Para alguns, a vitória da Argentina sobre a França,
na final da Copa do Mundo de 2022, já é a maior partida da história do futebol
ou, na pior das hipóteses, o melhor jogo de Copa do Mundo da história. Apesar
de ter sido muito emocionante assistir essa partida, para dizer o mínimo, este
artigo não é sobre o jogo em si, tampouco sobre as críticas que podemos fazer
ao futebol e, principalmente, à organização que se encontra em seu comando, a
FIFA. Aqui pretendo apenas destacar algumas lições que podemos retirar do jogo
de hoje e da campanha da Argentina como um todo, as quais são aplicáveis para
muito além do futebol.
Nunca desista, porque nunca se
sabe
A Argentina entrou na Copa do Mundo deste ano como
a grande favorita, ao lado de Brasil e França. E eles tinham várias razões para
isso, a mais importante delas se resumindo a um nome: Lionel Messi.
Para alguns, “los hermanos” tiveram muita sorte em
enfrentarem a Arábia Saudita no seu primeiro jogo na competição, seleção essa
que era uma das favoritas para ser o pior time da competição. Não era uma
questão de se os argentinos iriam vencer aquele jogo, mas sim por quanto.
Os sauditas, porém, tinham planos diferentes. Numa
das grandes zebras da história das Copas do Mundo, a Arábia Saudita venceu a
Argentina por 2x1. Naquele momento, muitas pessoas começaram a descartar os
argentinos como possíveis campeões, principalmente porque no jogo seguinte,
contra México, eles poderiam já ser eliminados.
E cá estão “los hermanos”, tricampeões do mundo.
Mas como o futebol e os esportes são cheios de
histórias do tipo “nunca desista”, vamos citar mais dois exemplos, ambos do
jogo da final.
Perto dos 80 minutos de jogo, a França estava
perdendo por 2x0, sendo muito improvável que pudessem vir a causar alguma dor
de cabeça para a Argentina, principalmente porque, vamos ser francos, os
franceses estavam “tomando uma surra”, mal tendo oferecido algum perigo ao
goleirão Emilíano Martinez.
Então, a jovem estrela francesa Kylian Mbappé
marcou duas vezes, em menos de dois minutos.
Algo parecido aconteceu na prorrogação. Messi
marcou o terceiro gol da Argentina e, faltando apenas três minutos para o apito
final, Kylian Mbappé repetiu a proeza e empatou o jogo.
A Argentina parecia fadada a perder o jogo, mas
graças ao seu goleiro, que fez uma defesa inacreditável numa das últimas
jogadas da prorrogação, evitando o quarto gol francês, "los hermanos"
sobreviveram e levaram o jogo para os pênaltis.
Voltemos alguns minutos, porque precisamos falar do
jogador argentino Gonzalo Montiel. Afinal, foi ele quem cometeu o pênalti que
resultou no terceiro gol da França e de Mbappé, próximo ao final da
prorrogação, aparentemente colocando um fim no sonho de Messi de finalmente
vencer uma Copa do Mundo.
Porém o destino é algo estranho, sobretudo quando
se trata de futebol: foi o próprio Gonzalo Montiel quem bateu o pênalti que deu
o título para a Argentina e para Lionel Messi o troféu que lhe faltava.
O poder da sorte
Para eu não me estender, vamos apenas dizer que
sorte tem um papel em praticamente tudo nas nossas vidas, ao contrário do que
defendem alguns entusiastas da meritocracia, e isso não é diferente quando o
assunto é futebol.
Como comentei acima, a Argentina poderia ter sido
eliminada em vários jogos antes da final. Por exemplo, a Austrália, nas oitavas
de final, quase marcou um gol no final do jogo que poderia ter dado um destino
bem diferente aos argentinos; algo similar ao jogo de hoje aconteceu na partida
deles contra a Holanda, o que também poderia ter resultado em eliminação.
Se não fosse aquela baita defesa de Martinez no fim
da prorrogação, o destino da Argentina também poderia ter sido diferente, com a
França levantando o troféu mais importante do futebol pela segunda vez
consecutiva. Podemos fazer a mesma afirmação em relação à cobrança de Lionel
Messi, nos pênaltis, que por pouco não foi defendida por Hugo Lloris, o que
poderia dar outro final para essa história.
Devemos parar de celebrar
apenas os vencedores
A maioria das culturas tende a idolatrar os
vencedores e a esquecer dos perdedores, mas o jogo da final nos deu uma lição
sobre isso, de que esse jeito de pensar é simplesmente errado.
Como acabamos de ver, muitas coisas aconteceram,
algumas das quais por pura sorte, que resultaram no título da Argentina. A
França poderia ter vencido a partida da mesma maneira. Na verdade, a França
poderia ter inclusive enfrentado outro adversário na final, como o Brasil, que
foi eliminado de uma forma bastante inesperada e provavelmente "venderia
caro" uma eventual eliminação para a Argentina na semifinal.
Se ignorarmos tudo isso e continuarmos a nos
esquecer dos perdedores, poderemos cometer algumas injustiças, como não nos
lembrarmos do jogo mágico de Mbappé que, com apenas 23 anos, foi o artilheiro
da Copa, com oito gols, três dos quais na final, o que é simplesmente
inacreditável, surreal. Ele é um dos poucos que conseguiram marcar gol em duas
finais de Copa diferentes e apenas o segundo que fez um hat trick
numa decisão da competição.
Talvez a injustiça mais triste de todas que
cometeríamos aconteceria se a França acabasse vencendo a Copa e Messi
terminasse a carreira sem esse troféu, o que não ocorreu por pouco.
Todos nos lembramos quão criticado Messi tem sido,
desde que se tornou o melhor jogador de sua geração, por não vencer uma Copa do
Mundo, principalmente após a derrota da Argentina para a Alemanha na final de
2014. Após, Messi inclusive afirmou que não jogaria mais pela seleção
argentina.
Quão injusto teria sido a França vencer o jogo de
hoje, Messi continuar sem um troféu de Copa do Mundo e, apesar dos seus dois
gols na final e de ter sido o melhor jogador do torneio, simplesmente nos
esquecermos do que ele fez por sua seleção?
Isso não importa, porque uma vez mais podemos adiar
esse tipo de pergunta e nos esquecer dos "perdedores", apesar do fato
de que graças a eles pudemos ter muita diversão na final da Copa do Mundo de
2022.
Rodrigo Cunha Ribas - advogado
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