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sábado, 14 de dezembro de 2024

“Dezembrite”, “Síndrome de final de ano”: por que há pessoas que sofrem com as festas de final de ano?

Psicanalista Tássia Borges apontas as principais causas da angústia e aponta caminhos para passar por este período com mais leveza

 

O final do ano parece ser profundamente angustiante para algumas pessoas. Compromissos familiares e do trabalho, consumismo e “obrigação de estar feliz” são as causas mais citadas pelos que sofrem neste período do ano. 

A psicanalista Tássia Borges explica que é preciso entender o que está por trás do sofrimento e, por meio de um diálogo interno, encontrar formas de tornar o período de festas mais leve. 

 

Sobre as reuniões familiares 

É comum que os compromissos sociais se intensifiquem no final de cada ano. E, claro, em muitos deles nem sempre as pessoas se sentem pertencentes ou devidamente acolhidas pelas mais variadas razões. 

 

No caso da família, o peso pode ser ainda maior. “Existe uma convenção social que diz que a família precisa se reunir no Natal. E muitas pessoas comparecem a estes encontros mesmo sem querer com medo de desagradar”, contextualiza Tássia. “Na verdade, há uma fantasia em torno disso, ou seja, a pessoa acha que só se anulando é que contará com o amor dos demais membros. E nem sempre isso é o que realmente vai acontecer em decorrência de uma eventual ausência”. 

 

A psicanalista afirma que é possível flexibilizar as coisas, buscar caminhos menos sofridos. “O primeiro passo é refletir o que é família. É o núcleo mais próximo? Ou envolve os parentes de segundo ou terceiro graus? São os amigos? Há novas configurações familiares que precisam ser validadas”.

 

Depois, é preciso fazer acordos consigo mesmo. Há outras opções além do “ir ou não ir”. “É preciso olhar para o contexto e para os próprios sentimentos. É possível conviver sem se anular, não protagonizar a família 100% do tempo ou evitar os conflitos e familiares mais tóxicos impondo limites de maneira clara. A chave é se ouvir”. 


 

Consumismo desenfreado e obrigação de estar feliz


Nesta época do ano, outra imposição social e cultural – reforçada pela mídia – é a de consumir: comprar presentes, fazer viagens, lotar as mesas de comidas e bebidas e apresentar-se bem (preferencialmente com roupas novas). 

 

No entanto, nem todo mundo tem esta possibilidade e pode até fazer mais do que consegue – endividando-se, por exemplo – para atender a eventuais cobranças e igualar-se aos demais. “Muitas vezes, a gente acaba se desconectando de nós mesmos, dos nossos princípios, valores, e isso nos coloca, inclusive, num conflito”, aponta Tássia.

 

O mesmo vale para a “ditadura da felicidade”. Numa época como o Natal, por exemplo, há pessoas que estão passando por um luto em decorrência de alguma perda – sendo, talvez, a mais sentida a de uma pessoa querida que costumava participar destas celebrações. 

 

“Embora o luto seja um processo, quando falamos da saudade de uma pessoa que se foi, é possível transformá-la num tributo: retomar alguma tradição que a pessoa gostava ou algo que relembre um bom momento com ela. Assim, estas boas memórias podem amenizar a dor da perda”, diz a psicanalista. 

 


Frustração pelas metas não atingidas


E na virada do ano, há quem sofra e se lamente por não ter cumprido as metas que traçou para si no decorrer do ano. Tássia adverte: “Eu volto a falar de uma outra ditadura, que é a do extraordinário. Há pessoas que criam para si mesmas metas que impactem. Não querem aumentar sua remuneração, mas sim, serem milionárias. Não querem iniciar uma atividade física para melhorar a sua saúde, mas sim, virarem atletas de alta performance. Tudo isso dificulta o atingimento de uma meta porque elas nem sempre condizem com a realidade interna ou com o que é possível fazer considerando o contexto externo”.

 

Uma recomendação da especialista, além de definir metas reais, é combater o pensamento mágico de que, no dia 1º de janeiro, tudo vai se transformar. “O ano muda no calendário, mas, de um dia para o outro, o mais comum é que a vida permaneça a mesma. A grande transformação acontece quando adotamos um olhar realista, sincero e gentil para nós mesmos e entramos em contato com os nossos desejos”.

  

Tássia Borges - especialista em assuntos relacionados à saúde mental e o psiquismo – entre eles ansiedade, narcisismo, questões geracionais, de relacionamento, luto, solidão e entraves psíquicos que podem impedir atletas de atingir altas performances. Mestre em Psicologia Clínica pelo Núcleo de Método Psicanalítico e Formações da Cultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Bacharel em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), ela trabalha com educação e linguagem há mais de 20 anos. Fundou e dirige o Instituto Kleiniano de Psicanálise, cuja missão é compartilhar de modo responsável e especializado os conhecimentos técnico-teóricos da psicanalista austríaca Melanie Klein (1882-1960) bem como de autores que dialogam com seu pensamento. Há quase 15 anos, Tássia atua como psicanalista, supervisora e professora não só no IKP, mas em diversas outras escolas de psicanálise em São Paulo e outros estados. Possui formação em psicanálise freudiana e conhecimento das escolas inglesa e francesa. É coordenadora de Psicanálise do GEPECH – Grupo de Estudos e Pesquisa em Comportamento Humano – que tem por objetivo desenvolver conhecimento e pesquisa a partir de estudos transdisciplinares envolvendo neurociência e psicanálise, sobretudo neo-kleiniana.



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