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Transtorno afeta crianças, adolescentes e adultos, mas ainda é cercado por estigmas, diagnósticos tardios e desinformação
Cada vez mais presente nas conversas do dia a dia e até mesmo nas
redes sociais, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) ainda
é cercado por desinformações, preconceitos e diagnósticos equivocados. O que
muitos ainda tratam como uma fase, preguiça ou traço de personalidade é, na verdade, um transtorno do neurodesenvolvimento
que pode afetar profundamente a vida de crianças, adolescentes e adultos quando
não identificado e acompanhado de forma adequada.
“O TDAH é uma condição com base biológica e genética, que afeta a
capacidade de manter o foco, de regular os impulsos e, em alguns casos, de
conter a hiperatividade. Não é falta de educação, nem falta de esforço. É um
cérebro que funciona de forma diferente”, explica a psiquiatra Carla Vieira, do
CAPS Infantojuvenil M’Boi Mirim, unidade gerenciada pelo CEJAM (Centro de
Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”), em parceria com a Secretaria Municipal
da Saúde (SMS-SP).
Segundo a especialista, os sintomas costumam surgir ainda nos
primeiros anos de vida e acompanhar o indivíduo em diversas fases. Na infância,
são mais visíveis sinais como agitação, impulsividade e dificuldades escolares.
Na adolescência, a hiperatividade tende a se tornar mais interna, e problemas
de organização e impulsividade nas decisões ganham espaço. Já na vida adulta, o
que predomina é a desatenção, desorganização e a dificuldade em manter uma rotina funcional.
“Muitos adultos que atendo só percebem que têm TDAH depois que os
filhos são diagnosticados. Eles começam a se identificar com os sintomas e
entendem que a vida inteira lutaram contra algo que nunca souberam nomear.”
Mesmo com todos esses sinais, o diagnóstico pode passar
despercebido por anos. Em especial no caso das mulheres, que muitas vezes
apresentam o tipo predominantemente desatento, sem a agitação que costuma
chamar atenção. “Essas meninas acabam sendo rotuladas como distraídas,
sonhadoras, desorganizadas. E crescem tentando se adaptar, sem saber que há um
motivo para suas dificuldades”, afirma a psiquiatra.
O diagnóstico do TDAH é clínico, feito com base em entrevistas
detalhadas, uso de escalas validadas e exclusão de outras causas para os
sintomas. Apesar de os conteúdos nas redes sociais contribuírem para aumentar a
conscientização, Carla alerta para os riscos do autodiagnóstico.
“Identificar-se com um vídeo não é o mesmo que ter TDAH. A avaliação precisa
ser feita por um profissional capacitado, que leve em conta a frequência, a
intensidade e o impacto real dos sintomas na vida da pessoa.”
De acordo com a médica, os impactos do transtorno vão além da
atenção ou da agitação. O TDAH pode comprometer a saúde emocional e física do
paciente, levando à baixa autoestima, ansiedade, depressão, distúrbios do sono
e até comportamentos de risco. Além disso, costuma coexistir com outras
condições, como transtornos de aprendizagem, uso de substâncias e dificuldades
de relacionamento.
O tratamento, quando necessário, é individualizado e pode envolver
diferentes abordagens. Medicamentos estimulantes são amplamente utilizados, mas
não são a única via. “A terapia cognitivo-comportamental, as mudanças de estilo
de vida e a psicoeducação são pilares fundamentais. O tratamento não é uma
receita única. Ele precisa ser ajustado à realidade de cada paciente”, explica .
Para a psiquiatra, o maior obstáculo ainda é a falta de acesso ao
diagnóstico e tratamento adequado. Ela ressalta a importância de investir na
formação de profissionais e no fortalecimento da conexão entre saúde e
educação. “Ainda vemos muitas crianças sendo rotuladas como ‘difíceis’ na
escola, sem receber o suporte necessário. Precisamos capacitar professores,
estruturar planos de ensino individualizados e criar pontes entre as equipes
pedagógicas e os profissionais de saúde.”
Outro desafio, segundo ela, é o combate ao preconceito. “Ouço
muito no consultório que TDAH é desculpa, que é invenção da indústria
farmacêutica, que é falta de esforço. Isso machuca e atrasa o tratamento.
Precisamos entender que não se trata de falta de vontade, e sim de uma condição
legítima, reconhecida pelas principais entidades de saúde do mundo.”
A médica reforça que, com o diagnóstico correto, acompanhamento apropriado e empatia, é possível garantir mais qualidade de vida e autonomia para quem convive com o transtorno. “O TDAH não define uma pessoa, mas compreender como ele funciona pode mudar completamente sua trajetória. A informação é o primeiro passo para isso.”
CEJAM - Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”
@cejamoficial

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