Embora 98% dos cidadãos considerem
importante adotar melhores hábitos de consumo, a minoria tem atitudes
responsáveis no dia a dia. Aspecto financeiro é o que mais influencia práticas
responsáveis
Apesar de a maioria dos brasileiros
reconhecer a importância de atitudes sustentáveis de consumo, poucos vêm
adotando práticas mais responsáveis no dia a dia. Foi o que constatou uma
pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e da Confederação
Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) realizada em todas as capitais do país.
De acordo com o levantamento, a maioria dos brasileiros (55%) se encaixa no
grupo de ‘consumidores em transição’, ou seja, com hábitos de consumo
consciente ainda aquém do desejado. Os pouco ou nada conscientes somam 14% de
entrevistados, ao passo que apenas 31% podem ser considerados ‘consumidores
conscientes’.
Os dados fazem parte do Indicador de Consumo Consciente (ICC), que em 2018
atingiu 73%, mantendo-se estável em relação ao ano passado (72%). O ICC
pode variar de 0% a 100%: quanto mais próximo de 100% for o índice, maior é o
nível de consumo consciente. Para chegar-se ao resultado são aplicadas
perguntas relativas aos hábitos, atitudes e comportamentos da rotina dos
brasileiros, considerando os aspectos financeiros, ambientais e sociais.
O estudo indica que embora as pessoas
enxerguem o consumo consciente como fator que pode fazer diferença na qualidade
de vida, essa preocupação nem sempre se traduz em ações concretas. Prova desse
contrassenso é que se por um lado os entrevistados demonstram não praticar com
muita frequência atitudes sustentáveis, por outro quase a totalidade (98%)
considera importante ou muito importante ter uma vida com hábitos de
consumo mais consciente — seja pela economia de recursos de água e energia,
reduzindo as compras ou pelo reaproveitamento das coisas.
“Muita gente entende a importância de transformar boas intenções em bons
hábitos, mas só toma alguma atitude quando a conta fica cara. E não basta ter
um esforço de conscientização apenas em situações críticas. Essa prática deve
ser contínua, além de estar claro que a escassez de recursos é uma realidade
bem próxima”, ressalta a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawaut.
Para economizar, nove em cada dez consumidores fazem algum tipo
de serviço em casa que poderia ser contratado fora
Sair comprando de forma inconsequente tem diversas implicações negativas. A
mais percebida pelo consumidor é aquela que impacta sua vida de forma imediata.
Por essa razão, o aspecto financeiro é o que mais influencia as práticas de
consumo consciente entre as pessoas — ou seja, quando pesa no bolso. O
levantamento aponta que dentre as várias práticas que já fazem parte da rotina
dos brasileiros, destacam-se: sempre pesquisar preço, que resulta na compra dos
itens mais baratos (92%), avaliar previamente o orçamento para saber se é
possível levar ou não um determinado produto (91%) e optar por não adquirir
algo novo quando o bem ainda pode ser usado ou até mesmo consertado (90%).
Além disso, 88% dos entrevistados disseram ter o costume de fazer na
própria casa alguns serviços que poderiam ser contratados fora para economizar,
como manicure, pet shop, cinema e lanches. Outros 87% garantem que sempre
planejam as compras do dia a dia, como supermercados, feiras e pequenas
aquisições.
A pesquisa também indica que há um esforço por parte dos consumidores em
controlar o orçamento e economizar ao máximo. Enquanto 78% sempre pedem
descontos em suas compras, 77% não recorrem ao cheque especial ou ao limite
do cartão de crédito para conseguir fechar as contas do mês. Para 75%, uma
forma de economizar é consumir somente frutas e verduras da época, por serem
mais baratas. Outros 72% evitam fazer compras parceladas para não comprometer o
seu rendimento mensal.
“A crise, ainda que à força, vem ensinando os brasileiros muitas lições
valiosas sobre economizar e pesquisar antes de sair comprando. Não se trata de
simplesmente frear o consumo, mas sim de entender que é preciso comprar com
inteligência. Em vez de procurar sempre um produto novo, é possível buscar a
reutilização, a troca, o aluguel, o conserto ou meios que não envolvam,
exclusivamente, a decisão de jogar fora e comprar outro”, avalia o educador
financeiro do portal ‘Meu
Bolso Feliz’, José Vignoli.
