Empresas fingem surpresa com a epidemia de transtornos mentais enquanto continuam exaurindo seus funcionários até o colapso
O colapso já começou e ninguém quer admitir. O
Brasil bateu um recorde vergonhoso: quase meio milhão de afastamentos por
transtornos mentais em 2024, um crescimento de 68% em relação ao ano anterior.
No mundo, a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima que a depressão e a
ansiedade custam 1 trilhão de dólares por ano em produtividade.
Empresas globais já sentem o impacto de um mercado
exausto, mas seguem fingindo que o problema não existe. Só que agora, a omissão
tem preço. A atualização da NR-1 exige que as empresas cuidem da saúde mental
de seus funcionários e aquelas que continuarem ignorando o óbvio pagarão com
multas, processos e equipes adoecidas.
“Transtornos mentais não são fraqueza e nem
frescura. São uma epidemia que está dilacerando a economia global. Empresas que
insistem em metas inatingíveis, jornadas insanas e assédio disfarçado de
‘cobrança saudável’ estão destruindo suas próprias bases e isso já tem
consequência real: afastamentos, demissões silenciosas, baixa produtividade e
um mercado de trabalho que opera no limite da exaustão”, afirma Ana Lisboa,
psicanalista, advogada especialista em Direito do Trabalho e fundadora da
UniAltis, a única universidade do Brasil 100% voltada para a saúde mental.
Segundo Lisboa, as empresas se acostumaram a tratar
os funcionários como máquinas e agora estão surpresas porque as peças quebraram.
“O que elas chamam de ‘falta de resiliência’ é, na verdade, um grito de
socorro. O ‘mimimi’ é um sistema que esticou tanto o limite humano que agora
paga o preço, só que a conta não chega apenas para os trabalhadores, ela chega
para os próprios negócios, uma vez que uma equipe adoecida custa dinheiro. Um
time emocionalmente esgotado, não gera lucro e um ambiente tóxico pode ser o
fim de uma grande empresa”, aponta.
A psicanalista afirma que a saúde mental dos
trabalhadores nunca foi prioridade e sempre foi um tema jogado para debaixo do
tapete, tratado como algo individual. “Agora, virou obrigação legal. As
empresas precisam provar que estão fazendo algo, ou vão sofrer penalidades. E
mais, a questão real vai além das multas: quem não olhar para isso como uma
mudança estrutural e profunda vai fracassar. Estamos falando de um modelo de
trabalho falido, e insistir nele é escolher morrer”, diz Ana Lisboa.
De acordo com a especialista, não é coincidência
que 64% dos afastamentos por transtornos mentais no Brasil sejam de mulheres.
“A mesma sociedade que cobra produtividade máxima é a que paga menos para elas.
A mesma que as sobrecarrega com trabalho doméstico, maternidade e cuidado
emocional dos outros é a que as chama de frágeis quando adoecem. A sobrecarga feminina
não é uma escolha. É uma sentença social que vem sendo cumprida em silêncio há
décadas. Agora a fatura chegou”.
A pandemia acelerou esse processo, pois as empresas
demitiram em massa, exigiram o dobro dos que ficaram e o “novo normal” não
trouxe alívio, trouxe uma rotina de trabalho ainda mais insana, onde ser
produtivo virou sinônimo de estar disponível 24h por dia. As empresas agora
fingem surpresa porque os trabalhadores simplesmente não aguentam mais. O que
elas chamam de “desengajamento” é, na verdade, uma renúncia coletiva a um
modelo que destrói e adoece.
“O burnout não é um acidente. É o resultado
previsível de um sistema que exaure os trabalhadores e depois os descarta.
Precisamos de empresas que criem ambientes emocionalmente sustentáveis, não
apenas por obrigação, mas porque sem isso, o próprio mercado entra em colapso.
Se saúde mental continuar sendo vista como um custo, então a empresa já está
falida, só não percebeu ainda”, alerta Ana Lisboa.
Para finalizar, Lisboa alerta que os números não mentem, pois, a economia global já sente o impacto do adoecimento mental. “O Brasil, agora, transformou essa pauta em uma obrigação legal e as empresas precisam escolher: evoluir ou desmoronar junto com seus funcionários. Não existe mais espaço para a omissão. O mundo do trabalho está matando as pessoas e agora, pela primeira vez, quem permitiu isso vai começar a pagar a conta”.
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