Desde os primórdios da humanidade, o conceito de “morte” é associado a
situações em que uma pessoa não respira, o coração não bate ou a cabeça está
separada do corpo
O diagnóstico de ME tem evoluído nas últimas cinco décadas.
Desde a publicação de The depassed coma: preliminary memoir, que definiu pela
primeira vez o conceito de ME, e de sua
consolidação em 1968, pelo Ad Hoc Committee
of the Harvard Medical School to Examine
the Definition of Brain Death, pouco
se tem acrescentado. Nos EUA, em 1981,
o relatório da President’s Commission for
the Study of Ethical Problems in Medicine
and Biomedical and Behavioral Research, Defining
death: a report on the medical, legal, and
ethical issues in the determination of
death, determinou que cabe à ciência médica o
estabelecimento de critérios para a finalidade de diagnóstico de morte e
incorporou à legislação americana, no Uniform determination of death act, esse
conceito de morte.
Em 1997, a Lei 9.434 deu competência ao Conselho Federal de Medicina (CFM) para definir os critérios para diagnóstico da morte encefálica. Naquele mesmo ano, a Resolução CFM 1.480 estabeleceu que “a comprovação da morte encefálica deve ser realizada utilizando critérios precisos, bem estabelecidos, padronizados e passíveis de serem executados por médicos nos diferentes hospitais” e que “a parada total e irreversível das funções encefálicas equivale à morte”.
Da análise da resolução, de forma sucinta, pode-se dizer que são necessários dois exames clínicos, realizados por dois médicos diferentes, para confirmar a ausência permanente de função do tronco cerebral; um teste de apnéia em cada exame clínico, para comprovar a ausência de movimentos respiratórios; e um exame complementar para confirmar a ausência permanente de função encefálica. Vale ressaltar que esta metodologia padronizada é muito mais abrangente e segura que a utilizada na maioria dos países. Revendo os raros casos publicados de dúvidas diagnósticas, observa-se que em nenhum deles foi utilizada uma metodologia tão rigorosa quanto a brasileira.
Nos últimos 20 anos, a morte encefálica foi efetivamente comprovada, no Brasil, em mais de 120 mil pacientes utilizando os critérios da Resolução CFM 1.480/1997, confirmando a segurança, o grau de absoluta certeza e a ampla aceitação desta metodologia para determinação inquestionável da morte em nosso meio.
Em 2002, Wijdicks realizou levantamento dos critérios para determinação da ME em oitenta países. Destes, setenta possuíam diretrizes clínicas definidas para o diagnóstico da ME, com presença de coma e ausência de reflexos de tronco encefálico e de resposta motora. A participação de dois médicos era exigida em 34%. Em apenas 59% dos países era exigido teste de apneia com nível de hipercapnia definido.
Estudo semelhante foi realizado por Wahlster et al. em 2015, neste estudo foram incluídos 91 países, constatou-se que em 70% dos locais pesquisados existia legislação específica para determinação de ME. Em dois terços havia exigência de um médico com treinamento em neurologia, neurocirurgia ou terapia intensiva para realizar a determinação de ME. Em 56% dos países havia critério específico para crianças. Foram constatadas diferenças importantes no tempo de observação entre os exames, no teste de apneia e nos exames complementares.
Estudo de Shappel et al., que revisaram a determinação da ME em 226 doadores de órgãos de 68 hospitais dos EUA, identificaram que os profissionais que realizaram procedimentos foram intensivistas (37%), neurologistas (28%), neurocirurgiões (15%) e de outras especialidades (20%).
Com o avanço do conhecimento fisiopatológico da morte encefálica, da experiência acumulada nos últimos 20 anos no Brasil, e da melhor compreensão dos exames complementares na morte encefálica, as sociedade médicas especializadas e o CFM determinaram debates e análise sobre o assunto, no intuito de aprimorar os procedimentos de determinação da morte encefálica no Brasil.
Em outubro de 2017, através do Decreto Presidencial nº 9175, que regulamenta a Lei nº 9434/97, e que em seu Art. 17, parágrafo 1º que “ o diagnóstico de morte encefálica será com base nos critérios neurológicos definidos em resolução específica do conselho federal de medicina” e em seu parágrafo 3º “ os médicos participantes do processo de diagnóstico de morte encefálica deverão estar especificamente capacitados e não poderão ser integrantes das equipes de retirada e transplante”.