Mais da metade dos entrevistados acredita que o consumo
consciente só será importante daqui a alguns anos
Uma boa notícia refere-se à adoção de hábitos sustentáveis do ponto de vista
ambiental, que já estão incorporados à rotina dos brasileiros, segundo revela a
pesquisa. Ao considerar o consumo racional de água, a atitude mais adotada
pelos entrevistados (92%) é fechar a torneira enquanto se escova os dentes.
Em seguida, aparecem os que afirmam controlar todo mês o valor da conta de água
(86%), ensaboar a louça com a torneira da pia fechada (85%), não considerar um
exagero a crença de que um dia a água irá acabar (85%) e não lavar a casa ou a
calçada com mangueira (83%).
Quanto ao uso racional de energia elétrica, que tem grande impacto social e
ambiental, há também uma conscientização crescente dos brasileiros. Apagar as
luzes de ambientes que não estão sendo utilizados é a principal prática
(95%) mencionada. O segundo hábito mais comum de economia está ligado ao controle
do valor da conta de luz (90%) e o terceiro é passar roupas apenas quando
existe um volume grande de peças (82%). Há ainda 76% de consumidores que têm a
preocupação em verificar a quantidade de energia que determinado
eletrodoméstico gasta antes de comprá-lo e 73% que dão preferência à utilização
de lâmpadas de LED na residência.
Entre as ações de preservação do meio ambiente, as mais comuns citadas na
pesquisa são doar ou trocar um produto antes de jogá-lo fora (86%) e
evitar imprimir papéis para reduzir gastos e prejuízos ao planeta (79%). Em
contrapartida, há um sinal de alerta: mais da metade só acha importante
praticar o consumo consciente daqui a alguns anos, quando problemas mais graves
atingirem o meio ambiente (55%).
Maus hábitos no dia a dia e resultados pouco perceptíveis diante
de mudanças de atitude são principais obstáculos ao consumo responsável
A pesquisa também revela quais são os aspectos que motivam o consumo
consciente. Para 35% dos entrevistados, o uso racional de água e energia
elétrica está ligado a ações que evitam o desperdício de um bem que pode
acabar, ao passo que 22% afirmam dar o exemplo aos filhos, família, amigos e
vizinhos, influenciando suas atitudes.
Além disso, a maioria das pessoas ouvidas desaprova atitudes de consumo nocivas
quando veem outros desperdiçando água, energia ou comprando produtos sem se
preocupar com o meio ambiente. De cada dez entrevistados, seis (60%) se sentem
prejudicados por acreditarem que nada irá mudar se apenas eles próprios e não o
todo fizerem sua parte.
Entre os principais obstáculos apontados quanto à adoção de atitudes de consumo
consciente, o mais citado tem a ver com maus hábitos que vão se tornando
rotineiros sem que a pessoa perceba. Quando o assunto é economizar água, luz e
telefone, 33% reconhecem que a principal barreira é a distração ou
esquecimento. Já 22% afirmam ficar desmotivados por não verem resultados
diante das mudanças de atitude, enquanto 20% mencionam falta de tempo.
87% dos brasileiros evitam marcas que usam trabalho escravo;
enquanto 58% compram com alguma frequência produtos falsificados, atraídos pelo
preço
Para entender o quanto as pessoas enxergam seu papel e lugar como indivíduos
que agem em favor da coletividade, o levantamento quis saber quais ações estão
sendo feitas. As práticas mais citadas são: incentivar as pessoas de casa a
economizarem água e luz (93%), priorizar o tempo livre com família ou amigos,
em vez de ir a shoppings ou fazer compras (89%), evitar compras de produtos
de marca ou empresas que utilizam trabalho escravo (87%) e aconselhar
outras pessoas a pensar se elas realmente precisam daquilo que vão comprar ou
se é apenas um desejo passageiro (82%). Um dado que chama a atenção no
levantamento mostra que 58% acabam comprando algumas vezes mercadorias não
originais pelo preço atrativo.
Metodologia
Foram entrevistados 824 consumidores, nos meses de maio e junho, nas 27
capitais brasileiras, acima de 18 anos, de ambos os gêneros e de todas as
classes sociais. A margem de erro é de 3,4 pontos percentuais para uma
confiança de 95%.