Maior causa de transplante de córnea, a doença impulsionou a cirurgia em 273% nos últimos 10 anos.
O ceratocone está se tornando uma epidemia no Brasil. A doença afina, enfraquece e altera o formato da córnea, lente externa do olho que vai tomando o formato de um cone. De 2015 a 2025 o número de brasileiros que chegou ao grau crítico da doença que responde por 7 em cada 10 transplantes de córnea aumentou a busca pela cirurgia em 276%, enquanto o crescimento da população na última década foi de 7,6, passando de 202,8 milhões para 218,3 milhões.
É o que mostra um levantamento realizado pela equipe do Instituto Penido
Burnier nos relatórios da ABTO (Associação Brasileira de Transplante de
Órgãos). Entre janeiro e março de 2015 o País realizou 3.031 transplantes de
córnea e a fila somava 10.048 inscritos, totalizando 13.079 brasileiros com
necessidade da cirurgia. No mesmo período de 2025, 35.651 brasileiros buscaram
pelo transplante. Desses 3.959 passaram pela cirurgia e 31.792 estavam
inscritos na fila. Pior: Segundo a Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo os
serviços públicos de saúde realizaram de janeiro a abril de 2024 160
diagnósticos da doença que subiu para 542 no mesmo período de 2025. Não por
acaso, os relatórios da ABTO revelam que o estado de São Paulo é o primeiro do
ranking de transplantes e responde por 35% do todas de cirurgias.
Causas do aumento
De acordo com o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, diretor executivo
do hospital e membro do CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia), uma das
causas do aumento do ceratocone é o aquecimento global que somado à maior
poluição aumentou o número de pessoas alérgicas no País. Isso porque, explica,
o principal fator de risco do ceratocone é o hábito de coçar os olhos. Embora a
condição possa ter um componente genético, é uma doença multifatorial que
geralmente surge na puberdade e adolescência, embora possa aparecer mais tarde.
Os principais fatores de risco são:
- Predisposição a doenças
alérgicas como urticária, asma, rinite, entre outras;
- A síndrome de Down que faz o
portador esfregar os olhos;
- Olho seco severo.
Queiroz Neto explica que não é apenas por concentrar a maior população
do Brasil que o estado de São Paulo realiza mais de 1 em cada 3 cirurgias. O
domínio do transplante de córnea pela técnica lamelar que substitui apenas a
parte comprometida da córnea também explica esta participação. Isso porque, o
transplante lamelar permite que uma única córnea devolva a visão para 2
pessoas, além de permitir a recuperação mais rápida por eliminar pontos e
diminuir o risco de rejeição. O oftalmologista ressalta que muitos pacientes
buscam por vagas no interior do estado que têm atendimento mais rápido que em
outras partes do País.
Sintomas e diagnóstico
O ceratocone tende a progredir de forma gradual e muitas vezes é
confundido com astigmatismo no início, pontua. O oftalmologista destaca que
geralmente surge na puberdade e início da adolescência, mas pode ocorrer também
entre adultos. A tomografia da córnea, exame que analisa as duas faces da
córnea, anterior e posterior, é crucial para detectar a doença logo no início.
Os sintomas elencados por Queiroz Neto são:
- Visão embaçada e
embaralhada;
- Troca frequente dos óculos;
- Coceira e irritação nos
olhos;
- Aumento progressivo da
miopia, astigmatismo e irregularidades na córnea;
- Sensibilidade à luz
(fotofobia) e ofuscamento;
- Enxergar halos ao redor das luzes,
especialmente à noite;
- Visão dupla ou poliplopia,
visão de múltiplas imagens de um único objeto.
- Dificuldade de dirigir à
noite e de adaptação às lentes de contato
- Desconforto nos olhos
causado pela irregularidade da superfície da córnea;
Tratamentos
No início, o tratamento é feito com óculos e colírios para reduzir a
coceira, afirma Queiroz Neto. Conforme o ceratocone progride são indicadas
lentes de contato rígidas que aplanam o cone da córnea e permitem melhor
correção visual.
Crosslink
O especialista ressalta que o único tratamento que interrompe a
progressão do ceratocone é o crosslink. Trata-se de uma cirurgia ambulatorial
realizada com aplicação de luz ultravioleta associada à riboflavina (vitamina
B2) que aumenta em até três vezes a resistência da córnea. O procedimento,
comenta, é contraindicado para olhos com glaucoma e córneas com menos de 4
micras de espessura. Em alguns casos também melhora a visão, especialmente
quando aplicado em crianças, salienta.
Anel intraestromal e lente escleral
Para melhorar a visão o tratamento pode incluir o implante de um anel
entre as camadas da córnea que aplana o cone e facilita a adaptação à lente de
contato. Uma alternativa para escapar do transplante de córnea nos casos de
ceratocone avançado é a adaptação de lentes esclerais. Queiroz Neto explica que
este tipo de lente fica apoiada na esclera, parte branca do olho e por isso é
mais confortável que as lentes rígidas que se apoiam na córnea. Crianças que
têm hábito de esfregar os olhos devem passar por consulta. O ceratocone é mais
agressivo na infância, mas também responde melhor aos tratamentos, conclui.

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