Ao longo de seis anos de debates entre as sociedades médicas e o Conselho Federal de Medicina, inúmeras propostas foram discutidas para o aprimoramento da determinação da morte encefálica. Com a publicação do Decreto nº 9175, surge a Resolução CFM nº 2173, publicada em 15 de dezembro de 2017, que mantém em essência a mesma metodologia da resolução anterior, mas acrescenta maior segurança, clareza e agilidade na determinação da morte encefálica. Os tópicos mais relevantes da resolução são os seguintes:
Em 1997, a Lei 9.434 deu competência ao Conselho Federal de Medicina (CFM) para definir os critérios para diagnóstico da morte encefálica. Naquele mesmo ano, a Resolução CFM 1.480 estabeleceu que “a comprovação da morte encefálica deve ser realizada utilizando critérios precisos, bem estabelecidos, padronizados e passíveis de serem executados por médicos nos diferentes hospitais” e que “a parada total e irreversível das funções encefálicas equivale à morte”.
Da análise da resolução, de forma sucinta, pode-se dizer que são necessários dois exames clínicos, realizados por dois médicos diferentes, para confirmar a ausência permanente de função do tronco cerebral; um teste de apnéia em cada exame clínico, para comprovar a ausência de movimentos respiratórios; e um exame complementar para confirmar a ausência permanente de função encefálica. Vale ressaltar que esta metodologia padronizada é muito mais abrangente e segura que a utilizada na maioria dos países. Revendo os raros casos publicados de dúvidas diagnósticas, observa-se que em nenhum deles foi utilizada uma metodologia tão rigorosa quanto a brasileira.
Nos últimos 20 anos, a morte encefálica foi efetivamente comprovada, no Brasil, em mais de 120 mil pacientes utilizando os critérios da Resolução CFM 1.480/1997, confirmando a segurança, o grau de absoluta certeza e a ampla aceitação desta metodologia para determinação inquestionável da morte em nosso meio.
Em 2002, Wijdicks realizou levantamento dos critérios para determinação da ME em oitenta países. Destes, setenta possuíam diretrizes clínicas definidas para o diagnóstico da ME, com presença de coma e ausência de reflexos de tronco encefálico e de resposta motora. A participação de dois médicos era exigida em 34%. Em apenas 59% dos países era exigido teste de apneia com nível de hipercapnia definido.
Estudo semelhante foi realizado por Wahlster et al. em 2015, neste estudo foram incluídos 91 países, constatou-se que em 70% dos locais pesquisados existia legislação específica para determinação de ME. Em dois terços havia exigência de um médico com treinamento em neurologia, neurocirurgia ou terapia intensiva para realizar a determinação de ME. Em 56% dos países havia critério específico para crianças. Foram constatadas diferenças importantes no tempo de observação entre os exames, no teste de apneia e nos exames complementares.
Estudo de Shappel et al., que revisaram a determinação da ME em 226 doadores de órgãos de 68 hospitais dos EUA, identificaram que os profissionais que realizaram procedimentos foram intensivistas (37%), neurologistas (28%), neurocirurgiões (15%) e de outras especialidades (20%).
Com o avanço do conhecimento fisiopatológico da morte encefálica, da experiência acumulada nos últimos 20 anos no Brasil, e da melhor compreensão dos exames complementares na morte encefálica, as sociedade médicas especializadas e o CFM determinaram debates e análise sobre o assunto, no intuito de aprimorar os procedimentos de determinação da morte encefálica no Brasil.
Em outubro de 2017, através do Decreto Presidencial nº 9175, que regulamenta a Lei nº 9434/97, e que em seu Art. 17, parágrafo 1º que “ o diagnóstico de morte encefálica será com base nos critérios neurológicos definidos em resolução específica do conselho federal de medicina” e em seu parágrafo 3º “ os médicos participantes do processo de diagnóstico de morte encefálica deverão estar especificamente capacitados e não poderão ser integrantes das equipes de retirada e transplante”.
