Quatro anos após a publicação da Portaria 199 de
20141, que instituiu a Política Nacional de Atenção Integral às
Pessoas com Doenças Raras, alguns avanços foram alcançados, mas o país continua
com grandes desafios em relação à saúde de mais de 13 milhões de pessoas que
convivem com alguma enfermidade rara2.
Entre os objetivos principais da portaria estão: a
criação de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), documento que
estabelece os critérios de diagnóstico, tratamento, mecanismos para o
monitoramento clínico em relação à efetividade da abordagem terapêutica e a
supervisão de possíveis efeitos adversos. A Portaria também estabelece a
criação de centros de referência para o atendimento necessário para as muitas
desconhecidas e complexas doenças raras.
"O PCDT é um guia para o atendimento
e o tratamento das doenças. É por meio dele que conseguimos padronizar o
cuidado da saúde em todo o país, o que ajuda a ampliar e universalizar o acesso
ao cuidado integral – tão necessário entre os portadores de doenças raras, que
geralmente precisam de um suporte multidisciplinar bastante amplo",
explica o neurologista Edmar Zanoteli.
Em junho de 2015, o Ministério da Saúde lançou uma
lista com as doenças raras prioritárias para o desenvolvimento de PCDTs. O
objetivo era alcançar 47 patologias até o final de 2018. Até o momento, foram
desenvolvidos e aprovados seis PCDTs para doenças raras entre os previstos na
Portaria.
A atrofia muscular espinhal (AME) estava incluída
na lista de doenças prioritárias para criação de um PCDT, o que ainda não
aconteceu. "A Portaria 199 foi uma grande vitória para a sociedade civil e
comunidade médica que atua com doenças raras nos esforços para melhorar a
qualidade de vida dos pacientes. Agora estamos em busca da sua implementação
integral", defende Suhellen Oliveira, presidente da Associação dos
Familiares e Amigos dos Portadores de Doenças Neuromusculares (Donem).
A Donem é uma organização não-governamental sem
fins lucrativos sediada em Recife, Pernambuco. Seu propósito é disseminar
informações e conhecimento aos profissionais e familiares de pessoas com
doenças neuromusculares, gerando mais qualidade de vida aos pacientes.
"Nossa região é carente de programas de apoio e assistência
multidisciplinar para pacientes com doenças neuromusculares que, infelizmente, ainda
são pouco conhecidas pela maioria dos profissionais de saúde", explica
Suhellen Oliveira.
A AME, como a maioria das doenças neuromusculares,
exige um tratamento multidisciplinar composto por neuropediatras, ortopedistas,
fisioterapeutas, nutricionistas, fonoaudiólogos, entre outras especialidades. O
medicamento disponível para tratar a doença já tem os registros sanitário e de
preço e, atualmente, está em análise pela Comissão Nacional de Incorporação de
Tecnologias no SUS (Conitec), comissão que analisa os benefícios clínicos e
impacto orçamentário relativos à inclusão de tecnologias no SUS.
A lei 12.401/2011 que regulamenta o processo de
avaliação e incorporação de tecnologias no sistema público de saúde, estabelece
que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) tem um prazo
de 180 dias para avaliar dossiês de incorporação – esse prazo pode ser
prorrogado por mais 90 dias. Nesse período, está incluído o prazo para abertura
de consulta pública, de cerca de 20 dias, e todas as etapas da análise do
processo. A decisão final da Conitec é publicada no Diário Oficial da União e
deve ser ratificada pela Secretaria de Ciência e Tecnologia do Ministério da
Saúde.
Caso a decisão seja pela incorporação, o Decreto nº
7.646/2011, que dispõe sobre o processo administrativo para incorporação,
exclusão e alteração de tecnologias em saúde no SUS, define novo prazo de 180
dias para que a terapia seja disponibilizada aos pacientes pelo SUS a contar da
data da publicação da decisão no Diário Oficial da União. Esse prazo permite
aos entes federados (União, Estados e Municípios) se organizarem para
desenvolver e implementar um Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas.
A AME é uma das mais de 8 mil doenças raras
conhecidas no mundo e afeta, aproximadamente, entre 7 a 10 bebês em cada 100
mil nascidos vivos, sendo a maior causa genética de morte de bebês e crianças
de até dois anos de idade. No Brasil, não há ainda um estudo epidemiológico que
indique o número exato de pessoas afetadas pela doença.
É uma doença caracterizada pela perda de neurônios
motores na medula espinhal e tronco cerebral inferior, resultando em atrofia
muscular progressiva e grave. Em último caso, indivíduos com tipos mais graves
de AME podem perder seus movimentos e ter dificuldades de executar atividades
motoras básicas, como respirar e engolir.
Devido à ausência ou defeito no gene SMN1, pessoas
com AME não produzem quantidade suficiente de proteína do neurônio motor, que é
um fator crítico para a manutenção e bom funcionamento dos neurônios motores. A
gravidade da doença está correlacionada com a quantidade de proteína do
neurônio motor produzida pelo organismo. Pessoas com AME tipo 1, a mais grave,
produz pouquíssima quantidade de proteína, por essa razão não conseguem se
sentar sem ajuda ou viver depois dos 2 anos de idade sem apoio respiratório.
Pessoas com AME tipo 2 e 3 produzem mais proteína e têm menor comprometimento,
mas ainda sim são prejudicadas pela doença.
2 http://www.interfarma.org.br/public/files/biblioteca/doencas-raras--a-urgencia-do-acesso-a-saude-interfarma.pdf
3 Darras B, Markowitz J, Monani U, De Vivo D. Chapter 8 – Spinal Muscular Atrophies. In: Vivo BTD, ed. Neuromuscular Disorders of Infancy, Childhood, and Adolescence (Second Edition). San Diego: Academic Press; 2015:117-145.
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