A
integração e a interoperabilidade dos dados de saúde tornaram-se recentemente, na
maioria dos países, um dos principais objetivos dos sistemas informatizados de
apoio e documentação das atividades nesta área. O motivo é que existe uma
diversidade gigantesca de sistemas de diferentes desenvolvedores comerciais e
não comerciais utilizados pelos provedores de serviços médicos e de saúde, mas
que geralmente não se comunicam entre si. Com isso, o prontuário eletrônico do
paciente, quando existe, não é centrado na pessoa e é extremamente fragmentado,
dividido entre os diferentes provedores, que são os médicos, dentistas, outros
profissionais do setor, clínicas de diagnóstico, hospitais, governo e planos de
saúde. Para completar essa situação catastrófica e insustentável, a maior parte
da informação – 80% no Brasil – está em papel, filmes ou outras mídias físicas,
totalmente inacessíveis aos sistemas eletrônicos, o que torna a informação
acerca de um paciente bastante incompleta, na maioria dos casos, ou altamente
redundante e obsoleta, em outros.
O
custo dessa falta de integração de dados é altíssimo, tanto em vidas humanas
afetadas por erros médicos quanto em desperdícios no sistema de saúde como um
todo. Um exemplo gritante é a chamada interação medicamentosa que, segundo
estimativas, mata mais de 50 mil pacientes por ano no Brasil. Por não haver um
intercâmbio de informações entre os diferentes provedores sobre quais
medicamentos um determinado paciente está tomando, os prontuários eletrônicos
não têm capacidade de detectar automaticamente potenciais interações agonistas
ou antagonistas toda vez que um novo medicamento é receitado.
A
e-saúde (“e-health”), saúde digital, ou mais apropriadamente chamada de saúde
conectada, é a solução proposta pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para
por fim a essa situação que causa tantos males. O objetivo estratégico é
conectar todos os softwares e dispositivos por meio das redes computacionais
cabeadas e sem fio, de modo que as informações e dados sobre os pacientes – e
sobre outros aspectos da operação global de um sistema nacional de saúde, tanto
na esfera pública quanto na privada – possam ser intercambiadas e integradas,
independentemente dos variados e heterogêneos sistemas identificados de
registro eletrônico de informações. Isso deve ser feito de forma segura,
preservando e protegendo a confidencialidade e a privacidade dos dados pessoais
dos cidadãos.
O
Brasil não é exceção e, desde 2017, tem um ‘Plano Estratégico Nacional de
e-Saúde’ calcado em um modelo de interoperabilidade, mandado e regulado pelo
Governo Federal. O intercâmbio, a integração e a interoperabilidade dependem
estritamente da adoção de padrões consensuais de informação em saúde, que podem
ser funcionais, para a troca de mensagens entre sistemas; semânticos, para a
representação de informações, tais como terminologias e codificações; e
operacionais. Graças à uma portaria do Ministério da Saúde de 2011, esse
processo foi iniciado mediante a indicação e adoção gradativa de muitos desses
padrões, e desde então, numerosas iniciativas têm sido promovidas pelo Governo
Federal por meio do Ministério da Saúde e do Datasus, a empresa estatal
vinculada ao Ministério que responde pela implementação dos sistemas que apoiam
a interoperabilidade.
Entre
esses programas está o ‘Conteúdo Mínimo de Dados de Saúde’ (CMD); o ‘Registro
de Atendimento de Saúde’ e ‘Registro de Alta da ABNT’; o barramento ‘SOA-SUS’
(Service Oriented Architecture), que implementa o o cadastro eletrônico do CNS
(Cartão Nacional de Saúde) por meio dos padrões internacionais IHE PIX (Patient
Cross-Identification) e PDQ (Patient Demographics Query) para identificação dos
pacientes e intercâmbio de dados demográficos; o ‘RES’ Nacional (Registro
Eletrônico de Saúde), o conjunto de softwares interoperáveis denominados
e-SUS AB (Ações Básicas), Ambulatorial e Hospitalar; o ‘CADSUS’ (cadastros
unificados de medicamentos, como o Horus, e de estabelecimentos e profissionais
de saúde, como o CNES, entre outros) e, mais recentemente, o ‘CENTERMS’ –
Centro Nacional de Terminologias em Saúde.
Muitos
desses padrões nacionais seguem os padrões internacionais desenvolvidos por
várias SDOs (Standards Development Organizations), como a ISO (International
Organization for Standards), a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas)
e, mais proeminentemente, a Health Level 7 International (HL7), presente em
muitos países, inclusive no Brasil.
Como
exemplo de grandes projetos baseados nessas iniciativas, o Ministério da Saúde
lançou em final de 2017 o programa digiSUS, de informatização integral do
sistema público de saúde, incluindo o PIUBS (Programa de Informatização das
Unidades Básicas de Saúde), que pretende informatizar integralmente as mais de
45.000 UBS existentes no país.
Gradativamente,
todos os protagonistas do SUS e da Saúde Suplementar terão que se
adaptar e implementar esses vários padrões, possibilitando a implementação
do plano estratégico nacional de e-saúde em suas várias metas, da forma mais
completa possível. Para isso, todos terão que colaborar e aderir. Concluo
incitando as empresas a colaborar neste sentido.
O
Brasil ainda peca por ter poucos especialistas em padrões, interoperabilidade e
saúde conectada, principalmente nas empresas desenvolvedoras, que necessitam
urgentemente criar condições para a introjeção desses conhecimentos, de forma a
manter a atualidade e a competitividade. Preencher essa lacuna será vital para
o futuro de todos!
Para
Saber Mais
· Estratégia
e-Saúde para o Brasil: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/julho/12/Estrategia-e-saude-para-o-Brasil.pdf
· Sociedade
Brasileira de Informática em Saúde: www.sbis.org.br
· Instituto
HL7 Brasil: www.hl7.org.br
· DATASUS
Serviços de Interoperabilidade: www.datasus.saude.gov.br/interoperabilidade/catalogo-de-servicos
· CMD
Conteúdo Mínimo de Dados em Saúde: https://conjuntominimo.saude.gov.br/
· ABNT: Comissão
Especial de Estudos em Informática em Saúde: www.cee78is.org.br
Programa Educert de Educação em Certificação de Sistemas de Informação em Saúde: www.educert.com.br
Programa Educert de Educação em Certificação de Sistemas de Informação em Saúde: www.educert.com.br
Prof. Renato M.E. Sabbatini - presidente do Instituto Edumed e consultor da
Plataforma Salute, do grupo Vitae Brasil; um dos maiores especialistas mundiais
em tecnologias de informação e comunicação em saúde, sendo um Founding Fellow
da International Academy of Health Sciences Informatics. Foi um dos fundadores
e presidente da Sociedade Brasileira de Informática em Saúde e um dos
fundadores e vice-presidente do Instituto HL7 Brasil. É consultor reconhecido
nas áreas de certificação de softwares em saúde,
interoperabilidade e segurança de sistemas de informação em saúde. Site: www.renato.sabbatini.com.
E-mail: renato@sabbatini.com
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