Sobrecarga de responsabilidades, expectativas culturais e desigualdades de gênero impactam a saúde mental feminina; veja caminhos possíveis para cuidar do bem-estar
A
cobrança social para que as mulheres desempenhem múltiplos papéis — como cuidar
da família, gerenciar tarefas domésticas, manter a carreira profissional e se
encaixar em padrões estéticos rígidos — impacta diretamente sua saúde mental.
Segundo a última edição da Pesquisa Vigitel, conduzida pelo Ministério da
Saúde, 12,3% dos brasileiros com mais de 18 anos são diagnosticados com
depressão. O número aumenta para 16,8% considerando apenas as pessoas do sexo
feminino, mas cai para 7,1% entre as do sexo masculino.
Com a chegada das mulheres ao mercado de trabalho, elas deixaram para trás a
dedicação exclusiva ao trabalho doméstico não remunerado e ao cuidado da
família, assumindo carreiras profissionais e ampliando sua atuação fora do lar.
No entanto, esse movimento não foi acompanhado por uma transformação proporcional
no papel dos homens, que, em sua maioria, continuaram focados no trabalho
remunerado.
Os dados divulgados pela 3ª edição do estudo Estatísticas de gênero:
indicadores sociais das mulheres no Brasil, do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), são um reflexo deste cenário. Enquanto as
mulheres dedicam cerca de 21,3 horas semanais com trabalho doméstico não
remunerado, os homens gastam apenas 11,7 horas. Como resultado, elas acumulam
uma dupla jornada, equilibrando as demandas do emprego com as tarefas
domésticas e o cuidado com os filhos.
Para Elisama Silveira, profissional da área de psicologia do AmorSaúde, muitas
mulheres se sentem pressionadas a serem perfeitas, e isso gera uma sobrecarga
emocional difícil de suportar. “Essas responsabilidades acumuladas podem
contribuir para sensações de estresse, exaustão, ansiedade, irritabilidade e
até mesmo depressão”, afirma.
As raízes da sobrecarga emocional feminina
Segundo Silveira, muito da sobrecarga emocional das mulheres é resultado de um
conjunto de fatores interligados, que vão desde expectativas sociais e
culturais até a desigualdade de gênero. “Este difícil equilíbrio entre
carreira, família e vida pessoal se tornou um desafio constante. Ao mesmo
tempo, a pressão estética e a falta de apoio na maternidade agravam ainda mais
essa situação”, explica.
A profissional destaca também que a desigualdade no mercado de trabalho tem
grande impacto neste cenário. “A diferença salarial, a dificuldade de acesso a
cargos de liderança e o preconceito de gênero afetam diretamente a autoestima e
a segurança das mulheres, contribuindo para transtornos como ansiedade,
depressão e Burnout”, afirma. Além disso, situações de violência — seja ela
emocional, física ou sexual — podem ter um impacto significativo na saúde
mental.
Isso porque, quando o assunto é o trabalho remunerado, ou seja, aquele que se
faz fora do âmbito das tarefas de casa, a dupla jornada faz com que as mulheres
sejam também as mais impactadas pela Síndrome de Burnout, visto que elas
experienciam 73% mais este problema do que os homens, de acordo com o
levantamento FEEx – FIA Employee Experience.
O peso das expectativas culturais
Para a psicóloga, as expectativas culturais moldam a forma como as mulheres se
enxergam e, muitas vezes, geram sentimentos de culpa e inadequação. “Existe uma
pressão para que sejamos bem-sucedidas em todas as áreas da vida, o que acaba
levando ao perfeccionismo e à autocrítica excessiva”, observa Silveira. A
profissional ressalta ainda que a cobrança para demonstrar empatia, paciência e
resiliência em todas as situações pode gerar uma sensação constante de não ser
suficiente.
Se no trabalho a desigualdade de gênero é um fator desgastante, em casa o
problema também se manifesta, uma vez que muitas mulheres ainda são vistas como
as principais responsáveis pelo cuidado da família. “Essa sobrecarga de
responsabilidades pode resultar em estresse crônico, isolamento social e
esgotamento físico e mental. É fundamental que as mulheres reconheçam seus
limites e saibam que não precisam dar conta de tudo sozinhas”, orienta a
psicóloga.
Quando buscar ajuda?
Os sinais de sobrecarga emocional podem variar de uma pessoa para outra, mas
alguns sintomas são comuns e devem servir de alerta. De acordo com Silveira, é
importante observar sinais como irritabilidade, choro frequente, cansaço
constante, dores de cabeça, tensão muscular, pensamentos acelerados, insônia,
isolamento social e perda de interesse em atividades antes prazerosas. “Se
esses sintomas se tornam recorrentes, é essencial buscar apoio psicológico.
Conversar com alguém de confiança ou procurar a ajuda de um profissional pode
fazer toda a diferença”, reforça a psicóloga.
Como viver mais leve
Para enfrentar a sobrecarga emocional, a profissional sugere algumas
estratégias práticas que podem ser incorporadas ao dia a dia:
Reduza a carga de trabalho não remunerado: negocie e delegue tarefas de forma
equilibrada, sem medo de pedir ajuda.
Estabeleça limites: aprender a dizer “não” é essencial para evitar o acúmulo de
responsabilidades.
Pratique o autocuidado: reserve tempo para si mesma — seja para um banho
relaxante, ouvir música, praticar yoga, meditação ou leitura.
Construa uma rede de apoio: fortaleça os vínculos com familiares, amigos e
profissionais da saúde mental.
Desafie normas de gênero: questione padrões que colocam uma carga excessiva
sobre as mulheres e permita-se reconhecer seus limites.
Busque terapia: o acompanhamento psicológico é fundamental para desenvolver o
autoconhecimento, fortalecer a autoestima e aprender a lidar com o estresse do
dia a dia.
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