Varejo é o setor que concentra a maior quantidade
de ocupados sem registro, um contingente de 6,8 milhões de trabalhadores
O IDV - Instituto para Desenvolvimento do Varejo
contou com o apoio da consultoria McKinsey & Company e do escritório de
advocacia Mattos Filho para a realização de um estudo sobre a informalidade no
varejo brasileiro, com os objetivos de se detectar as barreiras para o crescimento
econômico e caracterizar e quantificar a informalidade no país por meio de
fatos e dados. Este foi o quarto estudo realizado pela McKinsey, o terceiro em
parceria com o IDV. Os anteriores foram realizados em 2004, 2014 e 2019.
Para destravar a produtividade e viabilizar o
desenvolvimento, o Brasil precisa reduzir a informalidade, que chega a 42% da
força de trabalho ocupada, mais de 20 pontos percentuais acima da registrada em
países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE). Um dos desafios será expandir a parcela da população em idade de
trabalho que possui uma ocupação com registro e contribui com tributos de
trabalho, que atualmente é de apenas 28%, comparado com 44% de países da OCDE.
A
informalidade no Brasil
O crescimento do PIB brasileiro vem se pautando na
expansão da força de trabalho, porém com o fim do bônus demográfico, o país
dependerá de maior produtividade para seguir crescendo, assim como outros
países em desenvolvimento têm feito, como China e Índia. A informalidade,
caracterizada por meio do trabalho sem registro ou da evasão tributária, é um
dos principais inibidores da produtividade. O Brasil avançou bastante na
redução da informalidade entre 2002 e 2012. Neste período, a taxa de ocupados
sem registro caiu 15 pontos percentuais, e o índice de informalidade da
economia caiu cerca de 10 pontos percentuais, porém tanto os avanços contra a
informalidade como o crescimento econômico estagnaram na última década.
A evasão e a não arrecadação de tributos por
empresas atingiram, em 2020, entre R$ 460 bilhões a R$ 600 bilhões. A
estimativa é composta pela evasão fiscal de empresas (R$ 320 bilhões a R$ 420
bilhões) e a não arrecadação de tributos associada ao trabalho sem registro (R$
140 bilhões a R$ 180 bilhões). No varejo, este número é de R$ 95 bilhões a R$
125 bilhões, a maior parte em tributos estaduais.
O varejo é o setor que concentra a maior quantidade
de ocupados sem registro, um contingente de 6,8 milhões de trabalhadores. O
varejo digital apresenta maior evasão tributária do que o varejo físico, de 33%
a 37% das vendas contra 25% a 34% das vendas físicas. Isso ocorre porque as
plataformas digitais apresentam diferentes níveis de monitoramento sobre a
atuação informal de seus vendedores. A expansão de vendas cross-border (operações
comerciais que vão além das fronteiras) e serviços de delivery evidenciam novas
rotas de informalidade.
A combinação da alta carga tributária com a
complexidade de se manter formal fomenta a evasão tributária e a não
arrecadação no Brasil. O país possui carga tributária para empresas 12 pontos
percentuais acima da média dos países da OCDE e lidera o ranking de
complexidade corporativa entre outros 77 países (medido pelo TMF Group).
Impactos da
informalidade no varejo digital
Os avanços contra a informalidade que o varejo
vinha conquistando estagnaram nos últimos 5 anos. A produtividade dos setores
de varejo, medida pela receita por pessoa empregada, estagnou, e em alguns
casos, como na área de material de construção, retraiu. O varejo digital
representa cerca de 14% das vendas do varejo brasileiro, e seu avanço perpetua
a informalidade habitual de diversos setores e acelera novas modalidades, como
o cross-border. Existe
potencial de mitigação da informalidade no varejo digital, principalmente
devido à concentração de plataformas digitais de vendas, rastreabilidade das
vendas digitais e maior facilidade de verificar e denunciar vendedores e
compradores irregulares, porém estas práticas ainda não estão disseminadas.
Em pesquisa com os sellers (aqueles que vendem seus produtos em
plataformas digitais), identificou-se que a informalidade é alta entre pequenas
empresas: 47% das MEIs e MEs declararam receita acima do permitido em suas
categorias tributárias e 25% dos respondentes que se classificaram como MEIs
afirmam operar no varejo digital por meio de múltiplas MEIs. As plataformas
digitais possuem padrões distintos de monitoramento de seus sellers, o que gera
dispersão na percepção sobre informalidade nesse canal. Canais alternativos,
como aplicativos de chat e redes sociais,
despontam com alta percepção de informalidade. A expansão de
vendas nestes canais, combinada com novas modalidades de pagamento, pode vir a
ser foco de informalidade no varejo digital.
Iniciativas
para mitigar a informalidade no varejo
Oito modelos
observados ao redor do mundo que contribuem para mitigar a
informalidade no varejo digital. Mercados como dos Estados Unidos, União
Europeia e China atuam em múltiplas frentes para coibir a informalidade no
varejo digital. As iniciativas são estas:
- Elevar
responsabilidade de plataformas digitais pela venda de produtos de descaminho
e falsificados em seus domínios;
- Utilizar
tecnologias de rastreamento, como blockchain ou serialização de
produtos, para identificar origem de mercadorias e restringir rotas
informais;
- Certificar
cadeias fornecedoras em relação à origem de produtos e atuação idônea;
- Aprimorar
a gestão de sellers, incluindo protocolos de
inclusão e validação rotineira (ex: verificação de documento fiscal na
venda e monitoramento de venda por pessoa física);
- Aumentar
visibilidade do fiscalizador sobre transações realizadas no varejo digital
por meio de protocolos de compartilhamento de dados por plataformas ou
tarifa sobre transações financeiras;
- Transferir
para intermediadores, como as plataformas digitais nacionais, a atribuição
de recolhimento de tributos, ao invés do seller;
- Transferir
para os agentes logísticos, inclusive os serviços postais públicos, a
atribuição por recolher tributos e compartilhar dados sobre remessas
internacionais;
- Alavancar
o uso de dados e algoritmos em controles aduaneiros para aumentar a
assertividade das fiscalizações.
De acordo com o presidente do IDV, Marcelo Silva,
mercados digitais, na sua maioria, herdaram modelos de regulamentação e
fiscalização do varejo físico. “Ao redor do mundo observa-se que o combate à
informalidade no varejo digital ocorre por meio de práticas de negócio ou
adaptações e transformações normativas. No Brasil, práticas de negócio
lideradas por plataformas e associações surtem efeitos na prevenção da
informalidade e podem ser expandidas, dentre elas destacam-se o monitoramento e
a certificação de cadeias de fornecimento e o monitoramento e checagem de
conformidade de sellers e
transações realizadas por plataformas digitais”, afirma.
Os Estados Unidos criaram a “Marketplace
Facilitator Law”, uma transformação normativa que responsabiliza plataformas
digitais pelo recolhimento de tributos e regulamenta qual estado recolhe o
tributo. Além disso, criou o programa de parceria com marcas para confirmar a
origem de produtos na fronteira. No Brasil, também há iniciativas começando a
surtir efeito, como o programa de monitoramento e certificação de cadeias de
fornecimento e o monitoramento e checagem da conformidade dos sellers, adotados por
algumas plataformas digitais. A China aprovou a “E-commerce Law” em 2019,
exigindo das plataformas digitais mais visibilidade para o governo sobre
transações e responsabilização por venda de produtos irregulares, cobrando
multas pesadas pelo descumprimento das normas. Já a União Europeia passou a
responsabilizar courriers
pelo recolhimento do VAT (Value Added Tax), ou IVA (Imposto sobre Valor
Agregado), para vendas entre países do bloco e courriers pelo recolhimento do VAT para
vendas originadas fora do bloco.
O estudo sobre a informalidade no varejo brasileiro
foi elaborado a partir de discussões com associações setoriais, como o Fórum
Nacional contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP), Associação Brasileira do
Varejo Têxtil (ABVTEX), Associação pela Indústria e Comércio Esportivo (APICE)
e Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e
Cosméticos (ABHIPEC), e empresas associadas ao IDV, além de pesquisa de mercado
com sellers, entrevistas com experts e
análise de diversos estudos sobre o tema realizados por instituições renomadas.
Esses
são resultados do estudo factual, que não expressam a perspectiva do IDV ou da
McKinsey. O IDV seguirá com o desenvolvimento de propostas a partir do estudo.
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