97% dos que cometeram suicídio tinham algum transtorno mental não tratado de forma adequada
10/09 é o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, marcando a campanha Setembro Amarelo, que ocorre ao longo de todo o mês com o objetivo de alertar a população sobre a realidade do suicídio e suas formas de prevenção.
O número de suicídios no Brasil cresceu 11,8% em 2022 na comparação com 2021. O levantamento faz parte do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em julho. Em 2022, foram 16.262 registros, uma média de 44 por dia. Em 2021, foram 14.475 suicídios. Em termos proporcionais, o Brasil teve 8 suicídios por 100 mil habitantes em 2022, contra 7,2 em 2021.
Segundo Monica Machado, psicóloga, fundadora da Clínica Ame.C, pós-graduada em Psicanálise e Saúde Mental pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein e apresentadora do podcast Ame.Cast; o suicídio é uma decisão baseada no desespero do indivíduo, que acaba enxergando na morte a única maneira de se libertar de uma angústia que parece infindável.
“A idealização suicida pode surgir de um sofrimento psíquico em que a pessoa não consegue mais lidar com sua própria existência. Sendo assim, o suicídio pode ser considerado como o desfecho de uma série de variáveis que se acumularam na história do indivíduo e chegaram ao limite total das suas próprias emoções”, diz Monica Machado.
Entretanto, para Danielle H. Admoni, psiquiatra geral, da Infância
e Adolescência, supervisora na residência da Universidade Federal de São Paulo
(UNIFESP/EPM) e especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP); o
ato suicida nem sempre envolve planejamento. “Em muitos casos, a pessoa pode
cometer suicídio por impulso, sem ter demonstrado previamente a intenção”.
O que leva alguém a cogitar o suicídio?
Ainda que o suicídio esteja associado a uma complexa interação de fatores psicológicos, biológicos e genéticos, bem como culturais e socioambientais, há dois aspectos que prevalecem nessa tomada de decisão.
Conforme a Associação Brasileira de Psiquiatria e o Conselho Federal de Medicina, a tentativa prévia de suicídio é um fator preditivo isolado importante. Segundo a OMS, pessoas que tentaram suicídio têm de 5 a 6 vezes mais chances de fazer novamente. Além disso, 50% daqueles que se suicidaram já haviam tentado anteriormente.
Já os transtornos mentais são citados em praticamente todos os
estudos como as principais causas do ato. A OMS estima que 97% das pessoas que
cometeram suicídio tinham algum tipo de transtorno mental, muitas vezes, não
diagnosticado, frequentemente não tratado ou não tratado de forma adequada.
Depressão, transtorno bipolar, alcoolismo, abuso/dependência de outras drogas,
transtornos de personalidade e esquizofrenia são as condições mais associadas
ao comportamento suicida.
Todos nós podemos ajudar!
O tema deste Setembro Amarelo é “Se precisar, peça ajuda”. No entanto, de acordo com Danielle Admoni, há casos em que o próprio indivíduo pode não perceber que está à beira do seu limite.
“Os sintomas podem se confundir com uma exaustão típica da vida que levamos hoje. Muitas vezes, tanto a pessoa como os outros que estão à sua volta só se dão conta da gravidade quando o indivíduo já chegou na fase da ideação suicida”, pontua a psiquiatra.
Quando falamos de alguém que está com depressão, por exemplo, o suporte de familiares e amigos é fundamental, mas muitos ainda têm dificuldade de lidar com transtornos mentais. De acordo com o “barômetro da depressão”, estudo e relatório publicado pela Fundação Alemã de Auxílio a Vítimas da Depressão (Stiftung Deutsche Depressionshilfe), 73% dos parentes de pessoas em episódios depressivos se sentiram responsáveis por não terem percebido o sofrimento antes.
Segundo o estudo, o quadro só se tornou notório quando o
comportamento daquela pessoa foi ao extremo: 84% dos pacientes se afastaram
completamente da vida social durante episódios depressivos, enquanto 72% não se
sentiram capazes de se conectar com outras pessoas. Além disso, 45% dos
acometidos pela depressão acabam deixando seus parceiros. “Daí a importância de
prestar atenção à sua volta, saber reconhecer quando alguém está passando por
um momento difícil e tentar uma abordagem empática”, frisa a psicóloga Monica
Machado.
Confira abaixo as dicas das especialistas:
Evite comentários vazios e clichês: “conselhos” com perfil de autoajuda,
frases feitas e clichês podem agravar o quadro do indivíduo. “A pessoa com
ideação suicida já está com uma visão distorcida da realidade. Dependendo do
que você disser, pode servir de munição aos seus pensamentos negativos. Na
dúvida, apenas direcione seus esforços em ouvir o que o outro tem a dizer,
sempre com atenção, empatia e acolhimento”, orienta Danielle Admoni.
Nunca minimize seu sofrimento: comparar, julgar ou questionar o
sofrimento que foi exposto só piora o emocional da pessoa. “Isso parece óbvio,
mas ainda é bem comum ouvir absurdos como ‘você está dramatizando’, ‘que
exagero’, ‘tenho mais problema que você e não estou desse jeito’, ‘como alguém
que tem tudo pode ficar assim’”, conta Monica Machado.
Jamais incentive a socialização: a última coisa que uma pessoa com sofrimento psíquico quer é sair de casa e ver gente. E pressionar só vai aumentar o estresse. Aliás, afastar-se de amigos e familiares, além de interromper as atividades que sempre lhe foram prazerosas, é um dos principais sinais de alerta.
Por outro lado, segundo Admoni, o isolamento pode agravar o estado
depressivo e servir como gatilho para o suicídio. “A melhor ajuda é nunca
deixar a pessoa sozinha, ficando com ela em casa, onde é seu espaço de
segurança. Sugira assistir a um filme ou uma série que envolva comédias leves e
que não remeta à temas sobre saúde mental. Pode ser uma forma de desviar seus
pensamentos negativos, mesmo que temporariamente”, aconselha Danielle Admoni.
Evite relacionar suicídio com transtorno mental: ainda que haja uma forte relação
entre o suicídio e os transtornos mentais, não se deve restringir o sofrimento
do indivíduo ao adoecimento mental. “Nem toda pessoa com ideação suicida tem
transtorno mental, assim como nem todo indivíduo que possui um transtorno
mental terá, necessariamente, um comportamento suicida”, pontua Monica Machado.
Família deve buscar ajuda profissional: a depressão é uma das maiores causas de suicídio pois, quando não tratada, pode evoluir para um quadro incapacitante e se tornar uma razão para o indivíduo querer tirar sua vida.
Segundo as especialistas, a doença pode ser tratada ou contida com
terapia e medicações. Entretanto, dificilmente a iniciativa de buscar ajuda
parte de quem está doente. “Nestes casos, cabe a família providenciar a ajuda
especializada. Vale lembrar que por mais importante seja a rede de apoio, ela
não substitui o acompanhamento médico e terapêutico”, pondera Danielle Admoni.
Esteja sempre por perto: seja receptivo e acessível o tempo todo, para qualquer demanda. “Muitas vezes, apenas este ‘estar disponível’ já promove a sensação de acolhimento e segurança que a pessoa tanto precisa”, finaliza a psicóloga Monica Machado.
Se você ou alguém que conhece estiver em sofrimento intenso ou
crise suicida, entre em contato com o Centro de Valorização da Vida (CVV) no
número 188 ou busque um serviço de atendimento em saúde mental na região – no
Sistema Público de Saúde indicamos a Unidade Básica de Saúde (UBS) ou o Centro
de Atenção Psicossocial (CAPS).
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