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| Pesquisadores fizeram um levantamento que chegou a 312 estudos publicados sobre o risco de transmissão para 39 patógenos e doenças (imagem: Biodiversity4all) |
Síntese de trabalhos publicados sobre risco de doenças emergentes aponta que apenas 7,4% incluem simultaneamente perigo, exposição e vulnerabilidade às infecções. Os três componentes são essenciais para uma avaliação confiável e precisa do risco de ocorrência dessas moléstias em um contexto de mudanças ambientais
Estudo publicado na revista One Earth aponta
que as avaliações de risco para doenças transmitidas por animais infectados
(zoonóticas) e por vetores (como mosquitos) precisam ser unificadas e
integradas. Ações nesse sentido poderiam ajudar a prevenir essas moléstias,
cuja ocorrência tende a aumentar por causa das mudanças climáticas.
O trabalho foi liderado por
pesquisadores do Núcleo de Análise e Síntese de Soluções Baseadas na Natureza (BIOTA Síntese),
apoiado pela FAPESP no âmbito dos Centros de Ciência para o Desenvolvimento (CCDs).
Sediado no Instituto de Estudos
Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), o centro conta ainda com pesquisadores da Secretaria
de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado de São Paulo (Semil) e de outras
universidades e organizações do terceiro setor.
Os pesquisadores fizeram um
levantamento que chegou a 312 estudos publicados sobre o risco de transmissão
para 39 patógenos e doenças. Apenas 7,4% dos estudos incluem os três
componentes de risco, que são perigo, exposição e vulnerabilidade.
“Não há uma padronização nos
estudos realizados. O risco de transmissão de uma mesma doença, por exemplo,
pode ser avaliado apenas com base na abundância de mosquitos vetores em um
estudo, enquanto outro leva em conta a exposição humana a esses organismos.
Essa falta de uniformidade compromete a produção de modelos confiáveis e precisos,
que poderiam orientar políticas públicas voltadas à identificação precoce de
áreas de risco”, ilustra Raquel Carvalho,
primeira autora do estudo, realizado durante pós-doutorado com bolsa da
FAPESP no IEA-USP.
O artigo apresenta
recomendações para estruturar esse campo de pesquisa, em rápida expansão, no
contexto das mudanças ambientais. As orientações destacam a necessidade de
maior atenção à exposição e à vulnerabilidade, com a definição de indicadores
específicos para cada uma. Recomenda também o redirecionamento dos
financiamentos internacionais de pesquisa e o fortalecimento da cooperação
internacional, a fim de apoiar os esforços científicos voltados às doenças
zoonóticas e transmitidas por vetores em regiões tropicais.
Para o trabalho, Carvalho
realizou ainda estágio na Universidade de Glasgow, na Escócia.
Atualmente, é professora no Departamento de Zoologia do Instituto de
Biociências (IB-USP) e pesquisadora associada ao BIOTA Síntese.
Os resultados do estudo foram
propostos ainda ao Plano Estadual de Adaptação e Resiliência Climática (PEARC), instrumento que visa estruturar, coordenar e
articular a atuação do Estado de São Paulo no enfrentamento dos impactos das
mudanças climáticas.
Plano
estadual
Nas contribuições ao PEARC, os
autores do BIOTA Síntese diferenciam os componentes perigo, exposição e
vulnerabilidade às doenças zoonóticas e transmitidas por vetores.
Segundo o documento, que segue as
definições usadas no estudo, perigo de infecção ocorre por causa da “presença
e/ou abundância de hospedeiros zoonóticos, vetores e reservatórios”. Além
disso, leva em conta “presença e/ou prevalência de infecção por patógenos em um
determinado espaço e tempo, representando uma ameaça potencial para os
humanos”.
Por sua vez, “exposição” é a
“probabilidade de contato humano com perigo, determinada pelo tipo, frequência
e probabilidade de comportamentos, atividades e outras variáveis relacionadas
que modulam o contato com o perigo e podem resultar em infecção por um patógeno
zoonótico ou transmitido por vetores”.
Finalmente, “vulnerabilidade” é a “probabilidade de infecção humana, considerando a chance de uma pessoa ou um grupo de pessoas, em um determinado espaço e tempo, serem infectados por um patógeno zoonótico ou transmitido por vetores após a exposição ao perigo”.

Omissão de componentes relevantes pode gerar estimativas
imprecisas, resultando na definição de áreas prioritárias irrelevantes
(gráfico: Carvalho et al.)
“Não existe um componente mais
importante do que o outro. É a intersecção entre eles que representa o risco
geral. Por isso, para estimar adequadamente as áreas de risco, é preciso
considerar todos, o que raramente ocorre de forma simultânea nos estudos que
realizam esse tipo de avaliação”, explica Carvalho.
Para os autores, a omissão de
componentes relevantes pode gerar estimativas imprecisas ou equivocadas,
resultando em um planejamento espacial inadequado, como a definição de áreas
prioritárias irrelevantes, além de má alocação de recursos e esforços de
gestão, o que prolonga a exposição de populações vulneráveis a riscos
evitáveis.
Locais com grande densidade
populacional humana e muitos casos de dengue, por exemplo, precisariam de mais
campanhas de conscientização para evitar a reprodução do mosquito Aedes
aegypti e a aplicação de inseticida, por exemplo.
Da mesma forma, é preciso
considerar que a simples presença de um patógeno no ambiente não
necessariamente significa um alto risco. A presença do hantavírus em roedores
silvestres, por exemplo, pode representar um risco menor em áreas rurais, pois
a exposição humana aos animais infectados é menos frequente.
Medidas
práticas
Na seção que se refere às
doenças zoonóticas e transmitidas por vetores das recomendações ao PEARC
realizada pelo BIOTA Síntese, além da estruturação de uma avaliação de risco
unificada e integrada para essas moléstias, o time de gestores e pesquisadores
trata ainda de uma série de medidas a serem aplicadas.
Uma delas é o aprimoramento da
avaliação de impacto sobre zoonoses de empreendimentos como condomínios, que
atualmente considera apenas a febre maculosa. Outra recomendação visa aprimorar
a rede laboratorial para diagnóstico e vigilância ativa em fauna silvestre,
além da comunicação, a fim de otimizar o acesso e a disponibilização de
informações.
Por fim, os pesquisadores e
gestores afirmam a necessidade de fortalecer a racionalidade e a eficiência da
distribuição de água. Segundo os autores, há diversas evidências científicas
que relacionam doenças transmitidas por vetores, como a dengue, à falta de
segurança hídrica.
O artigo Unpacking the
risks of zoonotic and vector-borne pathogen transmission to humans in the
context of environmental change pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2590332225001745.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/estudo-recomenda-avaliacao-de-risco-integrada-para-doencas-zoonoticas-e-transmitidas-por-vetores/55420

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