Modelo contém as três camadas da pele: a epiderme, a derme e a hipoderme acervo dos pesquisadores |
Pesquisadores brasileiros
desenvolveram um modelo de pele artificial por impressão tridimensional (3D)
com características mais semelhantes às do ser humano. Nomeada Human
Skin Equivalent with Hypodermis (HSEH), a estrutura poderá ser
empregada em estudos para o tratamento de doenças e lesões, como feridas e
queimaduras, bem como no desenvolvimento de medicamentos e cosméticos, sem a
necessidade de testes em animais.
O processo de produção do
material, feito a partir de células-tronco (capazes de se transformar em
diferentes tipos celulares) e primárias (cultivadas diretamente a partir de
tecidos humanos), foi descrito na revista Communications
Biology por cientistas do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio),
integrante do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM). O
trabalho foi apresentado quarta-feira (27/11) em uma sessão sobre
biotecnologia realizada durante a FAPESP Week Spain, em Madri.
O evento, que terminou ontem
(28/11) na Faculdade de Medicina da Universidade Complutense de Madri (UCM), na
região de Moncloa-Aravaca, tem o objetivo de fortalecer os vínculos entre
pesquisadores do Estado de São Paulo e do país europeu para promover parcerias
de pesquisas.
“Conseguimos desenvolver um
modelo de pele completa, com três camadas: a epiderme, a derme e a hipoderme.
Dessa forma, foi possível obter um modelo do órgão com características muito similares
às do ser humano”, disse à Agência FAPESP Ana Carolina Migliorini Figueira,
pesquisadora do LNBio-CNPEM e coordenadora do projeto.
De acordo com Figueira, os
modelos de pele 3D têm sido explorados como um método alternativo ao uso de
animais em testes de absorção de cosméticos, por exemplo. Mas as opções
desenvolvidas até agora têm como limitação o fato de que negligenciam a
hipoderme – a camada mais profunda da pele e que exerce um papel fundamental na
regulação de processos biológicos importantes, como a hidratação e a
diferenciação celular.
Essa camada, formada por
células adiposas (de gordura), exerce um papel ativo na pele, influenciando
processos como regulação da água, desenvolvimento celular e imunidade, o que a
torna fundamental para criar modelos de pele completos e funcionais.
Os pesquisadores empregaram
técnicas de engenharia de tecidos para aprimorar a tecnologia e conseguir
construir um equivalente de pele humana de espessura total e com a hipoderme,
de modo a criar um ambiente mais próximo do tecido humano real, permitindo a
adesão, proliferação e diferenciação celular mais eficientes.
“Esse novo modelo de pele 3D
com a camada de hipoderme fornece uma plataforma in vitro mais
precisa para a modelagem de doenças e estudos toxicológicos”, avaliou Figueira.
“Os resultados dos ensaios que
realizamos mostram que a hipoderme é indispensável para modular a expressão de
uma ampla gama de genes vitais para a funcionalidade da pele, como os
relacionados à proteção e à regeneração do tecido”, disse.
Pele
diabética
Os pesquisadores empregaram
bioimpressão 3D para construir um modelo de pele baseado em colágeno, que serve
de matriz para a interação das células.
O LNBio produzirá a pele para
estudos próprios, mas poderá confeccionar o material para instituições de
pesquisa parceiras. A ideia é auxiliar no desenvolvimento de enxertos para
tratamento de ferimentos e queimaduras.
Por meio de um projeto financiado pela
FAPESP, no âmbito de um acordo com a Netherlands Organisation for Scientific
Research (NWO), os pesquisadores brasileiros pretendem desenvolver a partir
dessa pele 3D mais realista um modelo de pele diabética com feridas crônicas e,
consequentemente, um curativo para essa finalidade.
A ideia é que os pesquisadores
do LNBio consigam vascularizar o modelo de pele humana in vitro em
três camadas para criar uma versão que mimetize as características de pele de
pessoas com diabetes, que podem ter ferimentos de difícil cicatrização, com
risco de amputação de membros.
Em contrapartida, um grupo de
pesquisadores neerlandeses, vinculados à Radboud University Medical Center,
está trabalhando no desenvolvimento de novos biomateriais no intuito de criar
um curativo para tratar feridas diabéticas.
“Nosso objetivo é, depois de
produzido o novo curativo, testá-lo tanto em modelo animal como no de pele
diabética humana que desenvolveremos”, explicou Figueira.
Biossensores
para monitoramento
Já um grupo de pesquisadores da
Universidade Federal do ABC (UFABC) pretende empregar ferramentas da biologia
sintética para construir biossensores baseados em circuitos genéticos, como
DNA, RNA e proteínas, para o monitoramento de contaminação de amostras
ambientais, como água, por metais.
Combinando conhecimentos
biológicos e de engenharia, os pesquisadores pretendem inserir novas funções em
organismos naturais, por meio do desenvolvimento de novas sequências genéticas.
“Existem moléculas naturais de
RNA, de proteínas, que conseguem interagir, por exemplo, com mercúrio e manganês.
A ideia é desenhar esses circuitos genéticos, principalmente de bactérias, para
monitorar a contaminação de amostras de águas por esses metais, em tempo real e
de forma menos custosa, sem a necessidade de uso de equipamentos robustos e
caros”, disse à Agência FAPESP Milca Rachel da Costa Ribeiro
Lins, professora da UFABC e coordenadora do projeto.
A área de biotecnologia é
considerada estratégica para a Espanha e tem recebido grandes investimentos da
UCM nos últimos anos, sublinharam pesquisadores espanhóis participantes do
evento.
“Os Estados Unidos continuam
sendo os líderes globais no mercado de biotecnologia. No entanto, países da
Europa, Ásia, América Central e Oriente Médio estão apresentando crescimento
muito alto. E a Espanha tem vários pontos fortes. Um deles é que há cerca de
4,5 mil empresas realizando atividades nessa área”, disse Maria Isabel de la
Riesco, professora da UCM.
As empresas de biotecnologia
empregam mais pesquisadores na Espanha do que outros setores industriais e os
salários nessa área são superiores à média nacional, sublinhou a pesquisadora.
“A Espanha tem participação de
2,46% na publicação mundial de artigos relacionados à biotecnologia e a citação
deles é 21% maior do que a média global. Aproximadamente 60% da produção
científica em biotecnologia no país é feita em colaboração internacional”,
afirmou Riesco.
Mais informações sobre a FAPESP
Week Spain em: www.fapesp.br/week/2024/spain.
Elton Alisson, de Madri
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/pesquisadores-brasileiros-desenvolvem-pele-artificial-3d-mais-parecida-com-a-humana/53421
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