
mulheres foram assassinadas a cada duas horas. Mas, apenas 621 casos foram
classificados como feminicídios, demonstrando as dificuldades no primeiro ano
de implementação da lei do feminicídio, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança
Pública (2017);
– Em
números absolutos, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2017), o Brasil
teve 49 mil casos de estupro em 2016, o que corresponde a uma taxa de 24,0 para
cada grupo de 100 mil habitantes nesse ano.
– Em
relação à violência doméstica e familiar contra a mulher o Relógio da Violência
do Instituto Maria da Penha aponta que a cada 2 segundos, uma mulher é vítima
de violência física ou verbal no Brasil.
Como
dito, a Lei Maria da Penha, isoladamente, é insuficiente para cessar a
violência contra a mulher. Há a necessidade de propor verdadeira educação
à sociedade como forma de minimizar e quem sabe um dia zerar o número de casos
de violência doméstica e familiar e, há a necessidade de esclarecer, com o
intuito de empoderar /encorajar a mulher a se posicionar como Ser em igualdade
com o homem.
Toda
mulher deve entender que nada nem ninguém, independente do cenário e da
condição que se encontre, tem o direito de roubar o seu direito ao respeito e
dignidade. Toda mulher deve criar coragem de se reconhecer num estado de
violência e denunciar seu agressor.
O
encorajamento da mulher e a conscientização da sociedade, de que a mulher
jamais é culpada ao ponto de merecer ser humilhada, violentada ou espancada por
seu companheiro ou por quem quer que seja, e a aplicação imediata da Lei Maria
da Penha, com implantação de postos de atendimento com profissionais preparados
e especializados para o atendimento da vítima, são pontos primordiais para a
efetividade no combate à violência contra a mulher.
Mayra Vieira Dias - sócia do escritório Yamazaki,
Calazans e Vieira Dias e membro do Comitê Combate À Violência Contra A Mulher –
Grupo Mulheres do Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário