Mancha alvo e Crestamento de cercospora estão
entre as doenças mais importantes dos cultivos; especialista da Fundação MT
fala sobre as estratégias de controle
A
produção brasileira de grãos enfrenta grandes desafios em função das condições
climáticas que são favoráveis aos cultivos, mas que também possibilitam o bom
estabelecimento e desenvolvimento de pragas e doenças. Nos estados onde é
realizado ao menos o cultivo de primeira e segunda safra, como em Mato Grosso,
considerar o sistema de produção como um todo quando se trata de manejo é ainda
mais relevante. Isso porque patógenos, como o fungo causador da Mancha alvo (Corynespora cassiicola), tem
como hospedeiro as culturas da soja e do algodão, por exemplo. E nas últimas
safras, além dessa mancha foliar, outro patógeno tem crescido em importância
nas lavouras de soja safra: o Crestamento foliar de cercospora (Cercospora spp.).
Discussões
sobre essas duas doenças na cultura da soja serão um dos temas do Encontro
Técnico Soja, realizado pela Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária de Mato
Grosso (Fundação MT), de 26 a 29 de abril, em Cuiabá-MT. Os pesquisadores da
área de Fitopatologia da instituição, Karla Kudlawiec e João Paulo Ascari, vão
trazer dados de pesquisa da safra 2021/22; o tema terá ainda a contribuição dos
especialistas, Sergio Brommonschenkel, da Universidade Federal de Viçosa (UFV),
Maurício Meyer, da Embrapa Soja, e Lucas Fantin, da Fundação Chapadão.
Mancha
alvo
Os
primeiros relatos da Mancha alvo em Mato Grosso datam da década de 80. Hoje, C. cassiicola está
disseminado em todo o Estado. O fungo causador da doença pode sobreviver em
restos culturais, em sementes de soja infectadas, e ainda permanecer viável no
solo por anos. No sistema de produção soja/algodão ou no cultivo de espécies de
crotalária há a multiplicação de inóculo do patógeno, que pode incidir de uma
safra para outra, pois são duas culturas hospedeiras do fungo.Sintoma de Mancha alvo
João Paulo Ascari
Na
primeira safra 21-22 foi observado maior volume de precipitação e melhor
distribuição das chuvas ao longo do período. As condições favoráveis para o
desenvolvimento da Mancha alvo ocorrem durante a fase reprodutiva da cultura,
quando há o fechamento do dossel. E entre os fatores que aumentam a severidade
da doença no campo estão as condições prolongadas de alta umidade (> 85%),
com períodos de molhamento foliar de 48 horas e as temperaturas elevadas. “Com
a presença de inóculo na área, multiplicado pela cultura antecessora, e
características ambientais favoráveis, tivemos a incidência do patógeno e a
evolução da severidade da doença”, destaca Karla.
A
especialista explica que, além do acompanhamento das previsões climáticas para
a safra, o produtor deve considerar no planejamento fatores relacionados à
escolha do material genético, levando em conta os diferentes níveis de
sensibilidade à ocorrência de Mancha alvo. Também, deve lançar mão das
estratégias de controle químico e biológico na definição do manejo de condução
da lavoura de soja.
“O
inóculo do fungo Corynespora
cassicola, presente nos restos culturais, atinge as primeiras
folhas do terço inferior da planta através dos respingos de chuva. A partir da
infecção inicial, novos esporos são conduzidos nos extratos da planta,
alcançando o terço médio e até o terço superior. Sendo assim, é importante
proteger todo o dossel, principalmente as folhas mais próximas ao solo. Para
isso, recomendamos que a aplicação seja realizada em pré-fechamento de
entrelinha.” explica a pesquisadora.
Os
danos ocasionados por essa doença têm impacto na produtividade final e no peso
das sementes. Esses efeitos são resultantes da desfolha precoce das plantas no
campo, o que afeta a translocação de fotoassimilados para os grãos. Em especial,
no caso do sistema soja/algodão ou soja/crotalária, o produtor precisa fazer o
controle da Mancha alvo nas duas culturas. “O inóculo multiplicado em uma
cultura poderá causar doença na próxima, portanto, é preciso manejar bem e com
consciência, tanto no algodão, quanto na soja. A Mancha alvo já foi uma doença
que não tinha grande importância, mas vem evoluindo ano após ano”, reforça a
especialista.
Crestamento
de cercospora
A
ocorrência de Crestamento de cercospora, causada pelo fungo Cercospora spp., tem
despertado atenção de produtores e especialistas. Nas últimas safras, houve
aumento da incidência e na severidade da doença nas áreas de soja de Mato
Grosso. De modo geral, em condições de campo, a maioria dos materiais
apresentam sensibilidade à ocorrência e, dentre as espécies, podem ser listadas
a Cercospora kikuchii, C.
sigesbeckiae e C.
flagellaris.Sintoma de cercospora
Mônica Müller
Para
os pesquisadores, o desafio é compreender como cada espécie se comporta e a
predominância em cada região do Estado e do Brasil. “Acreditamos que existem
diferenças entre as espécies, que podem ocorrer simultaneamente em condições de
campo. Instituições de pesquisa e universidades têm trabalhado para entender as
diferenças de patogenicidade de cada uma”,
detalha a pesquisadora da Fundação MT.
A infecção
de Cercospora
também pode ocorrer quando há uma fitotoxidez da folha, desencadeada pela
aplicação de alguma molécula química. O fungo é oportunista e aproveita a
fragilidade do tecido para colonizar. “A identificação visual das lesões nas
plantas de soja está relacionada ao efeito da cercosporina, uma exotoxina
produzida pelo fungo e responsável pela coloração avermelhada das lesões”,
coloca Karla.
Além
disso, esse fungo pode atacar todas as partes da planta e ser responsável por
grandes perdas no rendimento e na qualidade da semente, principalmente por causar a chamada
mancha púrpura em sementes de soja.
Conclusões
O
complexo de manchas foliares incidente nas lavouras de soja pode reduzir a
produtividade e a qualidade dos grãos. Dentre as estratégias de controle para
Mancha alvo são preponderantes o plantio de cultivares menos sensíveis ao
ataque do patógeno, o uso de sementes sadias, a rotação e sucessão de culturas
com gramíneas, o tratamento de sementes e o controle químico. Já para
Crestamento de cercospora, o uso de fungicidas é uma importante ferramenta no
manejo.
“É
preciso considerar todas as variáveis dentro do sistema de produção. A chance
de sucesso no controle das doenças da lavoura é muito maior quando o produtor
considera as estratégias disponíveis no seu planejamento. Isoladamente, as
medidas de controle podem não surtir o efeito desejado. No campo, podemos ter a
ocorrência das duas doenças juntas e, ainda, de outros patógenos, que somados
podem reduzir a produtividade e consequentemente a lucratividade das lavouras”,
conclui a especialista.
Fundação MT
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