Estudo com 1.500 pessoas mostra
que os ciclistas paulistanos são, em sua maioria, homens jovens e fisicamente
ativos. Pesquisadores apontam a necessidade de políticas públicas que
incentivem o uso de bicicletas por mulheres de meia-idade que moram na
periferia Entre os poucos entrevistados que declararam usar a bicicleta
como meio de transporte, apenas 13% eram do sexo feminino
(foto: Daniel Antônio/Agência FAPESP)
O uso de
bicicleta como meio de transporte na cidade de São Paulo tinha prevalência por
volta de 5% em 2015, quando um levantamento com 1.500 pessoas foi conduzido por
pesquisadores da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São
Paulo (EACH-USP). Cinco anos depois, a despeito do aumento de 67,7% dos
quilômetros de ciclovias e ciclofaixas na capital, a prevalência de ciclistas
nessa amostra não sofreu grandes alterações.
Os dados foram divulgados em
janeiro na revista científica Preventive Medicine Reports. No
artigo, os autores sugerem que, além do investimento em infraestrutura viária,
é preciso implementar políticas públicas voltadas a um público que ainda faz
pouco uso desse modal: as mulheres.
“Garantir espaço para os
ciclistas é só a primeira parte do processo. Os dados mostram que também são
necessárias políticas públicas que incentivem o uso de bicicletas. No caso de
São Paulo, as políticas precisam ser, sobretudo, voltadas para mulheres, de
meia-idade, que moram nas periferias – o perfil que segue sem ter acesso à
bicicleta”, afirma Alex Florindo,
professor da EACH-USP.
Com apoio da
FAPESP, o grupo coordenado por Florindo comparou o uso da bicicleta na cidade
em dois períodos: entre os anos de 2014 e 2015 e, depois, entre 2020 e 2021. A
partir de uma amostra de quase 1.500 pessoas, os pesquisadores identificaram um
perfil muito característico daqueles que usam a bicicleta como meio de
transporte: na maioria são homens, mais jovens, mantêm um estilo de vida ativo
– fazem atividade física como um hábito de lazer – e possuem bicicleta própria.
“Com esse estudo longitudinal,
confirmamos que, além de ser um modal pouco utilizado, homens têm mais chance
do que as mulheres de usar bicicleta na cidade de São Paulo. Entre os poucos
que declararam usá-la como meio de transporte na nossa pesquisa, apenas 13%
eram do sexo feminino”, afirma Margarethe Thaisi Garro Knebel, doutoranda da
USP e primeira autora do artigo.
“Vale destacar que um conjunto
de estudos realizados em todo o mundo mostra a importância de políticas
públicas que valorizem o uso da bicicleta. Isso porque a prática favorece a
saúde pública, a igualdade de gênero, o acesso a serviços e cria empregos. Fora
o fato de ser um modo de deslocamento energeticamente eficiente e fundamental
para descarbonizar o ar”, completa.
O artigo recentemente publicado
é fruto do projeto de doutorado de Knebel, que investigou os fatores
(individuais, sociais, demográficos e ambientais) determinantes para o uso de
bicicletas como meio de transporte em São Paulo. Os pesquisadores estão agora
finalizando a terceira etapa da coleta de dados, com informações sobre os anos
de 2023 e 2024.
E o lazer?
Em outro estudo publicado na
revista Estudos Avançados da USP, o grupo coordenado por
Florindo analisou, com base na mesma coorte, como o fato de residir nas
proximidades de ciclovias contribui para a prática de atividades físicas no
lazer. Os autores também discutem quanto essas práticas podem prevenir doenças
graves como a hipertensão arterial e o impacto para a saúde de ter espaços
disponíveis no entorno.
Vale destacar que a hipertensão
arterial é um dos tipos de doenças cardiovasculares mais prevalentes no Brasil.
Segundo dados do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para
Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), o problema atinge 26,3% da
população com 18 anos ou mais que vive nas capitais brasileiras e no Distrito
Federal.
A partir de entrevistas e de
dados de georreferenciamento, os pesquisadores constataram que morar a até um
quilometro de distância de ciclovias incentiva a mudança de hábitos para a
prática de atividades físicas no lazer.
“O ambiente nas cidades tem
forte influência na saúde e no comportamento das pessoas. Ressaltamos que, em
cidades como São Paulo, as ciclovias não são utilizadas somente para o uso da
bicicleta como transporte, mas também para práticas de exercícios físicos como
caminhadas, corridas e o próprio uso da bicicleta como lazer”, destaca Florindo
à Agência FAPESP.
O estudo aponta aumento tanto
na hipertensão (de 26,2% para 35,6%) quanto na prática de atividade física no
lazer (de 36,4% para 47,6%) entre os anos de 2014/2015 e 2020/2021. “Outra
constatação é que, embora as ciclovias sejam importantes para as práticas de
atividade física no lazer, a maioria dessas estruturas ainda está nas regiões
centrais da cidade de São Paulo”, afirma o pesquisador.
“No entanto, todo esse cenário
que apresentamos no estudo levou mais uma vez à desigualdade. Mulheres e
pessoas menos escolarizadas são os que menos têm acesso às práticas de
atividades físicas no lazer e maior prevalência de hipertensão. Isso reforça a
ideia de ampliar o acesso a espaços públicos como ciclovias nas periferias,
onde vivem pessoas de menor nível socioeconômico. As políticas públicas de
promoção desses domínios das atividades físicas precisam ser focadas nesses
aspectos”, ressalta.
O artigo A cohort study
examining individual factors influencing cycling as a transportation mode in
São Paulo, Brazil pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2211335523004266?via%3Dihub.
O artigo Ciclovias,
atividade física no lazer e hipertensão arterial: um estudo longitudinal pode
ser lido em: www.scielo.br/j/ea/a/57LLbv7L9skPBVLCvLs9vSL/?lang=pt.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/expansao-das-ciclovias-nao-aumentou-o-numero-de-ciclistas-na-capital-paulista/50772
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