Com grande acesso à internet,
muitos adolescentes e crianças estão entrando virtualmente em lugares que
jamais iriam fisicamente.
São inúmeras as notícias que mostram jovens sendo
manipulados e envolvidos, através de conversas e conteúdos da internet, a
fazerem o que provavelmente não fariam, por não terem idade para isso. Segundo
Silvia Tocci Masini, educadora, psicanalista e psicopedagoga, a pandemia
permitiu que jovens e crianças permanecessem mais tempo nas telas, em celulares
ou computadores, pois com muito tempo ocioso, devido a redução das atividades, e
os pais trabalhando, ainda que estivessem juntos na mesma casa, estavam
isolados em mundos separados. Um ano e meio depois disso, a conta da saúde
emocional e mental ainda cobra um preço alto de muitos estudantes e suas
famílias.
A especialista conta que iniciou um trabalho na Escola do
Futuro, no ano passado, focado justamente na saúde mental de crianças e jovens
que ainda sofrem com as marcas deixadas pela pandemia. “Percebemos que quando
criamos um ambiente de escuta e acolhimento, os alunos se abrem e podemos
ajudar. Isso é urgente no momento atual. Esse período de isolamento trouxe luz
sobre uma situação que já havia se iniciado. Atualmente um dos temas que mais
trago à tona é ‘Onde os jovens ficaram durante a pandemia?’. Muitos pais
estavam tranquilos por terem seus filhos em casa, na segurança do seu quarto,
mas não percebiam que eles estavam submersos na internet, vendo coisas e tendo
acesso a lugares que não têm condições de absorver”, explana.
Silvia explica que criou dentro da instituição particular
uma Escola de Pais, voltada para o Ensino Fundamental II e Médio, onde realiza
Rodas de Conversas com o objetivo de conscientizar a família, com temas como
‘Onde o seu filho anda?’. “Alguns reagem dizendo que eles necessitam de
privacidade, mas é fundamental proteger sem controlar e monitorar por onde
andam e o que estão fazendo. Para auxiliar as famílias, criamos uma rede de
apoio. Nas salas há um professor tutor e dois conselheiros, que observam os
alunos e quando necessário, essa rede de apoio é acionada, para buscar a melhor
ação, e, em muitos casos, informar a família. Não é muito difícil perceber que
um adolescente ou jovem está com problemas. Os sinais são evidentes e pode ser
na mudança de comportamento, com isolamento, uso de roupas diferentes ao
habitual - como capuz ou roupas escuras, com mangas compridas - e até na
mudança alimentar. Na Escola, quando percebemos sinais como depressão ou crise
de ansiedade, acionamos a família e encaminhamos para um profissional
especializado”, detalha.
Segundo ela, tanto o jovem como a criança necessitam de
rotina e precisam sentir-se importantes em casa, tendo a sensação de
pertencimento e, por isso, a família deve monitorar, estar presente, se
interessar pelo que fazem, trazendo-os para perto. “Os pais devem participar da
vida dos filhos, compartilhando momentos juntos, proporcionando atividades que
eles gostam e não o que os adultos preferem. Como, por exemplo, assistir a
filmes, ouvir música, praticar algum esporte, ir a shows, parques e propor
atividades diferentes. No começo o jovem pode até resistir, pois ele passa por
um momento em que está criando identidade, quer ser diferente. Com jeito e
cuidado, a família pode se aproximar; trazer amigos em casa, viajar, entre
tantas outras coisas. Os pais devem lembrar-se de como eram nessa fase e
exercitarem a empatia, para que seus filhos não se isolem. É preciso substituir
o celular de forma criativa e interativa”, alerta.
Os jovens e adolescentes necessitam ser vistos e ouvidos
e, em alguns casos, muitos dos problemas que os pais enfrentam com os filhos
são porque não estiveram atentos na infância. “É fundamental dar atenção à
criança enquanto ela é pequena, para que quando entre na adolescência, época em
que irá se desgarrar um pouco, não perder o vínculo já criado. Estar perto na
infância é plantar uma semente para a juventude”, alerta Silvia.
Para a psicanalista, a escola realiza um trabalho de
parceria com as famílias, mas os pais têm a responsabilidade total, são o
modelo e precisam estar perto, mesmo sendo trabalhoso, é um processo prazeroso.
“Por terem profissionais capacitados, as instituições de ensino, muitas vezes,
percebem os sinais primeiro e podem auxiliar no direcionamento do caminho
destes estudantes. O jovem precisa de limite para adquirir segurança, por isso,
me preocupo quando um dos pais diz que é muito amigo dos filhos. Isso é muito
bom, mas quem está fazendo o papel de pai? Esse lugar está vazio? Muitas das
frases que nos lembramos a vida toda, foram aquelas ditas pelos pais com amor.
É muito triste quando hoje no consultório pergunto a um jovem ‘por que você faz
isso', e ele me responde: ‘Ninguém nunca me parou. Ninguém nunca me disse não’.
Em alguns casos, os pais precisam primeiro ressignificar algumas questões das
suas próprias vidas, para então ajudarem os filhos. Os adultos também precisam
de autoconhecimento, pois muitas vezes a família toda está precisando de ajuda.
E é preciso agir rápido, pois as coisas acontecem de repente na vida dos jovens
e temos que estar atentos para tirá-los de alguns lugares ruins onde estão
entrando”, completa.
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