Levantamento mostra como o isolamento mudou os hábitos de adultos e crianças. Smartphones e tablets invadiram a vida das crianças pequenas, com crescimento de 293%. Uso saltou de 15% para 59% durante o isolamento
Os estímulos são
elementos fundamentais no desenvolvimento na primeira infância e são
fortalecidos pela existência de boas interações entre a criança e os adultos de
referência. Em um momento tão delicado quanto o da pandemia, contudo, esses
fatores podem ter sido comprometidos.
Para entender o
impacto do período de isolamento social dentro dos núcleos familiares e nas
relações dos cuidadores com as crianças pequenas no período de março a dezembro
de 2020, a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal acaba de finalizar a
pesquisa Primeiríssima Infância - Interações na
Pandemia: Comportamentos de pais e cuidadores de crianças de 0 a 3 anos em
tempos de Covid-19 .
Elaborado sob
consultoria da Kantar Ibope Media, o estudo é um desdobramento da Primeiríssima
infância - Interações: comportamentos de pais e cuidadores de crianças de 0 a 3
anos, estudo que trouxe análise anterior à pandemia, lançado em 2020.
Entre os dados do novo
estudo, chama atenção a alta exposição às telas a que as crianças foram
submetidas durante a pandemia. O levantamento mostra que o uso de celulares e
tablets em todas as classes sociais ficava em 15% para crianças de 0 a 3 anos e
saltou para cerca de 59% durante os meses de isolamento.
"Isso é um ponto
de atenção. As telas representam uma distração passiva, que, em excesso, pode
ser prejudicial para o desenvolvimento da criança. Pensando nisso, é
fundamental considerar a idade, o tempo de exposição e ter sempre um adulto
acompanhando para não haver prejuízo nessa fase.", avalia Paula Perim,
diretora de Comunicação da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.
Perim lembra que a
Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda que se evite a exposição a
telas para crianças com menos de 2 anos e que se limite o chamado "tempo
de tela" a no máximo uma hora por dia para crianças entre 2 e 5 anos. "Alta
exposição a telas na primeira infância pode provocar ainda enxaqueca,
hiperatividade, alteração do sono, entre outros".
Primeiríssima Infância
- Interações na Pandemia também indica que 51% das crianças estão fazendo atividades
sozinhas. Dentro desse recorte, 32% brincam com seus próprios brinquedos e 19%
assistem sozinhas a filmes e desenhos na televisão.
Em um comparativo por
classe, as crianças da classe D são as que passam mais tempo sozinhas, seja
brincando ou assistindo TV (64% na classe D, enquanto nas outras classes varia
de 47% a 51%). Além disso, elas são as que brincam menos com os adultos (13% na
classe D contra 26% a 33% em outras classes). "Uma das hipóteses para que
isso aconteça é o fato de que os adultos estão mais atarefados, principalmente na
classe D, na qual há uma sobrecarga pelo acúmulo de funções", pondera
Perim.
Realizada em março de
2021, a pesquisa contou com a participação das famílias das classes sociais A,
B, C e D, que convivem e são responsáveis por crianças de 0 a 3 anos. Ao todo,
1036 pessoas participaram das entrevistas, feitas majoritariamente com o uso de
uma plataforma. As entrevistas com pessoas das classes A, B e C foram
auto-preenchidas online, por meio de computador, tablet ou smartphone. As
entrevistas com pessoas da classe D aconteceram em modo presencial, de forma a
garantir a participação deste segmento populacional, de menor acesso aos
suportes eletrônicos escolhidos.
Alguns destaques
mencionados sobre o estudo:
• Em todas as classes
sociais, o percentual de crianças que brincam com os adultos é maior do que com
outras crianças. As atividades realizadas sozinha correspondem por 51% da
amostra, sendo que 32% brincam sozinhas com seus próprios brinquedos e 19%
assistem sozinhas desenhos e filmes na televisão. As brincadeiras com adultos
alcançam 26% e brincadeira com outras crianças, 22%. A hipótese para isso é o
isolamento imposto pela pandemia.
• Em relação a antes
da pandemia, houve aumento de todos os tipos de brinquedos e/ou atividades
lúdicas de brincar. As famílias relatam aumento de brinquedos comprados, que
permanecem como primeira opção de brincadeira antes e depois da pandemia. Há um
crescimento importante de brinquedos caseiros, objetos e utensílios domésticos
para entreter as crianças.
• A principal
diferença entre as classes sociais é o maior índice de atividades manuais na
classe A/B (82%) em oposição à classe D (58%). Além disso, é maior a interação
dos cuidadores com maior escolaridade em brincadeiras que envolvem objetos
domésticos e atividades manuais, do que cuidadores com menor escolaridade. A
diferença entre as classes nesse tipo de brincadeira é de 15 pontos percentuais
em relação a objetos domésticos e de 19 para atividades manuais. Uma hipótese é
a falta de tempo destas famílias e também falta de instrução para desenvolver
esse tipo de brincadeira.
• O uso de celulares e
tablets em todas as classes sociais ficava em 15% para crianças de 0 a 3 anos e
saltou para cerca de 59% durante os meses de isolamento.
• As crianças da
classe D são as que 1) passam mais tempo assistindo TV (25%), enquanto
as crianças das outras classes variam de 15% a 19%; 2) brincam e
assistem TV sozinhas (64%) x variação de 47% a 51% nas outras classes; 3)
brincam menos com os adultos (13%), contra 26% a 33% nas outras classes.
• A pesquisa feita
depois da pandemia mostra que a percepção das famílias sobre a importância das
interações entre as crianças cresceu e a relação delas com os adultos permanece
relevante. (Ver gráfico desenvolvimento - formas de aprendizado mais importantes).
• As relações pessoais
e a convivência com os familiares se firmam como a maior fonte de inspiração e
conhecimento. No entanto, antes da pandemia, com o distanciamento social e a
falta de experiência prévia com situações similares, as matérias na internet e
os canais de YouTube se destacaram como espaços de busca de informações sobre
cuidados. Com o desenrolar da pandemia, esses canais perderam espaço para as
relações pessoais, assim como órgãos oficiais, grupos de mães, TVs,
creche/escola, igrejas, grupos de mães nas redes sociais, médicos e amigos.
(Ver gráfico "onde os cuidadores aprendem sobre estímulo").
• Os adultos realizam
várias atividades de entretenimento da criança em todas as classes sociais. Uma
diferença que se destaca é quanto à atividade de ler para os pequenos. Enquanto
a contação de histórias está presente em 90% das famílias de classe A/B, nas de
classe D esse percentual é de 68%. As hipóteses possíveis para essa diferença
são a falta de tempo para realizar a atividade, falta de hábito da leitura em
geral, de acesso a livros, ou ainda a escolaridade dos cuidadores.
Sobre a Fundação Maria
Cecilia Souto Vidigal
Desde 2007, a Fundação
Maria Cecilia Souto Vidigal trabalha pela causa da Primeira Infância com o
objetivo de impactar positivamente o desenvolvimento de crianças em seus
primeiros anos de vida. As principais frentes de atuação da Fundação são a
promoção da Educação Infantil de qualidade, o fortalecimento dos serviços de
parentalidade, a avaliação do desenvolvimento da criança e das políticas
públicas de primeira infância e a sensibilização da sociedade sobre o impacto
das experiências vividas no começo da vida.
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