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terça-feira, 5 de outubro de 2021

Jovens adultos com Duchenne querem mais da vida

Como driblar a evolução de uma doença rara que causa degeneração progressiva com cuidado integral para garantir a qualidade de vida


O crescimento de bebês e crianças apresenta características muito parecidas que marcam estágios comuns às respectivas fases da infância, relativas ao desenvolvimento neuromotor. De maneira geral, movimentos como a primeira vez em que o bebê se vira sozinho, quando começa a engatinhar e a dar os primeiros passos costumam acontecer em idades semelhantes entre crianças que não apresentam nenhuma doença que afete esse processo. Quando pais ou responsáveis chegam ao consultório apontando algum tipo de atraso ou falhas na execução desses movimentos, automaticamente se instala um sinal de alerta para nós, médicos, que devemos iniciar uma maratona de investigação até chegar a um diagnóstico preciso.

E se encontramos alguma doença rara como a causa de possíveis disfunções, o tempo se torna o nosso maior oponente, afinal, quanto mais cedo a doença for diagnosticada, mais rápido podemos iniciar intervenções e cuidados para amenizar ou desacelerar possíveis progressões.

O diagnóstico de doenças raras, como a distrofia muscular de Duchenne (DMD), geralmente acontece tardiamente. As razões deste atraso podem ser a pouca importância dada pelos profissionais quanto às queixas dos familiares aos primeiros sinais, a falta de encaminhamento para o especialista correto, ou até mesmo a dificuldade no acesso aos exames de triagem. De acordo com informações dos próprios familiares, existem muitas barreiras para o reconhecimento de casos suspeitos.¹ Como profissionais da saúde, não podemos acreditar na crença de que "esse menino é preguiçoso para levantar ou andar" ou qualquer coisa do gênero, que tente dissuadir uma possível complicação motora nos primeiros anos de vida.

A DMD é uma doença genética, degenerativa e rara, que se manifesta na infância, ocasionando fraqueza muscular progressiva e incapacitante. Cerca de 30% dos pacientes podem apresentar comprometimento cognitivo. Apesar de apresentar sintomas semelhantes aos de muitas outras enfermidades, alguns são bastante característicos. A doença afeta principalmente meninos, em uma proporção de 1 para cada 3.600 a 6.000 nascidos vivos, o que identifica uma prevalência relativamente alta entre as doenças consideradas raras. Entre as distrofias musculares, a de Duchenne é considerada a mais frequente na infância e uma das mais conhecidas, graças aos sinais e sintomas característicos e ao curso clínico já bem definido.²

Mas, para acelerar a jornada ao diagnóstico, é preciso ampliar o conhecimento de profissionais de saúde e da sociedade sobre a DMD. Por isso, 7 de setembro marcou também o dia mundial da conscientização de Duchenne. É importante chamarmos atenção para o fato de que somente o tratamento multidisciplinar aliado novas opções de manejo que têm surgido, são capazes de retardar a progressão da doença. Essas medidas são fundamentais para aumentar a expectativa e, principalmente, melhorar a qualidade de vida dos pacientes.³

Para assistir adequadamente um paciente de DMD, além do pediatra, são requeridos médicos de diferentes especialidades, como neurologistas, pneumologistas, cardiologistas, ortopedistas, gastroenterologistas e endocrinologistas. Sem contar o imprescindível suporte de outros profissionais da saúde, como fisioterapeutas especializados em reabilitação motora e respiratória, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e nutricionistas. Cada um deles terá papel fundamental para orquestrar a assistência à saúde.

Essa abordagem interdisciplinar é a chave para garantir que os diagnosticados com DMD sejam bem-sucedidos em suas jornadas individuais como pacientes e consigam se desenvolver em outras áreas de suas vidas. São crianças, adolescentes e adultos que podem e devem buscar êxito em todos os seus processos.


É preciso que a sociedade em geral esteja atenta para garantir que todos os raros tenham a oportunidade de viver muito mais e com muita qualidade de vida.




Ana Lúcia Langer - pediatra e membro do conselho deliberativo e do comitê técnico da Aliança Distrofia Brasil (ADB).

 


Referências:

¹. Prufer De Queiroz A, Araújo C, Castro De Deco M, De Sá Klôh B, Rangel Da Costa M, Veiga De Góis F, et al. Diagnosis delay of Duchenne Muscular Dystrophy. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2004;4(2):179-83.
².Bushby K, Finkel R, Birnkrant DJ, Case LE, Clemens PR, Cripe L, et al. Diagnosis and management of Duchenne muscular dystrophy, part 1: diagnosis, and pharmacological and psychosocial management. Lancet Neurol. 2010 Jan 1;9(1):77-93.
³. Araujo APQC, De Carvalho AAS, Cavalcan EBU, Saute JAM, Carvalho E, França Junior MC, et al. Consenso brasileiro sobre distrofia muscular de duchenne. Parte 1 diagnóstico, corcoterapia e perspectivas. Vol. 75, Arquivos de Neuro-Psiquiatria. Associação Arquivos de Neuro-Psiquiatria; 2017. p. 104-17.


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