Com participação
do Brazilian Clinical Research Institute (BCRI), pesquisa poderá redefinir os
protocolos terapêuticos globais para tratar pacientes com infarto agudo do
miocárdio
Os resultados da pesquisa “Myocardial Ischemia and
Transfusion (MINT)”, apresentados no congresso anual da American Heart Association
(AHA), na Filadélfia (EUA), e publicados simultaneamente no periódico
científico New England Journal of Medicine, trazem informações relevantes para
o tratamento de pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) e anemia (quando
a hemoglobina é inferior a 10 g/dL), se tornando um marco para a cardiologia global
O estudo, liderado no Brasil pelo Dr. Renato Lopes,
fundador
do Brazilian Clinical Research Institute (BCRI), e professor de medicina da
Divisão de Cardiologia da Duke University, avaliou mais de 3.500 pacientes
hospitalizados com IAM e anemia, entre 2017 e 2023. Os pacientes cujo alvo de
hemoglobina foi acima de 10g/dL (estratégia de tratamento chamada de
“transfusão sanguínea liberal”) tiveram 2,4% a menos de mortalidade
cardiovascular quando comparados com aqueles cujo alvo de hemoglobina foi ao
redor de 8g/dL (estratégia de tratamento chamada “transfusão restritiva”).
“O MINT traz evidências robustas para ajudar na tomada de
decisão em uma situação clínica importante que os médicos enfrentam todos os
dias: sobre qual estratégia de transfusão – entre a liberal e a restritiva -
como conduta de preferência para pacientes que tiveram ataque cardíaco e anemia
(com hemoglobina abaixo de 10g/dL), de forma a melhorar suas taxas de
sobrevida, reduzindo o risco de recorrência de infarto”, explica Lopes.
O ensaio clínico randomizado é o maior já realizado
com esse perfil de pacientes, e avaliou, entre 2017 e 2023, 3.506 pessoas
tratadas em 144 centros de pesquisa dos EUA, Canadá, França, Nova Zelândia e
Brasil, com o patrocínio do National Institutes of Health (NIH), agência de
pesquisas do governo estadunidense. A apresentação no congresso foi realizada
por Jeffrey Carlson, professor de medicina da Rutgers Robert Wood Johnson
Medical School que lidera o estudo com Lopes e outros médicos cientistas
internacionais.
Lopes, que também é membro do comitê executivo
global do estudo, explica que os resultados têm alto impacto na sociedade, já
que as doenças cardiovasculares são a principal causa de mortalidade na
população mundial e mais de três quartos dessas mortes ocorrem em países de
baixa e média renda, como o Brasil. “A anemia é comum entre pessoas
hospitalizadas com ataque cardíaco. Estudos anteriores sobre estratégias de
transfusão para esses pacientes produziram resultados conflitantes: por um lado
dar mais transfusões de sangue parecia aumentar a quantidade de oxigênio para o
coração e melhorar os desfechos clínicos dos doentes. Por outro lado,
administrar mais transfusões de sangue pode aumentar o risco de sobrecarga de
líquidos, insuficiência cardíaca e reações alérgicas. Essa incerteza sobre
quando e quanto se transfundir levou ao ensaio MINT, cujos resultados
certamente auxiliarão os médicos a tomarem decisões embasadas no que temos de
mais atual na literatura científica, o que caracteriza a missão do BCRI.”
Highlights do estudo
- O
ensaio clínico randomizado envolveu 3.506 participantes de 144 hospitais
nos Estados Unidos, Canadá, França, Brasil, Nova Zelândia e Austrália,
entre abril de 2017 e abril de 2023
- Os
participantes têm idade média de 72 anos; 45% são mulheres e 55% homens.
Todos tiveram episódios de ataques cardíacos e uma contagem de hemoglobina
inferior a 10 g/dL. A hemoglobina normal é 12-13
- Os
participantes foram escolhidos de forma aleatória para uma estratégia de
transfusão restritiva ou liberal. Na liberal, os glóbulos vermelhos foram
transfundidos para manter a hemoglobina igual ou superior a 10 g/dL até a
alta hospitalar ou após 30 dias. A estratégia transfusional restritiva foi
permitida apenas quando a hemoglobina era inferior a 8 g/dL, fortemente
recomendada quando a hemoglobina era inferior a 7 g/dL ou para sintomas
cardíacos não controlados com medicamentos
- Muitos
participantes também tinham outros problemas de saúde, incluindo
antecedentes de ataque cardíaco (33%), insuficiência cardíaca (30%),
diabetes (54%) e doença renal (46%)
- Os
parâmetros de avaliação do estudo foram: morte por todas as causas e/ou
ataque cardíaco recorrente durante 30 dias após a randomização do estudo.
A análise constatou que entre os participantes que fizeram transfusão
restritiva 16,9% sofreram um ataque cardíaco recorrente ou morte, e a taxa
foi de 14,5% entre os que fizeram transfusão liberal. A morte cardíaca foi
mais comum entre as pessoas tratadas com a estratégia transfusional
restritiva (5,5%) em comparação com aquelas tratadas com a estratégia
liberal (3,2%)
- A
insuficiência cardíaca e outros resultados clínicos de 30 dias foram
semelhantes com as duas estratégias sugerindo que não há risco indevido
para transfusões mais liberais
- As
conclusões indicam que a administração de transfusões de sangue para
manter o hemograma superior a 10 pode melhorar a saúde do paciente
- Sendo
o maior ensaio que avalia os limiares de transfusão em pessoas com ataque
cardíaco e anemia, os resultados podem ajudar a orientar as decisões dos
médicos que cuidam de pacientes com tais características
Entenda a relação entre o
infarto agudo do miocário e a anemia
A principal causa do infarto agudo do miocárdio é
uma obstrução de uma artéria coronária, causada por um coágulo, que interrompe
o fluxo de sangue. Com a falta de sangue, células do coração morrem, gerando
necrose. “Se há falta de sangue na região do coração, há também carência de
hemácias para garantir uma oxigenação adequada e na presença de anemia essa
situação é ainda mais grave. Por isso, a transfusão de sangue em uma estratéegia
mais liberal visando uma hemoglobina acima de 10g/dL é uma estratégia
importante que auxilia a melhor oxigenação do coração e demais órgãos levando,
de forma segura, a um melhor prognóstico do paciente”, finaliza Lopes.
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