Recentemente, o
Ministério do Planejamento editou a Instrução Normativa nº 2/2018, que tem por
escopo regulamentar questões atinentes à jornada de trabalho dos servidores
públicos e seu controle, a possibilidade de compensação de horário e a
instituição de banco de horas no serviço público federal.
Uma vez que a
instrução trata de três grandes temas, cada um deles será abordado de forma estratificada.
O primeiro é a questão relacionada à jornada de trabalho. A instrução reforça a
jornada mínima de 6 (seis) horas diárias, sendo o máximo de 8 (oito) horas,
sendo consideradas como jornada regular as viagens a serviço. Ademais,
estabelece o intervalo para refeições, sendo vedado o seu fracionamento.
A nova norma
aponta, em seu artigo 7º, o controle de frequência para todos os servidores.
Sucede que o artigo 8º impõe quais servidores serão dispensados do controle
eletrônico. Destaca-se, nesse particular, o inciso IV do Instrução Normativa,
que dispensa Professor da Carreira de Magistério Superior do Plano Único de
Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos.
Com efeito, urge
destacar que os Docentes regidos pela Lei 12.772/12 não são apenas aqueles
vinculados ao Ensino Superior. Há também os Docentes do Grupo EBTT (Ensino
Básico, Técnico e Tecnológico), que também desenvolvem funções idênticas,
inclusive quanto à extensão e pesquisa. Nesse sentido, a própria AGU já se
manifestou, por meio de parecer (6282/2012), que os docentes não estão sujeitos
a registro de ponto.
Atente-se para o
fato de que não está a se falar em eventual benefício ao servidor, mas sim a
contingência da atividade realizada. Por certo, a instrução normativa deve ser
analisada, nesse aspecto, de acordo com o princípio da isonomia, razão pela
qual se a atividade exercida não revela peculiaridades, o controle de ponto é a
regra geral. Assim, a exclusão dos Docentes do Grupo EBTT da exceção da
instrução não nos parece conveniente e nem legal.
Quanto à
compensação de horário, cumpre destacar que a Constituição, em seu artigo 39,
estabelece que se aplica aos servidores públicos o disposto no artigo 7º, XIII,
ou seja, a possibilidade de compensação de horários. Sucede que não há
regulamentação legal específica para tanto. A lei 8.112/90, em diversos
artigos, estabelece a possibilidade de compensação de horário, sem, contudo,
adentrar nas minúcias de procedimento de compensação de horário.
Por exemplo, o
artigo 44, que trata da perda de remuneração, proporcional ao atraso, exceto em
casos de compensação de horário, até o mês subsequente ao da ocorrência:
“Art.
44. O servidor perderá:
II - A
parcela de remuneração diária, proporcional aos atrasos, ausências
justificadas, ressalvadas as concessões de que trata o art. 97, e saídas
antecipadas, salvo na hipótese de compensação de horário, até o mês subsequente
ao da ocorrência, a ser estabelecida pela chefia imediata”.
A referida
compensação ficaria a cargo de acordo entre chefia e servidor, o que não
qualquer garantia ou suporte à referida medida, a ensejar em notória
insegurança jurídica. A instrução normativa, nesse particular, busca
estabelecer hipóteses para compensação, fixando prazo para ajuste das horas –
mês subsequente ao da sua ocorrência, bem como o limite diário para tanto (2
horas).
Há também
específica regulamentação quanto à dispensa de compensação, quando do
comparecimento do servidor, de seu dependente ou familiar às consultas médicas,
odontológicas e a realização de exames em estabelecimentos de saúde, à luz do
artigo 7º do Decreto 1.590/95.
Nesse mesmo
sentido, a Instrução busca estabelecer regras para o Banco de Horas. Em tese,
não parece existir um permissivo legal para a existência de tal modalidade no
serviço público. Isso pelo fato de quem nem a Constituição nem a Lei 8.112/90
estabelecem, em suas regras aplicáveis ao servidor, a existência de um banco de
horas. Ao que parece, há uma tentativa de se extinguir o pagamento da hora
extraordinária, à luz do artigo 73 da lei 8.112/90, e que encontra eco no
artigo 7º, XVI, da Constituição Federal.
Com efeito, as
horas excedentes que não tenham sido compensadas não poderão ser remuneradas
como hora extraordinária. E nem há um prazo especificado na Instrução para que
o servidor saiba, de antemão, até quando pode utilizar o saldo positivo de seu
Banco de Horas.
A conclusão lógica
que se extrai é de que há uma violação direta ao artigo 73 da Lei 8.112/90, que
trata das horas extraordinárias e mais, um locupletamento ilícito da
Administração, que lança mão da força de trabalho do servidor e não o remunera
da forma estabelecida em lei.
Em que pese
existir um limitador de horas no Banco, certo é que a sua não conversão em hora
extraordinária leva à conclusão de que a sua instituição serve para burlar o
regramento legal. Assim, caso se considere válida a existência de um banco de
horas, não há a apresentação de um fator de discriminação específica sobre o
porquê da impossibilidade de banco de horas para jornadas reduzidas.
A mesma situação
ocorre na suposta regulamentação do sobreaviso. Com efeito, o sobreaviso, em
interpretação analógica da legislação trabalhista, deveria ser entendido como
hora de trabalho, à disposição, inclusive com remuneração diferenciada.
Contudo, a suposta possibilidade de compensação acaba por retirar essa
característica do sobreaviso, à luz do artigo 244, § 2º, da CLT.
Tal medida vai de
encontro ao que concluiu o Tribunal de Contas da União, no bojo do acórdão nº
784/2016, do Plenário, da Relatoria do Ministro Vital do Rêgo, cuja orientação
é no sentido de que o servidor pode submeter-se ao regime de sobreaviso, sendo
possível a aplicação analógica da CLT e a remuneração como serviço
extraordinário, quando excederem a jornada normal.
Vale destacar que
a instrução reviveu alguns aspectos da Medida Provisória nº 792/2017, que não
foi convertida em lei. A medida tratava do Plano de Demissão Voluntária de
Servidores e trazia em seu bojo a possibilidade jornada reduzida. Novamente é
de se explicitar que, quanto à redução de jornada, há uma suposta
incompatibilidade com a necessidade do serviço.
Contudo, por se
trata de discussão de âmbito estritamente administrativo, a questão que se
revela tormentosa é a impossibilidade de redução de jornada, com remuneração
proporcional, de alguns cargos, listados no § 1º, do artigo 20 da Instrução.
Não há justificativa, dentro da própria norma, a impedir a concessão desse
direito àqueles servidores, o que torna a norma desmotivada e desconectada do
artigo do regramento legal aplicado (artigos 2º e 50 da Lei 9.784/99).
Trata-se de uma
análise preliminar. Certo que a discussão ainda se estenderá. No entanto, a
presente manifestação serve para apontar alguns equívocos trazidos na própria
norma e que têm potencial lesivo aos servidores.
Adovaldo Medeiros Filho - sócio e integrante do
Grupo de Pesquisa de Servidor Público do escritório Mauro Menezes &
Advogados
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