Se houvesse apenas uma pessoa de determinada religião, ou sem nenhuma religião, em todo o mundo, seria dever de todos os outros habitantes do planeta, crentes ou não, respeitarem e defenderem a opção desse único adepto.
Embora a sociedade brasileira tenha sido outrora
conhecida mundialmente pela tolerância religiosa, quando comparada a outras
nações deflagradas por conflitos religiosos há várias décadas, nos últimos anos
os crimes contra a crença e a liberdade religiosa têm aumentado. Por isso, o
tema precisa de amplo debate para produzir consciência coletiva de que não há
liberdade em qualquer outra área da vida, se não houver liberdade de se crer na
divindade que bem se quiser, assim como de simplesmente não crer em nada.
Para garantir que todos os cidadãos possam manifestar livremente
suas crenças, assegurando a existência de diferentes credos, o poder público,
em suas várias instâncias, deve agir em diversas frentes para que todos tenham
essa prerrogativa respeitada, ainda mais depois que foi instituída no Brasil o
Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa (21 de janeiro), para
salientar o que diz a nossa Carta Magna em seu artigo 5º:
“VI - é inviolável a liberdade de
consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a
suas liturgias”.
Com dimensões continentais, o Brasil é formado da mistura de
povos, culturas, etnias e crenças, entre tantos outros elementos que constituem
a identidade do povo brasileiro, moldando-o como um grande caldeirão
multicolorido, ou como um diamante multifacetado, cujo brilho e beleza de cada
um de seus lados e ângulos é único e inigualável. Para se ter ideia da força do
fenômeno religioso e das práticas religiosas que ainda existem no país, cerca
de 88,3% da população brasileira afirma possuir alguma religião, conforme
pesquisa de 2020 do Instituto Datafolha. Por outro lado, o segmento
populacional de ateus, agnósticos e sem religião é o que mais tem crescido nos
últimos anos no Brasil, apontando para a tendência à secularização já
presenciados na Europa e nos EUA, outrora majoritariamente religiosos.
Independentemente das convicções religiosas individuais e
assegurado o direito de praticar a sua religiosidade e desenvolver ações
visando a conversão de mais adeptos à sua própria crença, há pilares comuns a
todos os credos que impõem deveres éticos compartilhados com todos, tais como o
respeito e a empatia, possíveis apenas pelo conhecimento do que se crê e
daquilo que os outros creem. Esta é inclusive a grande razão educacional para o
ensino religioso nas escolas: o de produzir consciência da necessidade de
respeito à religião, qualquer que seja, ou até mesmo à ausência da religião,
por parte de outros cidadãos.
Neste sentido, vários mestres religiosos ensinam o primado do amor
ao próximo, e para ficar naquele credo que é o fundamento histórico da parcela
maior da população brasileira, que é o cristianismo, as palavras de Jesus
Cristo ensinam a amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si
mesmo, aplicando-se à prática religiosa a regra áurea da convivência em
respeito e empatia: “tudo quanto quiserdes que os homens vos façam, fazei-o
vós, primeiro”. Ou seja, quer ter sua crença, culto, ritual e direito à
proclamação de sua fé devidamente respeitadas? Então, respeite o mesmo direito
daqueles que creem diferentemente de você e até daqueles que preferem não crer
em divindade alguma.
Tal respeito se expressa em atos concretos de se evitar a
zombaria, as notícias falsas, o incitamento ao ódio religioso e o combate à
discriminação de qualquer ordem, por razão de fé ou associada à prática
religiosa, algo que sutilmente tem substituído fogueiras e pedras outrora
usados contra adeptos de outros credos, por fanáticos que, supostamente em nome
de Deus, negam o amor como princípio básico do próprio Criador.
Além disso, resguardadas as agendas e objetivos de expansão de
cada denominação religiosa, por meio da propaganda e proclamação de suas
crenças, princípios e valores, há muitas causas comuns a todos, que exigem uma
natural e bem-vinda co-beligerância, por propugnarem valores transcendentes e
comuns a todos, tais como o amor ao próximo carente e excluído para a promoção
do desenvolvimento social. Nesse sentido, preces e mãos que se voltam para
divindades diferentes em seus cultos particulares, podem se unir solidariamente
em determinados momentos da história, para ações de cidadania e combates por
causas socioambientais comuns, sem comprometer as convicções e fidelidades
particulares à religião a que pertencem.
Afinal de contas, cada ser humano, crente ou não, é imagem do
Criador, que a todos, e a cada um, deu vida para justamente se aprender a
conviver com outros semelhantes, ainda que desiguais em suas predileções
religiosas e em tantos outros aspectos da existência.
Essa consciência deve ser nutrida e multiplicada nas instituições
sociais, desde a mais básica, como a família, até aquelas cuja capilaridade
possibilita um grande poder multiplicador e transformador, como escolas e
universidades, associações e sindicatos, partidos políticos e, obviamente,
igrejas particulares e denominações religiosas.
Neste diapasão, em todas as unidades de
educação e saúde, a Chancelaria do Mackenzie é responsável por manter um
ambiente de respeito na comunidade mackenzista, baseado nos princípios e
valores cristãos reformados, inclusive aqueles que fundamentam a liberdade de
crença e de religião, tão bem defendidos por presbiterianos desde a Reforma
Protestante do Século XVI e que se constituem na base das democracias modernas
em todo o mundo.
Robinson Grangeiro
Monteiro - Chanceler do Instituto Presbiteriano Mackenzie, doutor em
Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
e em Ministério pelo Reformed Theological Seminary (USA), mestre em Psicologia
Social pela Universidade Federal da Paraíba.
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