A Câmara dos deputados
pode votar a qualquer momento o Projeto de Lei que cria a Lei Geral do
Licenciamento Ambiental (PL 3729/04). A votação, em regime de urgência, é mais
um desserviço para o país. A norma, que afeta drasticamente a vida de todos os
brasileiros, não pode ser votada sem transparência e participação da sociedade,
principalmente num momento tão conturbado, de instabilidade política e
socioeconômica como a que o país enfrenta.
Desde junho do ano
passado, o Ministério do Meio Ambiente tem conduzido uma negociação em torno de
um Projeto de Lei que permita resolver os problemas decorrentes da falta de
estrutura dos órgãos ambientais, do excesso de burocracia e da precariedade
técnica dos projetos submetidos à análise ambiental e que, fundamentalmente,
não traga retrocessos à legislação ambiental brasileira.
As negociações envolveram
deputados federais das Frentes Parlamentares Ambientalista e do Agronegócio,
ministérios, representantes dos setores produtivos, de infraestrutura,
organizações ambientalistas, associações nacionais de municípios, de órgãos
estaduais e do Ministério Público.
A versão do dia 4 de abril
da minuta elaborada pelo Ibama, com a contribuição de todos esses setores, foi
considerada um texto equilibrado e de consenso. Essa versão define regras
gerais sobre o rito e a forma dos processos de licenciamento, envolvendo, com
base nas competências, os entes da Federação e o Sistema Nacional de Meio
Ambiente (SISNAMA). Também fixa prazos e inova ao incluir a Avaliação Ambiental
Estratégica e mecanismos de transparência. Embora contemple dispensa de
licenciamento ambiental às atividades agrossilvopastoris, vincula a provável
dispensa ao cumprimento de outras Leis e instrumentos vigentes, como a Lei da
Mata Atlântica, o Código Florestal e o Cadastro Ambiental Rural (CAR).
Fruto de negociação, essa
versão evita graves retrocessos e judicializações, minimiza pressões setoriais
e, apesar de não ser o texto ideal, por fazer concessões, deveria ser enviada
para votação na Câmara Federal na forma de um novo substitutivo, com regime de
urgência. A votação dessa proposta, porém, depende do amplo acordo costurado
pelo Ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, com os deputados federais
relatores do Projeto de Lei 3729/2004 – Ricardo Tripoli (PSDB-SP), pela
Comissão de Meio Ambiente, e Mauro Pereira (PMDB/RS), pela Comissão de Finanças
e Tributação.
Esse acordo evitaria
também a tramitação de diferentes projetos sobre o mesmo tema no Senado, que
buscam flexibilizar ainda mais o processo de licenciamento ambiental. Porém,
uma “proposta-bomba”, apresentada na última semana ao Ministério do Meio
Ambiente por representantes do velho agronegócio e da velha indústria – e que
não condiz com os representantes mais modernos desses setores, que concordam
com a versão até então negociada –, inviabilizou o acordo.
O texto unilateral
apresentado dispensa diversas atividades do licenciamento ambiental, como
mineração e grandes obras de duplicação de rodovias, energia, sistemas de
saneamento, transformando o projeto de lei em uma lei de liberação, à exemplo
do que ocorreu com o novo Código Florestal que trata pouco das florestas e mais
parece um código rural. Além disso, fere princípios Constitucionais e
prerrogativas da União.
Diante desse contexto, a
Fundação SOS Mata Atlântica reitera seu posicionamento de que o licenciamento
ambiental é um instrumento estratégico de planejamento. Garante à sociedade a
transparência e a participação na tomada de decisões para obras,
empreendimentos ou atividades econômicas que visem ser implementadas ou
regularizadas no país, bem como a conservação de patrimônios naturais, da
biodiversidade e de ecossistemas essenciais para a regulação da água e do clima.
Portanto, a ameaça de
votação de um texto unilateral, desconhecido da sociedade, deve ser repudiada.
É fundamental que o Governo Federal se posicione em defesa da proposta de
consenso que vinha sendo construída no Ministério do Meio Ambiente, reafirmando
os compromissos internacionais que assumiu perante o Acordo de Paris sobre
Mudanças do Clima e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
Flexibilizar o
licenciamento ambiental para favorecer setores pontuais traz enormes prejuízos
à sociedade e ao ambiente no Brasil e acaba com a oportunidade de construir uma
proposta capaz de transformar o licenciamento ambiental em um instrumento ágil
e moderno, que equilibre desenvolvimento e sustentabilidade.
Fundação SOS Mata
Atlântica