No último dia 15, vi esse bom povo rezar, cantar, valorizar em cartazes, gestos e aplausos, palavras que traziam calor à alma na tarde fria de Porto Alegre. Havia, na manifestação pela Família, alguns amigos pessoais, claro. Mas eu conhecia aquela gente toda pelo muito que temos em comum no pequeno e imenso repertório de afetos morais e espirituais que trazemos no coração.
Estávamos unidos por algo
valioso e, sim, também contra perigos assustadores. Quando lhes falei,
encerrando o evento, disse que no campo político, no lado oposto, cada palavra
proferida ali no Parcão era objeto de escárnio e combate. Era execrado cada
cartaz, bem espiritual, valor moral, anseio expresso, oração pronunciada.
Difícil, no mundo moderno, imaginar antagonismo maior e conciliação tão
impossível.
Engana-se quem pensa que as
bandeiras vermelhas expressam mera opção política. Não! Trata-se de algo muito
mais profundo, que envolve a destruição de toda uma cultura. E não é para
substituir por outra superior, que seus filósofos, psicólogos, linguistas,
juristas estão longe de esboçar, mesmo os mais eminentes. Pensam tão distantes
do homem real que negam a própria Razão.
Por acaso, poucas horas antes
de sentar-me para escrever este artigo, recebi da editora Avis Rara, o livro
“Guerra Cultural” de Stephen Hicks. Nas primeiras páginas, engasgo a leitura
diante da composição de duas frases. Numa, diz Michel Foucault: “A Razão é a
derradeira linguagem da loucura”. Na outra, Jean-François Lyotard completa o
abismo: “A Razão e o Poder são uma coisa só”.
Perceberam, queridos leitores,
as consequências disso? De um golpe só todas as bibliotecas são
derrubadas. É a filosofia que nega a filosofia! Segundo ela, observar a
realidade, buscar sentido, aplicar a inteligência ao objeto, ter razão, por
fim, é opressão. Que dizer, então da Fé, da verdade, do bem, do justo, do belo?
Sigamos adiante com os
semideuses das prateleiras universitárias. Eles nos levam pela mão àquilo de
que nos querem afastar. Pense nas nossas salas de aula que motivam o desamor à
pátria, no “pluralismo” excludente das universidades, no que aconteceu com a
arte ao longo do último século. Pense nas notícias que chegam de toda parte
sobre a total rendição dos educandários católicos, pense na acomodação e
reacomodação da doutrina à falta de juízo da hora. Pense na fragmentação da
sociedade, no modo como o poder é disputado, no que o Congresso vota, ou não
vota, e no que STF decide, ou não. Pense na erotização das crianças, na ânsia
pela liberação da maconha, nas prisões abertas, na culpa das vítimas e na
inocência dos culpados. E vamos, assim, virando o mundo pelo avesso, usando a
difamada Razão para estabelecer relações de causa e efeito.
Durante dezenove séculos,
minha amada Igreja Católica foi a grande depositária e sustentáculo da cultura
do Ocidente. Sua missão educadora e cultural andava lado a lado com a
espiritual. Ao ceder aquelas, fragilizou esta. Ao exorcizar seus conservadores,
foi à dança com os lobos. Por isso, o Brasil, com um governo que coloca Deus
acima de todos, está no olho de um furacão de intolerância a evidenciar que não
há lugar para Ele na destruição empreendida por seus adversários. Há dois anos,
o Brasil mostrou não estar perdido. Não há uma carta de rendição sobre a mesa.
Ainda é tempo de salvação.
Percival Puggina -
membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor
e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de
jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia
da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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