A Lei nº 8.245/1991, que regulamenta contratos de locações de imóveis urbanos, prevê, atualmente, que o indexador do aluguel será definido pelas partes, sendo a praxe do mercado a adoção do Índice Geral de Preços e Mercado (IGP-M). Entretanto, a elevação do IGP-M, que acumulou alta de 31,1% em março de 2021, fez com que a Câmara dos Deputados aprovasse, no dia 07 de março de 2021, em regime de urgência, o Projeto de Lei (PL) nº 1.026/2021 que estabelece como limite para o reajuste destes contratos à inflação oficial do País, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Vale o registro de que o IPCA é calculado pela
variação de preços de produtos ao consumidor final, por meio da análise de 400
produtos e serviços do varejo consumidos por famílias com renda mensal entre um
e 40 salários-mínimos, de 13 capitais do país. Já o IGP-M é composto pelo
resultado de três outros índices, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), o
Índice de Preços por Atacado (IPA) e o Índice Nacional do Custo de Construção
(INCC), sendo diretamente influenciado pela variável do dólar e as
commodities.
No que pese as críticas ao Projeto pela intervenção
do Estado nas relações privadas por aparente afronta à Lei da Liberdade
Econômica, a proposta tem alicerce na função social, esculpida pela
Constituição Federal e Código Civil que, além de resguardar os interesses
individuais, estabelece seu contorno de exercício no interesse social.
Portanto, frente a distorção causada pelo aumento súbito do IGP-M, provocada
principalmente pelo desdobramento dos efeitos da pandemia da Covid-19, a
determinação legal para fixação de índice que represente a recomposição de
preço é medida adequada e desejada, em especial para salvaguardar o interesse
da parte usualmente frágil na relação: o locatário.
É importante ressaltar que o Projeto não veda a
cobrança de reajuste superior ao índice, mas condiciona a sua aplicação à
concordância do locatário. Assim, apesar da limitação imposta, a liberdade
contratual encontra-se resguardada, na medida em que a norma promove maior
diálogo entre locatário e locador no momento da aplicação do reajuste, a luz da
boa-fé contratual, além das demais condições do contrato (preço, período, etc.)
restarem intactas. Ademais, a função do índice de reajuste no contrato de
locação é recompor o valor da moeda no tempo e não propiciar ao locador
rentabilidade equivalente a um investimento de risco elevado, como o propiciado
pela elevação do IGP-M.
De outra sorte, o ordenamento jurídico possui
diversas hipóteses em que o Estado, com o intuito de regular e evitar excessos,
prevê a limitação da liberdade de contratação entre particulares, com o intuito
de garantir o bem-estar social e a dignidade humana. A exemplo, registra-se que
a desvalorização do real, em 1999, provocou a judicialização para rever os
contratos indexados com base na variação cambial do dólar, o que resultou na
edição de norma que veda referida prática (Lei 10.192/01). Dentre outros
exemplos, destaca-se a limitação de juros (Código Civil e Lei de Usura) e a
limitação de cobrança de juros moratórios e multa (Código de Defesa do
Consumidor).
Portanto, fica evidente que o Projeto estabelece
parâmetro determinado de reajuste que objetiva restabelecer a igualdade entre
as partes, além de evitar a sobrecarga de processos judiciais e propiciar maior
segurança jurídica com parâmetros definidos, frente a um judiciário abarrotado
e com decisões díspares.
Caroline Cavet - advogada, sócia fundadora da Caroline Cavet Advocacia, é presidente da Comissão de Juizados Especiais da OAB/PR, vogal da Junta Comercial do Paraná e professora da Pós-Graduação em Direito Imobiliário da Universidade Positivo.
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