Ao longo de seis anos de debates entre as sociedades médicas e o Conselho Federal de Medicina, inúmeras propostas foram discutidas para o aprimoramento da determinação da morte encefálica. Com a publicação do Decreto nº 9175, surge a Resolução CFM nº 2173, publicada em 15 de dezembro de 2017, que mantém em essência a mesma metodologia da resolução anterior, mas acrescenta maior segurança, clareza e agilidade na determinação da morte encefálica. Os tópicos mais relevantes da resolução são os seguintes:
- Tornar a determinação da morte encefálica uma etapa obrigatória do atendimento dos pacientes com lesão encefálica conhecida, irreversível e capaz de causar um quadro de coma não reativo e apneia persistente. Os pacientes em morte encefálica estão irremediável e comprovadamente mortos, e a data e a hora da morte que constará na Declaração de Óbito será a da conclusão da determinação da morte encefálica.
- Ampliar o nível de experiência exigido dos médicos que realizam a determinação da morte encefálica. Este é um procedimento de certeza absoluta, que não admite nenhum erro. Os médicos que realizam a determinação da morte encefálica devem estar previamente capacitados; isto é, ter pelo menos um ano de treinamento no atendimento de pacientes em coma e apneia e já ter realizado, pelo menos, dez determinações de morte encefálica ou ter realizado treinamento em um curso específico para esta capacitação;
- Detalhar de forma minunciosa a metodologia para realização dos procedimentos de determinação da morte encefálica e reduzir o intervalo mínimo entre os dois exames clínicos para uma hora em crianças acima de 2 anos de idade, permitindo: segurança, padronização na determinação e otimização do tempo na realização de todos os procedimentos necessarios para esta determinação ; Em menores de 2 anos, o intervalo entre os dois exames clínicos será: de 24 horas para crianças de 7 dias ( à termo) até 2 meses incompletes e de 12 horas para crianças de 2 a 24 meses incompletos .
- Enfatizar a regra – que já consta no Código de Ética Médica – segundo a qual os médicos que atuem em equipes de transplante de órgãos não podem participar dos procedimentos de determinação da morte encefálica;
- Determinar que os familiares do paciente devem ser informados, de forma clara e inequívoca, da suspeita de morte encefálica, de como será feita a determinação e dos resultados de cada uma das etapas, e apenas após esta confirmação da morte poderá ser feita a solicitação de doação de órgãos aos familiares.
- Explicar de forma minunciosa o Teste de apnéia, e analisar os possíveis resultados, as complicações e as seguintes obrigatoriedades para a realização do teste: temperatura corporal (esofagiana, vesical ou retal) superior a 35º C; saturação de oxigênio acima de 94% ; pressão arterial sistólica maior ou igual a 100 mmHg, ou conforme tabela para menores de 16 anos. O Teste de apnéia passa a ser realizado uma única vez.
- Na presença de alterações morfológicas ou orgânicas, congênitas ou adquiridas, que impossibilitam a avaliação bilateral dos reflexos fotomotor, córneo-palpebral, oculocefálico ou vestíbulo-calórico, sendo possível o exame em um dos lados e constatada ausência de reflexos do lado sem alterações morfológicas, orgânicas, congênitas ou adquiridas, dar-se-á prosseguimento às demais etapas para determinação de morte encefálica.
Da avaliação da Resolução CFM nº 2173/2017, pode-se depreender que se trata de uma resolução fruto de ampla discussão e com avanços importantes na avaliação da morte encefálica. O Brasil apresenta uma das mais rigorosas determinações de morte encefálica no mundo, com exame clínico bem sedimentado, por dois médicos diferentes, além de exame complementar de forma obrigatória. O Curso de capacitação para o diagnóstico de morte encefálica, favorecerá a uma discussão permanente sobre este assunto no Brasil. A Academia Brasileira de Neurologia deve tomar a frente das atualizações da determinação de morte encefálica.
Carlos Silvado
Membro da Câmara Técnica de Morte Encefálica do CFM
Membro da Câmara Técnica de Morte Encefálica do CFM
Hideraldo Luis Souza Cabeça
Coordenador da CT de Morte Encefálica do CFM
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