É muito preocupante o fato de 25% dos consumidores
brasileiros admitirem aceitar a compra de produtos ilegais, conforme revelou
recente estudo da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com o Instituto
Ipsos. Em alguns segmentos, como bebidas alcoólicas e vestuário, essa propensão
é ainda maior, às vezes com trágicas consequências, como ocorreu com as pessoas
vitimadas pela presença de metanol em destilados. Trata-se de um retrato
inquietante de uma sociedade que, por vezes, relativiza a gravidade dos
ilícitos econômicos e de consumo, ignorando seus impactos coletivos.
O crime organizado há muito deixou de se restringir
ao tráfico de drogas e armas. Ele se infiltra em diversos mercados, inclusive
no de vestuário, aproveitando-se de brechas legais, da sonegação e da
tolerância social para expandir seus tentáculos. Produtos contrabandeados,
falsificados ou de origem duvidosa alimentam uma engrenagem criminosa que
movimenta bilhões de reais por ano e mina a competitividade das empresas que
operam dentro da legalidade.
Segundo relatório da Confederação Nacional da
Indústria (CNI), as perdas econômicas geradas por atividades ilícitas chegaram
a R$ 453 bilhões em 2022. O valor equivalia à época a cerca de 4% do PIB
nacional, recursos que poderiam ter sido direcionados à educação, saúde,
segurança, saneamento e infraestrutura. Em outras palavras, a cada produto
ilegal comprado, há uma parcela de investimento público que deixa de chegar à
sociedade.
O combate a esse problema não se limita ao
fortalecimento do aparato policial e da fiscalização. É também um desafio
cultural e educativo. A sociedade precisa compreender que o consumo de produtos
ilegais não é uma questão inofensiva de preço, mas um ato que financia redes
criminosas, destrói empregos formais e compromete o futuro do Brasil. A
educação, nas escolas, nas famílias e nos meios de comunicação, deve mostrar de
maneira clara os danos que os mercados ilícitos provocam, não apenas na
economia, mas também nos valores éticos e morais do País.
A responsabilidade é compartilhada. O poder público
deve aprimorar políticas que reduzam o chamado “Custo Brasil” e simplifiquem o
ambiente de negócios, para que competir de modo legal não seja um fardo. As
empresas precisam seguir investindo em rastreabilidade, conformidade e
comunicação transparente com os consumidores. E nós, cidadãos, devemos entender
que cada decisão de compra é também uma escolha de sociedade: ou reforçamos a
economia formal, que gera desenvolvimento e empregos, ou fortalecemos um
sistema paralelo que corrói as bases do Estado.
O dado revelado pela pesquisa da USP é um alerta.
Enquanto parte da população continuar a ver o consumo de produtos ilegais como
algo aceitável, permaneceremos alimentando um ciclo vicioso de perda de
riqueza, desordem econômica e insegurança. Precisamos transformar a tolerância
em repúdio e a indiferença em consciência. Não existe mercado ilegal sem
consumidor complacente e, sem ética no consumo, não há desenvolvimento
sustentável possível.
Fernando Valente Pimentel -
diretor-superintendente e presidente emérito da Associação Brasileira da
Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).
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